Duas em cada três brasileiras sofrem com problemas intestinais

Distúrbios impactam qualidade de vida, inclusive com efeitos na relação sexual. Alimentação ajuda a evitar problema

por Carolina Cotta 25/06/2015 10:13

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Duas em cada três brasileiras têm algum problema intestinal. O dado é do primeiro mapeamento em escala nacional sobre a saúde intestinal da mulher, realizado pela Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG) e apresentado no 2º Congresso de Prebióticos, Probióticos e Simbióticos (PreProSim). O SIM Brasil - Saúde Intestinal da Mulher caracterizou e quantificou a diversidade de problemas intestinais na população feminina brasileira, identificando e dimensionando seus impactos na qualidade de vida. Foram ouvidas 3.029 mulheres do Distrito Federal e nove capitais, de 18 a 60 anos, das classes A, B e C. Segundo o presidente da FBG, Flávio Quilici, professor titular de gastroenterologia e cirurgia digestiva da Faculdade de Medicina da PUC Campinas, tal dado não era esperado e chama atenção para a relevância no dia a dia das mulheres.



O impacto na vida sexual é uma realidade na vida de 79% das mulheres que relataram problemas com o trânsito intestinal. Dessas, 24% disseram ter medo de soltar gases durante a relação sexual, 25% afirmam não poder aproveitar o momento, 22% tiveram o apetite sexual reduzido e 17% revelam parar a atividade sexual quando sentem os distúrbios digestivos. O mais preocupante é o fato delas não procurarem ajuda, principalmente por acreditarem que problemas intestinais são normais e não uma doença. “No consultório, elas não relatam o trânsito lento por prejulgarem que o problema não será valorizado pelo médico”, acredita Quilici.


Para a psicóloga e terapeuta de casais Pamela Magalhães, estudiosa dos impactos dos problemas intestinais no comportamento psicológico, muitas mulheres se sentem ‘sujas’ ao falar da situação intestinal, referindo-se ao intestino como causador de tristeza, stress e ansiedade. Para para mudar essa relação elas precisariam enfrentar tabus, tomar consciência do intestino como parte do corpo e fazer mudanças afetivas e sexuais. “As mulheres precisam conseguir falar sobre isso, mas há um constrangimento em torno do assunto, como se a mulher fosse uma princesa que não vai ao banheiro. Ela também precisa conversar com seu parceiro sobre seus problemas para não haver um afastamento sexual e um possível desgaste da relação.”


O comprometimento de sua vida sexual foi o que fez L.S, de 35 anos, procurar ajuda. A prisão de ventre que a acompanhava por toda a vida era tratada como algo normal e, muitas vezes, os próprios médicos, em consultas de rotina, davam pouca atenção ao problema. Ela tinha vergonha de falar com o namorado sobre o assunto e muitas vezes evitava o contato sexual em função do desconforto. Entre abrir o jogo e procurar um tratamento, optou pelo segundo. A inclusão de probióticos na dieta regularizaram o trânsito intestinal e a relação. Segundo Izabel Lamounier, mestre em nutrição experimental, é possível melhorar a microbiota intestinal e ter mais conforto como benefício. De acordo com a especialista, 25% das suas pacientes têm síndrome do intestino irritável.

PESQUISAS Estudos corroboram para uma melhoria dos sintomas da síndrome e da distensão abdominal depois de quatro semanas de inclusão do leite fermentado na dieta, pelo fato de serem ricos em probióticos. Esses, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), são microrganismos vivos que, quando administrados em quantidades adequadas, conferem efeitos benéficos à saúde do hospedeiro. Os benefícios, entretanto, só podem ser atribuídos às cepas testadas, e não à espécie ou gênero de probióticos em geral. Além de leites fermentados, eles também são encontrados em forma de óleo e suspensão, ou combinados com vitaminas e prébioticos. Estão disponíveis em cápsulas gelatinosas, tabletes e sachês.

 

FUNCIONAIS
Probióticos são micro-organismos vivos capazes de estimular o funcionamento saudável do trato gastrointestinal enquanto os prebióticos são fibras alimentares especiais que estimulam, de forma seletiva, o crescimento dos probióticos no intestino. Os prebióticos, ao chegarem ao intestino, são digeridos por micro-organismos da microbiota benéficos ao indivíduo. Já os simbióticos são a associação de probióticos com prebióticos. Assim, em um mesmo produto, é possível administrar um micro-organismo benéfico e uma substância que ele mesmo, ou outro micro-organismo já presente no intestino, seja capaz de utilizar, potencializando o benefício para a saúde.

Órgão é tido como segundo cérebro
O intestino abriga uma grande população de micro-organismos, conhecida como microbiota intestinal. Sua estrutura e composição apresentam uma grande complexidade, pois são mais de 3,4 milhões de genes e mais de mil espécies. Para se ter uma ideia, as bactérias presentes em nosso corpo formam um volume que pode chegar a pesar 2kg. É por isso que as comunidades que habitam nosso intestino apresentam um enorme impacto sobre a saúde e o adoecimento do organismo.
A microbiota intestinal se estabelece dos 2 aos 3 anos de idade. Ela é relativamente estável, mas pode ser influenciada por fatores como dieta, doença, medicamento e envelhecimento. É importante que a microbiota esteja em equilíbrio para que o intestino possa desempenhar suas diferentes funções. Ela influencia, por exemplo, no sistema endócrino, no sistema imunológico e no sistema nervoso. Esse último é o tema mais recente das pesquisas médicas na área e demonstram como a interação intestino e cérebro impactam a saúde.

A comunicação entre esse eixo pode ocorrer por meio das vias neuronais, imunológicas e humorais. Por meio dessa comunicação há uma relação bidirecional entre os dois órgãos, no qual alterações no eixo intestino-cérebro podem implicar em problemas gastrointestinais, como obesidade ou síndrome do intestino irritável, e em problemas do sistema nervoso central, como autismo, ansiedade ou depressão. Estudos pré-clínicos sugerem que a microbiota intestinal pode apresentar um papel importante em desordens no sistema nervoso central não relacionadas com o trato intestinal, demonstrando que esta pode interferir no desenvolvimento do cérebro, sistema de comunicação e comportamento.

OUTRAS FUNÇÕES Segundo Dan Waitzber, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), diretor-presidente do Grupo de Nutrição Humana (Ganep) e coordenador do Núcleo Avançado de Pesquisa em Alimentos e Nutrição (Napan), há uma nova ciência em torno do intestino, que teria além da clássica função de absorção também uma atuação endócrina e imunológica. “O intestino hoje é tratado como um super órgão, ou como um segundo cérebro. O papel da microbiota na homeostase (capacidade do organismo de apresentar uma situação físico-química característica e constante) digestiva e sistêmica é o mais recente objeto de discussão em torno desse tema.

 


Filippo Pedrinola, endocrinologista e metabologista

Os probióticos podem ser usados tanto como prevenção quanto como tratamento da disbiose?
Sim. Quando a saúde do intestino não vai bem, devido ao desequilíbrio da flora intestinal (disbiose), a microbiota passa a conter bactérias “do mal”, também chamadas de patogênicas, podendo levar a doenças como diarreias, alergias, obstipação intestinal, alterações de humor e inflamação da parede intestinal, como a síndrome do cólon irritável. Nesses casos, o uso de suplementos probióticos que contêm as bactérias “do bem”, como lactobacilos e bifidobactérias, podem ser muito úteis para auxiliar na recomposição da flora intestinal.

Além da disbiose, eles podem colaborar em outros aspectos?
Os probióticos, quando ingeridos diariamente nas quantidades adequadas, ajudam no bom funcionamento intestinal, previnem doenças do trato digestivo, alergias e até mesmo alguns tipos de câncer, atuam na melhora da imunidade, previnem a infecção por micro-organismos patogênicos e, segundo estudos mais recentes, podem auxiliar no metabolismo energético, beneficiando o controle do peso corporal. Além disso, proporcionam melhor absorção de micronutrientes, como vitaminas e minerais do que o intestino seria capaz de ter sem essa associação.

Seus benefícios podem ser ampliados no inverno? Por quê?
As baixas temperaturas típicas do inverno levam as pessoas a ficarem mais suscetíveis a gripes, resfriados e alergias, devido à baixa nos sistemas de defesa do organismo. O que nem todos sabem é que ela pode estar relacionada a fatores hereditários, estresse, má alimentação e, inclusive, carência de vitaminas. E que o ponto fundamental para aumentar as defesas pode ser a saúde do intestino. A ingestão de probióticos pode ser de grande auxílio nesta época do ano, ajudando a fortalecer o sistema imunológico.