Faltavam apenas seis meses para o casamento quando, em 2008, a assistente de recursos humanos Gracielle Oliveira, de 37 anos, foi diagnosticada com miomas, endometriose e cisto. Ela se submeteu a uma miomectomia, numa espécie de cesariana de urgência, para a retirada dos tumores, já muito grandes. Antes da intervenção, se viu obrigada a assinar um termo de consentimento, no qual autorizava a retirada do útero em caso de hemorragia. Para quem queria construir uma família, podia ser o fim da linha. Não bastasse passar por procedimento tão complexo, ficou depois sete meses na fila do Sistema Único de Saúde (SUS) para conseguir uma injeção de alto custo para endometriose. Foi nessa época que começou a pesquisar na internet sobre a cura para o mioma e encontrou uma técnica disponível no Brasil havia apenas quatro anos: a embolização. Seis meses depois nascia Gustavo, hoje com 3 anos e 8 meses, resultado da persistência e do sonho jamais abandonado de ser mãe.
Desde os 15 anos, Gracielle convivia com os sintomas típicos de quem tem miomas: enxaqueca, dores e sangramento forte, parecendo hemorragia. Menstruações intensas, prolongadas, atípicas e, às vezes, com coágulos. Essas formações nodulares que se desenvolvem na parede do útero acarretam, nos casos mais graves, a retirada do órgão – um baque para quem sonha com a maternidade. É nesse cenário que está inserida a embolização de miomas, técnica difundida em hospitais de referência, mas ainda desconhecida em muitos consultórios, que devolve a mulheres com dificuldades para engravidar, por causa dos tumores e do sangramento, a esperança de ser mãe.
Tipicamente, os miomas diminuem depois da menopausa quando o nível de hormônios femininos também diminui na circulação sanguínea. Variam de tamanho que vão de muito pequenos a grandes formações que simulam uma gravidez de meses. Na maioria das vezes, são pequenos e não causam qualquer problema. Mas 20% a 40% das mulheres com idade superior a 35 anos têm miomas de tamanho considerável. As pacientes que não engravidaram até essa idade estão mais propensas a desenvolver miomas, assim como as mulheres de origem afro-brasileira – uma tendência genética de causas desconhecidas, segundo o coordenador do serviço de Embolização de Miomas do Hospital Semper, Ilveu Cosme Dias.
A embolização das artérias uterinas consiste na obstrução da passagem de sangue para os tumores, que, literalmente, morrem. Podem se calcificar ou ser eliminados pelo organismo, por meio de uma expulsão uterina. Mulheres portadoras de um conjunto de fatores que comprometem a qualidade de vida, como muitos miomas, útero grande, sangramento uterino que provoca anemia, e cuja única chance de melhora seria a retirada do útero, mesmo não tendo filhos é um caso típico para embolização, de acordo com o ginecologista e obstetra. “Há chances muito boas de uma gestação se as questões dos miomas e sangramento, concomitantes, eram as únicas dificuldades de engravidar. Cerca de 60% das pacientes que não conseguem engravidar têm sucesso”, afirma Ilveu Dias, também especialista em reprodução humana.
EFICIÊNCIA CIENTÍFICA
De acordo com ele, a maioria dos hospitais de médio e grande portes, em Belo Horizonte, tendo serviço de hemodinâmica bem-estruturado, está apta a fazer o procedimento. “A maior dificuldade é montar uma boa equipe multidisciplinar para o êxito do procedimento, ficando cada etapa do processo a cargo de um especialista. Esse tem sido o segredo do nosso sucesso”, diz. Estão envolvidos radiologista, para a aquisição das imagens por ressonância magnética nuclear no pré-operatório; hemodinamicista, para levar o cateter às artérias uterinas; anestesista; e um ginecologista com experiência suficiente para coordenar todo esse processo.
Trabalhos científicos feitos nos Estados Unidos e em países da Europa mostram que entre 85% e 95% das mulheres submetidas à embolizacão têm remissão significativa ou total do sangramento, dor e outros sintomas. Não foi observada qualquer recorrência do problema em mulheres que foram acompanhadas por até cinco anos depois do procedimento. Ilveu Dias defende que a possibilidade de preservação do útero seja informada a todas as pacientes, sob pena de transtornos legais para o médico. “Numa situação em que o médico não comenta sobre essa alternativa, oferecendo apenas a retirada do órgão à paciente com um quadro clínico de miomas em crescimento e comprometendo a saúde, cria-se um delicado recurso médico-legal. Se ela perde o útero e fica sabendo, depois, da existência da técnica pode trazer problemas ao profissional que não a orientou de forma adequada.”
Sem enxaquecas e cólicas
Depois de se submeter à miomectomia, a assistente de recursos humanos Gracielle Oliveira ouviu dos médicos que só teve o útero preservado porque se casaria em breve e ainda não tinha filhos. Logo, o mais indicado era engravidar rápido, enquanto o órgão estava livre de tumores. Estava instalada, a partir dali, uma corrida contra o tempo. Foram três anos tentando engravidar e, como o pior cenário já estava traçado, ela não se deu por vencida. Isso porque, sete meses depois da intervenção para a retirada dos miomas, os tumores voltaram.3
o se ver diante da esperança da embolização, estava disposta até mesmo a ir a São Paulo em busca de profissionais, mas descobriu o tratamento em BH. Ela se submeteu ao procedimento em 2010 e conta que, hoje, tem vida normal. Ficaram no passado as enxaquecas, cólicas e fluxos menstruais de 10 a 12 dias.
CIRURGIA
A cirurgia durou apenas uma hora. Ela ficou hospitalizada 12 horas e, cinco dias depois, estava de volta ao trabalho – experiência bem diferente da miomectomia, que demorou quatro horas e lhe custou 40 dias de afastamento das atividades. “Na primeira menstruação, notei a diferença. Fiz uma ressonância antes e outra quatro meses depois para comparar. Todos os miomas foram calcificados, como se tivessem morrido asfixiados”, relata.
A gravidez foi perfeita e saudável. Em quase quatro anos, se dedicou exclusivamente ao filho Gustavo. Apenas agora está retomando a vida profissional. E aconselha a quem sofre de problema semelhante a também não desistir: “Por meio dela, meu sonho foi realizado”.
O que é
• Procedimento minimamente invasivo que requer somente uma pequena punção na pele feita sob anestesia local
• O terapeuta endovascular faz uma incisão de aproximadamente 2 milímetros na pele da virilha, por onde introduz um cateter na artéria que passa abaixo da pele. Ele é direcionado por dentro das artérias visualizadas com o uso de um equipamento de fluoroscopia digital (raios X), até alcançar as artérias uterinas, que levam sangue para os miomas.
• Nessa posição, são injetadas partículas plásticas apropriadas até obstruir completamente as artérias e comprovar que o mioma não receba mais sangue. As partículas são um tipo de plástico biológico, PVA (polivinil álcool), que é inerte ao organismo e tem um papel mecânico no processo, sem comprometer o restante do útero, desde que se tomem os cuidados necessários.
• A embolização uterina geralmente requer uma noite de hospitalização. Após o procedimento prescreve-se medicação para a dor espasmódica ou cólicas, que são efeitos colaterais comuns. Febre é um efeito adverso ocasional e pode ser facilmente controlado com medicação antitérmica. A recuperação leva em geral quatro dias.
FONTE: Serviço de Embolização de Miomas/Hospital Semper