A primeira etapa da pesquisa consistiu em um teste para verificar o potencial antioxidante do açafrão. Já se sabia que o pó amarelado favorece o combate aos radicais livres — responsáveis por desencadear e potencializar doenças ligadas ao envelhecimento. A partir desse resultado, iniciou-se a etapa com animais. Ratos foram submetidos a uma situação de estresse ao longo de seis meses, por meio de natação forçada. As cobaias eram colocadas em um tanque de acrílico, em formato cilíndrico, com água, e tinham que se locomover. A mobilidade variou muito entre os bichos que ingeriam a cúrcuma e os que não.
Segundo Barankevicz, o segundo grupo permaneceu imóvel, com um comportamento típico de deprimidos. No entanto, os ratos que consumiam o açafrão nadaram para tentar se livrar do problema. “Os que não receberam o produto não tinham estímulo de fuga, se tornando imóveis. Esse é um comportamento típico depressivo. Quando são submetidos a situações estressantes, os deprimidos acabam as aceitando porque não têm estímulo. A cúrcuma serviu como um estímulo”, explica a nutricionista.
A pesquisa foi orientada pela professora Jocelem Mastrodi Salgado, do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da USP. Houve parceria com a Faculdade de Odontologia de Piracicaba, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Diante da necessidade de estudar compostos bioativos em alimentos de origem vegetal, o trabalho terá prosseguimento em março. Desta vez, como parte do doutorado de Gizele Barankevicz.
Efeito no fígado
Na nova etapa do estudo, a nutricionista vai avaliar a citotoxicidade do consumo da cúrcuma. Isso porque, toda vez que se trabalha com um alimento ou medicamento, é necessário verificar se ele causa algum efeito colateral no fígado. Segundo Barankevicz, as quantidades usadas nos ratos não trouxeram qualquer sintoma negativo, mas, agora, é preciso analisar uma porção maior, pensando em como ela agiria em humanos. No doutorado, também será estudada a ação de alguns neurotransmissores em cérebros animais. Há pesquisas que indicam que o açafrão tem um efeito neuroprotetor.
Sobre o uso do açafrão em medicamentos, a nutricionista afirma que deve ser tratado no âmbito médico, até porque a linha de pesquisa conduzida por ela é focada nos benefícios que podem ser trazidos pelos alimentos, incluindo a prevenção de doenças. Mas Barankevicz lembra que há estudos envolvendo até o uso de cápsulas de curcumina — feito a partir da cúrcuma — para algumas doenças. Sabe-se que a substância tem, por exemplo, um forte componente anti-inflamatório.
"Quando são submetidos a situações estressantes, os deprimidos acabam as aceitando porque não têm estímulo. A cúrcuma serviu como um estímulo” - Gizele Barankevicz, pesquisadora da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP
Largo emprego na cozinha
O açafrão é uma planta herbácea da família do gengibre (Zingiberaceae), originária da Ásia (Índia e Indonésia). Dela, obtém-se uma especiaria homônima, que é o principal componente do tempero pó de caril. Sua característica principal é a forte cor amarela, transferida aos alimentos. Da sua raiz seca e moída, se extrai o pó, conhecido simplesmente por açafrão e utilizado como condimento ou corante (amarelo e brilhante) na culinária e na produção de medicamentos. No Brasil, o uso do açafrão no preparo de determinados pratos é bastante regionalizado, como no caso do frango ensopado e da galinhada. Há locais, no entanto, que é substituído pelo urucum.