
“É preciso encontrar uma maneira de lidar com os fatos que carregam a mágoa e o ressentimento causado pelo erros alheios para encontrar paz mental e evitar impulsos destrutivos, como o desejo de vingança. O importante é reconhecer que o passado está além do nosso controle. E que o modo como reagimos aos atos errados passados, no entanto, não está”, alerta o líder espiritual do Tibete. Isso não significa que é preciso ser santo ou Buda para ser capaz de perdoar. De acordo com a psiquiatra Sofia Bauer, o perdão é uma característica universal, presente em todo ser humano, embora alguns tenham mais facilidade de perdoar do que outros.
“Quanto mais generosa e mais grata à vida é uma pessoa, mais fácil será perdoar”, sustenta a psiquiatra. O que chama a atenção, segundo ela, é que, de acorco com pesquisa realizada pelo psicólogo norte-americano Martin Seligman, o papa da psicologia positiva, com milhares de pessoas que se consideram felizes, só há uma coisa em comum entre elas: a sensação de dever cumprido e a de praticar o bem. “Isso implica em gratidão, em ver o outro com bons olhos, e isso tem muito a ver com a capacidade de perdoar”, sustenta. Para os que têm dificuldade em relevar as mancadas cotidianas dos relacionamentos, a dica é olhar para o outro como para si mesmo, percebendo que todos estamos sujeitos a erros.
“Alimentar mágoas é como carregar um saquinho de veneno pingando dentro do coração”, afirma a psicoterapeuta Vera Lúcia Junqueira. Ela reconhece, no entanto, que o exercício do perdão nem sempre é fácil. “O perdão faz bem para quem perdoa e para quem é perdoado. É preciso começar gradativamente, tentar encontrar coisas boas na pessoa que nos magoou, e o alívio chega aos poucos”, ensina. Vera afirma que costuma trabalhar com seus pacientes o desapego aos sentimentos negativos, tão comuns à natureza humana. “Percebo que as pessoas tendem a guardar demais os sentimentos negativos. Se elas se sentiram ludibriadas ou de alguma forma passadas para trás, tendem a querer se vingar, desejam que o outro sofra”, revela.
CRESCIMENTO
A terapeuta holística Patrícia Andrade explica que a palavra perdoar tem origem no latim e significa ser totalmente, entregar, doar, mas chama a atenção para o fato de que se fala muito mais do perdão ao outro do que do perdão a si mesmo. “Acredito que o perdão mais incrível seja quando a gente se perdoa, porque uma das últimas coisas que uma pessoa faz por si mesma é se perdoar”, observa. E não se trata de uma visão egoísta ou egocêntrica, mas de dar sentido ao ser, usando, para isso, a sua natureza mais original. “O ser humano só cresce e amadurece a partir de escolhas e passa a vida toda escolhendo. Por isso, quando uma pessoa comete um equívoco e se perdoa, isso significa crescimento”, diz. O importante, nesse caso, é reconhecer o erro, deixando a culpa para trás. Olhando pelo retrovisor com os olhos da maturidade, certamente não repetiríamos as escorregadas do passado.
Resgate do equilíbrio
O atonement (at-one-ment), palavra que significa tornar inteiro novamente, está relacionado ao perdão e tem o objetivo de reparar as diversas situações da vida para resgatar o equilíbrio, não só de si mesmo, mas também da sociedade. Segundo Phil Cousineau, autor do livro Além do perdão – Reflexões sobre atonement (272 páginas, R$ 17), publicado em ePub pela Barany Editora, atonement vai além de simplesmente perdoar situações quando não se está satisfeito com alguém. “É o ato que corrige um erro, faz correções, repara os danos, propõe a restituição, procura fazer uma compensação, limpa a consciência do transgressor, alivia o ódio da vítima e faz justiça com um sacrifício correspondente ao dano que foi feito”, revela.