Na edição deste mês da revista Jama Medicine, da Associação Médica Americana, um estudo mostrou que a dieta vegetariana diminui significativamente os riscos de desenvolvimento do câncer colorretal, o segundo tipo mais comum entre mulheres e o terceiro entre homens no Brasil, segundo números do Instituto Nacional de Câncer. Na publicação Incidência de câncer no Brasil — estimativas 2014, o Inca destaca que essa doença é resultado de interação de fatores internos e ambientais, sendo que a dieta é o principal deles, com a ingestão de carne vermelha e de embutidos sendo considerada o fator de risco crucial.
Na pesquisa norte-americana, investigadores da Universidade Lorna Linda, na Califórnia, constataram que os participantes que seguiam uma dieta vegetariana apresentaram risco 22% menor de desenvolver a doença, com 19% menos chances de ter câncer de cólon e 29% menos de câncer retal. Foram analisados dados de 77.659 homens e mulheres recrutados de um estudo longitudinal que durou entre 2002 e 2007. “Muitos estudos sugerem que a alimentação rica em carne vermelha e em carne processada pode aumentar o risco do câncer colorretal, enquanto que a forte em frutas, vegetais e grãos integrais tem sido associada à redução. Queríamos ver se o consumo de vegetais, de fato, poderia afetar o risco de desenvolver essa doença”, explica Michael J. Orlich, coautor do artigo.
Nesse caso, quem mais se beneficiou foram as pessoas que não ingeriam carne vermelha nem ave, mas comiam peixe. Elas apresentaram risco 49% menor, seguidas das lacto-ovovegetarianas (redução de 18%), da veganas (16% a menos) e das flexíveis (risco 8% mais baixo). De acordo com Orlich, há algumas pistas sobre a relação do consumo de carne vermelha e o câncer colorretal: “Não há consenso ainda das causas, mas há teorias que culpam substâncias químicas que a carne produz e que, no trato digestivo, se convertem em compostos cancerígenos”, conta. Também há evidências de que, no cólon, a carne modifica o DNA das células, tornando-as suscetíveis à formação de tumores.
Mente saudável
Se faz bem para o corpo, o consumo elevado de vegetais em detrimento dos produtos de origem animal também está associado à saúde da mente. Na edição de março/abril da revista American Journal of Health Promotion, pesquisadores do Comitê de Médicos pela Medicina Responsável, um órgão não governamental dos EUA, descobriram que 18 semanas de dieta vegetariana melhoram a produtividade dos empregados e aliviam sintomas de ansiedade, fadiga e depressão.
Mais de 100 pessoas com índice de massa corporal acima de 25, que já indica sobrepeso, e previamente diagnosticadas com diabetes 2 participaram do estudo. Elas foram submetidas a uma dieta vegetariana de baixa gordura, baixo índice glicêmico e grandes quantidades de fibra. “De forma geral, todas experimentaram um aumento na produtividade no trabalho, que foi medido por um questionário padrão”, conta o médico Neal Barnard, principal autor do estudo.
Além disso, os participantes demonstraram menos sintomas de depressão, ansiedade e fadiga, também avaliados por um questionário. De bônus, perderam em média de 5kg, tiveram redução de colesterol e índice glicêmico. O cardápio diário incluía sanduíches de carne de soja, saladas verdes e feijão-preto, além de uma grande variedade de frutas e vegetais. A ideia era oferecer produtos facilmente encontrados nas cafeterias das empresas. Arroz integral, nozes e pães de centeio também integravam o menu.
De acordo com Barnard, esses alimentos, além de saudáveis, aumentam a produção de serotonina no cérebro — essa substância natural traz sensação de bem-estar e, em baixos níveis, causa depressão. “Os mesmos alimentos que diminuem risco de obesidade, doenças coronarianas e diabetes também levantam o humor e fornecem bem-estar”, observa o médico.
Novos hábitos
Para o produtor rural Paulo Meireles, 64 anos, esses resultados não chegam a ser novidade. Afinal, há 22 anos, ele os experimenta na própria pele. O ex-pecuarista e ex-carnívoro adotou o vegetarianismo em 1993 e, há cinco anos, tornou-se vegano, abolindo qualquer produto de origem animal. “Antes, já tive crises renais, prostatite e colesterol alto. Tudo isso acabou”, conta Meireles, que também se exercita regularmente e faz meditação. “Somos aquilo que comemos e pensamos. Para mim, a vida saudável se baseia na alimentação, na meditação e na atividade física”, ensina.
Dono de uma propriedade rural em Goiás, Paulo se desfez do gado e passou a produzir grãos quando começou a estudar a doutrina espírita. “Adquiri outra visão, outra concepção. Não concordo que se matem animais para a alimentação de humanos. Temos outras formas de alimentação muito mais saudáveis”, afirma
Entre 1991 e 1993, gradativamente, ele passou da carne vermelha para o frango e, depois, só peixe. Finalmente, tornou-se vegetariano e, agora, é vegano. O nível de PSA — substância produzida pela próstata — do produtor rural chegou a 3,4 no auge do estilo carnívoro. Agora, é de 0,3. “Eu também tinha crises renais terríveis e era tão dependente de analgésico para dores no corpo que tomava um todo dia”, recorda. Tudo isso acabou com a adoção da dieta livre de produtos animais. “Minha saúde nunca esteve tão boa”, garante.
Menos carne já melhora
Se abandonar totalmente a carne é muito difícil, comê-la com moderação também traz benefícios à saúde, de acordo com estudo apresentado neste mês no congresso da Associação Americana do Coração, que analisou 451.256 europeus. Pessoas que aderiam a um cardápio mais próximo do vegetarianismo, com 70% dos alimentos provenientes de fontes vegetais, tinham 20% menos risco de morrer de doenças cardiovasculares, comparadas àquelas cujo consumo de frutas, legumes e verduras correspondia a menos de 45% da dieta.
O estudo incluiu quase meio milhão de pessoas de 10 países que não tinham doenças crônicas no início da pesquisa, em 1992, de 35 a 70 anos, e foram acompanhadas, em média, por 12 anos. Os pesquisadores coletaram informações sobre peso, altura, consumo alimentar, estilo de vida e atividade física. Registravam as causas e as datas de óbito dos participantes, fizeram associações com os outros dados e, depois, os associaram ao risco de morte por doenças cardiovasculares.
“Em vez de um corte drástico nos alimentos de base animal, a substituição de algumas porções de carne na dieta por fontes vegetais pode ser algo muito simples e fácil de aderir para diminuir a mortalidade cardiovascular.” resssalta Camille Lassale, principal autora do estudo e epidemiologista do Imperial College London.
A nutricionista funcional e esportiva Jamila Vital, consultora do restaurante natural Lótus Azul, diz que a alimentação saudável não precisa excluir nenhum componente. Ela sugere a redução de carne vermelha e o consumo de peixe e de frango orgânico caipira. “Pode consumir a carne um dia sim e um dia não”, sugere. Para quem não abre mão dela, uma dica para ajudar na digestão: “Na mesma refeição que tiver carne, consuma muita fibra, para melhorar o trânsito intestinal”.