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Pesquisadores da Escola de Medicina de Harvard identificaram na medula espinha um importante mecanismo neural que envia sinais de dor errôneos ao cérebro. Há neurônios específicos envolvidos nesse processo. Segundo Martyn Goulding, coautor do estudo, mesmo feita em ratos, essa descoberta inédita permite aos cientistas começarem a desvendar a “caixa-preta” do problema em humanos. “Identificar os neurônios que compõem esses circuitos é o primeiro passo na compreensão de como a dor crônica decorre de processamento neural disfuncional (…) Pode ser que algo dê errado no funcionamento desse circuito espinhal e faça com que sensações emerjam com a dor”, explica. Entender o processo por completo pode ajudar, por exemplo, no desenvolvimento de remédios que neutralizem a ação das células nervosas defeituosas.
Também nos Estados Unidos, uma equipe da Universidade de Syracuse identificou uma associação perigosa do problema crônico com o consumo de álcool: o excesso de ingestão provoca mais desconforto. É comum, no entanto, pacientes recorrerem a bebidas alcoólicas para ofuscar a dor incapacitante. Doses moderadas, entretanto, podem se mostrar benéficas. “Pesquisas futuras podem informar aplicações teóricas e clínicas por meio da análise das relações temporais entre dor e consumo de álcool, ajudando no desenvolvimento de novas intervenções”, escreveram no artigo divulgado.
Pesquisadores do Instituto Butantan e da Universidade Stanford trabalham em uma molécula sintética que poderá dar origem a uma nova classe de analgésicos aparentemente sem efeitos colaterais, como dependência e complicações cardiovasculares. A Alda ativa a enzima ALDH2, que degrada os aldeídos — compostos formados em processos inflamatórios e que causam a sensação de dor. Quanto mais ativa for a ALDH2, menor é a quantidade de aldeídos — e, consequentemente, a dor. A molécula foi testada em ratos com inflamações e apresentou resultados promissores. A próxima etapa consiste em tratar, ainda em animais, o desconforto mais crônico, como o causado pela artrite reumatoide.
A Associação Internacional para o Estudo da Dor estima que o problema crônico afete o bem-estar fisiológico e psicológico de 15% a 30% dos adultos nos países ocidentais. Nos EUA, o número de adultos com dor crônica é estimado em 100 milhões. Um levantamento divulgado em 2013 pela Sociedade Brasileira de Estudos para a Dor (Sbed) mostrou que, aqui, a doença alcança até 40% da população, variando conforme a unidade da Federação.
“Uma lesão cicatriza em três ou quatro semanas e, se for em um tecido mais difícil, em até três meses. Quando a dor passa desse tempo, é um sinal de que há algo errado”, alerta Luís Cláudio Modesto, neurocirurgião funcional do Hospital Santa Luzia. Segundo o médico, que também é membro da Sbed, a dor anormal é processada por um circuito “doente, estranho, desorganizado e confuso”.
Existem alguns fatores para isso. Um deles é individual, o que significa que algumas pessoas são mais predispostas a desenvolver a enfermidade. “Se 100 soldados enviados para a guerra fossem alvejados na mesma mão e com a mesma arma, de 5% a 7% desenvolveriam o mal por terem características neurológicas e moleculares específicas”, exemplifica Modesto.
O médico acrescenta que a própria memória da dor pode desencadear o descontrole dos sentidos. Uma pessoa que sofre do problema durante muito tempo ou é vítima de uma dor mal tratada tem mais chances de desenvolver o problema crônico. “A dor aguda pode evoluir para esses processos mais graves e que costumam se agravar cada vez mais com o tempo”, esclarece Modesto.
"Uma lesão cicatriza em três ou quatro semanas e, se for em um tecido mais difícil, em até três meses. Quando a dor passa desse tempo, é um sinal de que há algo errado” - Luís Cláudio Modesto, neurocirurgião funcional do Hospital Santa Luzia
Há um terceiro fator coadjuvante no aparecimento da dor crônica: o acometimento direto ou indireto do sistema nervoso central ou periférico. As doenças e lesões que afetam regiões próximas aos nervos ou que os atingem, principalmente os mais próximos da coluna, costumam ter papel de destaque no aparecimento do problema. É o caso da neuropática, que ataca a medula ou o plexo nervoso — rede de nervos que se entrecruzam. Eliete Silva Rodrigues, 58 anos, convive com o desconforto há mais de 10 anos. Os prejuízos foram tantos que ela precisou se aposentar por invalidez.
Tudo começou em 2003, após uma cirurgia na coluna para tratar uma hérnia de disco. Desde então, Eliete foi submetida a diversas intervenções cirúrgicas. Mesmo assim, continua sofrendo com tormentosas sensações de ardência nas costas e nas pernas, além de restrições sociais. “Mais ou menos 80% das cirurgias de coluna dão certo. Das 20% que não dão, 5% dos pacientes não se recuperam e eu estou dentro desse percentual”, lamenta.
Por causa das dores, Eliete ficou quatro meses acamada e seis dias em coma. Até então, nunca tinha ouvido falar de dor crônica. Só teve os sintomas amenizados quando recebeu o primeiro implante neuroestimulador. Esse tratamento, explica Luís Cláudio Modesto, neurocirurgião funcional do Hospital Santa Luzia, é o mais moderno disponível. Consiste em um circuito de fios e eletrodos que induzem uma atividade elétrica saudável. “Essa espécie de marca-passo é colocada onde o médico considerar mais apropriado, e os fios ficam na região do sistema nervoso que está doente. Então, se tem uma dor na perna que vem da coluna, o fio fica lá”, detalha o médico.
Eliete já colocou três, sendo que os dois primeiros eram menos modernos. “O que utilizo hoje pode se recarregado em casa e é bipolar, funciona nos dois lados do corpo”, conta. A fisioterapia, a hidroterapia e a medicação oral ajudam. O acompanhamento psicológico também. “ Não posso fazer coisas simples, como varrer a casa, nem dançar. Tento ter uma vida quase normal, mas, às vezes, a dor é tanta que mal saio da cama”, queixa-se.
Especialista em dor crônica do Hospital Universitário de Brasília (HUB), Tiago da Silva Freitas aponta que há fatores emocionais envolvidos no problema. “Naturalmente, o paciente deprimido tem um limiar de dor mais baixo. Isso, além de tudo, gera angústia, ansiedade, tristeza e limitação”, diz. O problema, segundo ele, também varia conforme o sexo e a idade, sendo as mulheres e os idosos os mais suscetíveis. É possível, portanto, que haja uma influência hormonal. “Não existe uma resposta para isso. De forma geral, as mulheres têm um limiar de dor maior, mas também sofrem mais com a forma crônica da sensação. Nesse sentido, a fibromialgia é a mais comum”, diz o também coordenador do Instituto da Dor de Brasília.
Paulo Castro Carneiro, comerciante de 53 anos, consegue resolver as dores crônicas apenas com uma palmilha especial. Corredor de rua há 10 anos, ele desenvolveu metatarsalgia. “Ao aumentar o volume dos treinos, comecei a sentir o desconforto como se estivesse embaixo do dedo do meio do pé. Dói se eu andar descalço ou na praia. Não tem cura, mas existe uma forma de lidar com isso, que é a adaptação dos calçados”, conta.
Freitas ressalta que a avaliação do médico é fundamental para a definição do melhor tratamento e o diagnóstico correto do problema. “Às vezes, o paciente roda em vários consultórios e é tratado com analgésicos comuns, mas há uma série de opções, das mais conservadoras, como medicamentos, até as alternativas, como acupuntura”, diz, fazendo outro alerta em seguida: “Quanto mais dor crônica, menor o limiar de dor. A gente não pode ser conivente com isso”. (IO)
Volume no antepé
Quem sofre com o problema tem a sensação de que está andando sobre pedras ou como se houvesse uma bola ou meia dobrada no antepé, o que causa queimação ou dor difusa. Fatores que provocam estresse adicional na parte dianteira do pé podem causar a metatarsalgia, como o excesso de peso, o uso de sapato alto e o joanete. Há casos também em que a anatomia do pé facilita o desenvolvimento do problema. Massagens, fisioterapia motora e alongamento estão entre as intervenções propostas. Tratamentos mais invasivos preveem a injeção de medicamentos na articulação comprometida ou em torno do nervo irritado.