Bem que as avós diziam: nada como um chazinho para restabelecer a saúde. Se, para elas, não há muita novidade nisso, somente poucos anos atrás os cientistas voltaram os olhos para ingredientes naturais utilizados na medicina popular. Entre eles, os extratos de frutas e flores servidos fumegantes. De todos, um dos mais promissores é o chá-verde, consumido na Ásia há pelo menos 5 mil anos. Estudos recentes demonstram que a bebida pode auxiliar na prevenção e no controle de diversas doenças: dos males neurodegenerativos aos metabólicos, como obesidade e diabetes 2.
Na semana passada, cientistas do Instituto de Pesquisas Alimentares da Inglaterra publicaram um estudo na revista Molecular Nutrition and Food Research afirmando que encontraram evidências sobre um mecanismo pelo qual compostos presentes no chá ajudam a proteger o organismo. Paul Kroon, pesquisador do instituto e principal autor do artigo, lembra que já é de conhecimento público o benefício das frutas e dos vegetais na redução do risco de doenças crônicas, como câncer e problemas cardiovasculares. Segundo ele, há diversas razões para isso, incluindo a presença de polifenóis, compostos naturais com propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias.
Agora, a equipe de Kroon constatou que os polifenóis do chá-verde bloqueiam a molécula VEGF, que, no corpo, pode desencadear o entupimento das artérias que irrigam o coração. Essa substância também tem sido alvo de alguns medicamentos oncológicos. “No corpo, a VEGF estimula a formação de vasos sanguíneos por meio da angiogênese. Esse processo é crucial para a progressão do câncer, assim como para o desenvolvimento das placas ateroscleróticas e para a formação de coágulos que causam ataques cardíacos e derrame”, explica.
No laboratório do Instituto de Pesquisas Alimentares, os cientistas aplicaram baixas concentrações de um tipo de polifenol do chá-verde em células derivadas de vasos sanguíneos humanos. Eles verificaram que a substância natural conseguiu inibir a sinalização da VEGF. “Esta é a primeira vez que um estudo comprova que os polifenóis interagem diretamente com a molécula para bloquear seus sinais em um nível que se pode ver na corrente sanguínea após a ingestão de alimentos ricos nessas substâncias”, diz Kroon. De acordo com ele, se esse efeito ocorrer no corpo inteiro e não só no sangue, essa será a explicação para os efeitos benéficos do chá-verde — e de outros ingrediente que contêm os mesmos polifenóis — para a saúde.
Pâncreas
No Instituto de Pesquisa Biomédica de Los Angeles, pesquisadores também tentam decifrar os mecanismos pelos quais o chá-verde atua em outra frente — o combate ao câncer. Muitos estudos sugerem que os compostos da bebida não apenas previnem, mas têm o potencial de lutar contra o desenvolvimento da doença. Contudo, sem saber exatamente como isso acontece, é impossível fabricar medicamentos que usem elementos do ingrediente como princípio ativo.
Em uma pesquisa recente, cientistas do instituto fizeram grandes avanços nesse sentido. Descobriram que um composto encontrado com abundância no chá-verde, a epigalocatequina-3-galato (EGCG), muda o metabolismo das células do câncer de pâncreas, um dos mais desafiadores para a medicina. A substância consegue fazer isso ao suprimir a expressão de uma enzima associada à doença, a LDHA. Sem a ação dessa enzima, as células doentes não conseguem se manter ativas.
“Nosso estudo mostrou que compostos do chá-verde mudam o sistema metabólico e têm um grande impacto sobre o câncer”, diz Wai-Nang Lee, principal autor do trabalho, publicado na revista Metabolics. “Explicando como o componente ativo do chá pode prevenir tumores, acreditamos que esse resultado pode abrir a porta para uma nova área de pesquisa sobre o câncer. Precisamos investir em pesquisas que nos ajudem a entender como os alimentos previnem e reduzem o crescimento das células cancerosas”, afirma.
“Explicando como o componente ativo do chá pode prevenir tumores, acreditamos que esse resultado pode abrir a porta para uma nova área de pesquisa sobre o câncer” - Wai-Nang Lee, pesquisador do Instituto de Pesquisa Biomédica de Los Angeles.
Melhora cognitiva
Os benefícios do chá-verde vão além das doenças crônicas. Males neurodegenerativos entram na lista dos que podem ser combatidos pelos compostos presentes na bebida. “No passado, os principais ingredientes desse chá foram exaustivamente estudados na pesquisa de câncer. Mas, recentemente, também estamos interessados nos impactos positivos dele sobre a performance cognitiva”, conta Christoph Beglinger, pesquisador do Hospital Universitário de Basel, na Suíça.
Ele conduziu um estudo sobre os benefícios das substâncias naturais do chá-verde no cérebro e obteve resultados promissores. “Descobrimos que o extrato do chá aumenta a efetividade das conexões cerebrais, algo que teve consequências práticas em testes que realizamos com pacientes”, conta. De acordo com Beglinger, os voluntários que tomaram o extrato se saíram melhor em testes de memória. Logo após ingerir uma bebida contendo muitos gramas do chá, os participantes resolveram problemas que exigiam a memória de trabalho, muito afetada em doenças como Alzheimer e demências em geral.
Em seguida, eles foram submetidos ao exame de ressonância magnética cerebral, que mostra a ativação das redes neuronais. As imagens revelaram que houve um aumento na conectividade entre o córtex parietal e o frontal, áreas relacionadas à retenção de informação. “Ao menos em curto prazo, o chá-verde aumenta a plasticidade das conexões do cérebro”, diz o pesquisador.
Origem chinesa
Associado à Inglaterra, onde é quase uma instituição há mais de três séculos, o chá tem, na verdade, origem na China. A história da bebida teria começado em 2.737 a.C., durante o império de Shen Nung. De acordo com a lenda, ele estava sentado debaixo de uma árvore enquanto seu empregado segurava uma xícara com água fervente. Folhas caíram no recipiente, aguçando a curiosidade de Nung, um herbalista renomado. Ele, então, resolveu provar a infusão criada acidentalmente.
Se a história é verdade, ninguém sabe. Mas há evidências de que, no Oriente, a bebida é, de fato, milenar. Escavações em tumbas da dinastia Han (entre 206 a.C. e 220 d.C.) revelaram a existência de recipientes contendo chá. Mas foi na dinastia Tang (618 a 906 d.C.) que a bebida se tornou uma verdadeira febre na China.
No Ocidente, as primeiras menções ao chá aparecem no século 16, principalmente em Portugal, onde comerciantes e missionários religiosos, que viajavam muito, tinham contato com a infusão. Os holandeses começaram a importar a bebida da ilha de Java em 1606. Por causa do alto preço, tornou-se uma bebida elitista e não demorou para despertar o interesse da Europa ocidental. No Brasil, as primeiras mudas de chá foram plantadas no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, a mando de D. João VI.
Fonte: Tea Council da Inglaterra