Anticorpo freia HIV por 28 dias

Composto criado nos EUA reduziu a carga do vírus em 17 voluntários, impedindo que ele se espalhasse pelo corpo. Pesquisa que reforça o potencial da imunoterapia é liderada por brasileiro

por Vilhena Soares 14/04/2015 15:00

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Grande parte das pesquisas recentes contra o HIV foca no desenvolvimento de vacinas, mas as mutações constantes sofridas pelo vírus são um entrave considerável nesse sentindo. Por conta desse obstáculo, cada vez mais cientistas têm voltado os olhos para estratégias de eliminação da Aids por meio da imunoterapia, intervenção que estimula o sistema de defesa da pessoa infectada. Norte-americanos detalham na revista Nature os efeitos de um anticorpo que conseguiu conter o avanço do perigoso micro-organismo em humanos.

Desenvolvido em laboratório sob a liderança do brasileiro Michel Nussenzweig, pesquisador da Universidade de Rockefeller, o anticorpo 3BNC117 já havia sido testado com sucesso em ratos e primatas modificados para responder à contaminação de forma semelhante à de pacientes. “Ele pode prevenir a infecção e suprimir o vírus em camundongos e macacos ‘humanizados’, mas o seu potencial para o HIV humano em imunoterapia ainda não havia sido analisado”, justificaram os autores no texto divulgado.

Clonada a partir de um paciente infectado com HIV, a molécula foi, então, testada em dois grupos de pessoas: 12 não tinham o vírus e 17 eram soropositivas, sendo que duas estavam em tratamento com antirretrovirais. O anticorpo foi aplicado nos voluntários em dose única e neutralizou o vírus da Aids, impedindo que ele abordasse os linfócitos CD4, porta de entrada do vírus no organismo humano. Assim, houve queda significativa da carga viral entre o 4º e o 28º dia. Após esse período, a quantidade do patógeno no sangue começou a subir. Cinquenta e seis dias depois da intervenção, chegou ao mesmo nível de antes da injeção em quatro dos oito voluntários.

O 3BNC117 mostrou-se eficaz sobre a maioria das cepas do HIV. Foi “bem tolerado” e não apresentou efeitos colaterais sérios. Os cientistas também notaram que o tempo de ação do anticorpo foi maior nos voluntários que não tinham o vírus da Aids. “Concluímos que o 3BNC117 tem ação consistente em indivíduos não infectados e uma taxa ligeiramente mais rápida de deterioração nos contaminados”, resumiram no artigo.

Para a equipe de estudiosos, os resultados potencializam a possibilidade de uso da imunoterapia para o tratamento da Aids. A análise é compartilhada por Alberto Chebabo, infectologista do Laboratório Exame, em Brasília. “Esses cientistas conseguiram, em um trabalho experimental, reduzir as taxas de carga viral. Não foi uma ação completa, mas poderá, sim, ser utilizada futuramente em parceria com outros tratamentos”, acredita.

Infectologista e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Dirceu Greco também acredita que o 3BNC117 possa ser prescrito com outras intervenções. Por exemplo, em uma combinação que estimule o sistema de defesa ao mesmo tempo em que ataque o HIV. “Existe uma possibilidade futura do uso desse anticorpo com outros medicamentos que já são eficazes no controle do vírus, recursos que as pessoas soropositivas já usam para controlar a infecção”, diz.
CB/D.A Press
Clique na imagem para ampliá-la e saiba mais (foto: CB/D.A Press)

Mais aplicações
Chebabo também destaca que outras estratégias haviam sido feitas na área de imunoterapia para o tratamento do HIV, mas não apresentaram resultados positivos. “Houve outras tentativas, mas foram falhas e se mostraram ineficazes para combater o vírus.” O histórico do uso da imunoterapia indica efeitos eficazes no tratamento de outras doenças, como tumores malignos, mas ainda é muito inicial quanto ao combate ao vírus da Aids.

Como a ação do 3BNC117 foi maior nos voluntários não infectados, os cientistas liderados por Nussenzweig apostam também na possibilidade de o anticorpo ser usado em uma futura imunização contra o HIV. O infectologista Dirceu Greco, porém, acredita ser difícil essa aplicação. “Mesmo o anticorpo se mostrando bastante eficaz, o uso dele em uma vacina pode ser mais complicado porque o vírus é muito mutante. Até hoje, ainda não foi possível encontrar uma maneira de impedir que ele se reproduza”, explica.

Apesar do caminho a ser percorrido ser extenso, Greco acredita que a pesquisa possa contribuir para a busca por uma intervenção definitiva contra a Aids. Segundo ele, os pesquisadores tinham deixado de lado a possibilidade da eliminação do vírus, mas, com a observação de que as vacinas são mais difíceis de serem desenvolvidas, a possibilidade de acabar com o HIV voltou a ganhar força nos laboratórios. “Claro que esse objetivo é algo cotado para um futuro distante, mas acredito que pesquisas como essa sirvam como um dos pequenos tijolos na estrada em busca da cura dessa doença”, opina.



Foco também no câncer
O tratamento com imunoterapia é feito por meio da introdução de substâncias que vão induzir o sistema imunológico do paciente a produzir células de defesa ou anticorpos produzidos em laboratório e programados para destruir patógenos ou tumores. A técnica é utilizada no combate a doenças como hepatite e alergias respiratórias, e tem sido muito pesquisada no tratamento para o câncer. Os medicamentos imunoterápicos educam os mecanismos de defesa para que eles só “ataquem” os tumores. Assim, a ação torna-se mais eficiente que a quimioterapia, que “envenena” tanto as células saudáveis quanto as tumorais. Combinações de imunoterapia com recursos tradicionais (quimioterapia, radioterapia, cirurgia, entre outras) também têm sido estudadas, assim como a junção de diferentes imunoterápicos.



Notícia desafiadora
“Esse novo estudo emocionante mostra, pela primeira vez, que os anticorpos podem ter um lugar na linha de terapias contra o HIV. As dificuldades em se obter uma vacina anti-HIV ou erradicar a infecção levaram os investigadores a identificar novas abordagens. Embora o estudo tenha avaliado a eficácia do anticorpo 3BNC117 por apenas um curto período de tempo em pacientes com Aids, a pesquisa mostrou que ele pode diminuir os níveis de vírus no sangue. Essa é uma boa notícia para a luta contra o HIV, mas um anticorpo totalmente desenvolvido para tratar esse vírus ainda pode levar alguns anos para ser criado”

Vincent Piguet, diretor do Instituto de Infecção e Imunidade da Universidade de Cardiff, no Reino Unido, em comunicado divulgado na Nature

Vitamina D para tratar linfoma
Conhecida por fortalecer os ossos e proteger o coração, a vitamina D também pode ser uma combatente na luta contra as células do câncer. Um estudo alemão publicado na edição de hoje da Science Translational Medicine mostra que o suplemento dessa substância pode estimular macrófagos — células do sistema imunológico — a matar linfomas.

Liderados por Heiko Brun , do Hospital Universitário Erlangen, os investigadores partiram de resultados anteriores indicando que uma parcela de pacientes com níveis baixos de vitamina D respondem mal à quimioterapia e à imunoterapia, o que faz necessária a ingestão de suplementos da substância antes e durante o tratamento. “Em um estudo recente, a deficiência de vitamina D foi associada a menor sobrevida em tratamento de tumores em humanos, destacando a sua importância no organismo”, complementaram os autores no texto divulgado na revista científica.

Para descobrir o mecanismo por trás dos potenciais benefícios da substância, a equipe do Centro de Pesquisa Alemão de Saúde Ambiental de Munique analisou os efeitos da vitamina sobre a capacidade dos macrófagos de combater as células cancerígenas. Em testes de laboratório, descobriram que ela estimula os macrófagos a secretar a catelicidina, um peptídeo que mata as células do linfoma.

Nos testes, os macrófagos de pessoas com esse tipo de câncer mostraram menos habilidade para metabolizar a vitamina D. Nessas condições, produziram menos catelicidina, não conseguindo, assim, matar as células cancerosas. Ao tratar os macrófagos com a mesma vitamina, os cientistas conseguiram aumentar a produção de catelicidina, intensificando também a morte dos linfomas.

Para os cientistas, os resultados vão apoiar o início de ensaios clínicos focados no uso da vitamina D como agente potencial para o tratamento do linfoma, principalmente em combinação com alguns anticorpos. “Além de fornecer provas de que a manutenção de níveis adequados dessa substância pode ser benéfica para a manutenção antitumoral”, ressaltam.

Problema linfático

É um tumor maligno que se origina no sistema linfático: rede de tubos, nódulos e outros órgãos que são responsáveis pelo transporte de linfócitos (tipo de leucócitos, os glóbulos brancos do sangue) para todas as partes do corpo. Em grande parte dos casos, a origem desse câncer é desconhecida, porém o surgimento da doença também está relacionado a mudanças nos genes de células ou do DNA e a alguns tipos de infecções virais que afetam a imunidade.