O trabalho de um grupo de cientistas da University College London — financiado pela Pesquisa em Câncer do Reino Unido —, da Fundação Britânica do Coração e do Instituto Nacional sobre Envelhecimento baseia-se na análise de 3.722 casais participantes do Estudo Inglês Longitudinal sobre o Envelhecimento (ELSA), casados ou vivendo juntos e com idade superior a 50 anos. Eles observaram como as pessoas conseguiram — ou não — parar de fumar, abandonar o sedentarismo ou perder peso, considerando a atitude do(a) companheiro(a). Os resultados, publicados na edição deste mês da Jama Internal Medicine, indicam que as pessoas são mais bem-sucedidas na extinção dos maus hábitos quando o(a) parceiro(a) também faz a mudança.
Das mulheres que fumavam, por exemplo, 50% conseguiram deixar o vício porque o namorado ou o marido também o fez. Ao mesmo tempo, entre aquelas que o parceiro não fumava, apenas 17% se livraram do tabagismo. A taxa é ainda mais baixa no grupo das que não contaram com o apoio e a vontade do parceiro fumante em deixar o cigarro: somente 8%. Nessa regra, os homens não são exceção. Quando eles são a parte do casal que propõe a medida, o envolvimento da companheira também facilita a empreitada.
Segundo Jane Wardle, diretora do Centro de Pesquisa em Saúde e Comportamento da Pesquisa em Câncer do Reino Unido e uma das autoras do artigo, estilos de vida não saudáveis são a principal causa de morte por doença crônica em todo o mundo, e os principais riscos estão relacionados ao tabagismo, ao excesso de peso, ao sedentarismo, à má alimentação e ao consumo de álcool. “Trocar maus hábitos por bons pode reduzir o risco de doença, incluindo câncer; e, quanto mais as pessoas puderem ajudar e encorajar umas às outras, melhor.”
Pacto de ano novo
Com a ideia de começar uma nova vida neste ano, Suzana e Paulo Fabrício de Andrade, ambos com 28 anos, comprometeram-se a abandonar alguns quilos. De início, era uma preocupação apenas dela. “Fui a um endocrinologista e ele falou com todas as letras: ‘Não adianta se enganar, um só ser saudável e o outro não, vai ser uma coisa difícil de fazer’. Logo dei um jeito de convencê-lo”, conta Suzana. Eles estão casados há um ano e dois meses e, desde o grande dia, os ponteiros na balança começaram a subir e a qualidade da alimentação, a cair. Com a adequação da dieta e as caminhadas diárias, Suzana abandonou 3kg e Paulo Fabrício, 5kg.
A ajuda dele na hora de topar as mudanças foi essencial. “Se tivesse que fazer sozinha, ia ficar desanimada. Acho até que ele é mais dedicado e, talvez, conseguisse só, mas eu não sei se teria tanta disciplina”, diz Suzana. Os hábitos saudáveis adotados por eles foram contagiantes o suficiente para influenciar familiares. “Todo mundo apoiou, achou legal. Minha mãe já começou a fazer algumas mudanças”, diz Suzana.
Mais fortes
No caso de Caroline e Henrique Bernardes, 31 e 32 anos, respectivamente, a união fez com que eles alcançassem um nível ainda mais intenso na prática de atividades físicas. Tanto o empresário quanto a assessora parlamentar já estavam acostumados a praticar exercícios, e a malhação foi contínua durante todo o período do namoro a distância. Quando se casaram, em maio do ano passado, Caroline se mudou do Rio de Janeiro para Brasília, e eles passaram a dividir o teto e o gosto por uma nova atividade: o crossfit. Henrique é firme ao dizer que “se dependesse dele, passaria todas as horas do dia se exercitando”. Caroline é menos pragmática, mas caiu de amores pela modalidade do momento.
“Sempre fiz academia, musculação. Mas, quando vim para cá, comecei a acompanhar o Henrique no crossfit e acabei gostando muito”, relata. A partir daí, a parceria para uma vida toda começou a ocupar quadras, gramados, aparelhos e boxes de treino. Sem se esforçar tanto, ela trocou 2kg de massa gorda por puro músculo. A alimentação também ficou mais funcional. Muitas das refeições feitas em casa buscam abastecer o organismo dos dois e recarregar as energias para mais um dia de malhação.
Julie Sharp, uma das cientistas da Pesquisa em Câncer do Reino Unido, ressalta que os benefícios de mudar os hábitos em conjunto não se limitam aos casais afetivos. Um amigo, o pai, a mãe ou irmão também podem formar uma parceria de sucesso. “Obter algum apoio pode ajudar as pessoas a adquirirem bons hábitos. Por exemplo, se você quer perder peso, ter um colega que está tentando fazer a mesma coisa poderia encorajar os dois a se unirem para uma corrida ou uma nadada na hora do almoço ou depois do trabalho”, exemplifica.
Os grupos funcionam
O apoio institucionalizado também pode ser o diferencial na busca por mudança de hábitos. Até porque, geralmente, nesses espaços há a oportunidade de compartilhar as dificuldades e as vitórias com pessoas em busca do mesmo objetivo. No Distrito Federal, um desses trabalhos é coordenado por Eliane de Fátima Duarte no Hospital Universitário de Brasília (HUB), onde fumantes e ex-fumantes se encontram para trocar experiências na luta contra o tabagismo.
“Situações de casais que tentam parar juntos ou tentam convencer o parceiro é cotidiana. Quando o parceiro não larga o cigarro, a pessoa que quer parar até consegue começar o programa, mas tem recidiva atrás de recidiva até desistir”, diz Duarte. No entanto, segundo a médica, se o parceiro apoia a decisão do outro e para junto, o processo costuma ser mais fácil e rápido. “Todo fumante considera o cigarro um amigo. Essa é a definição de um termo científico que é a dependência psicológica do cigarro, ele se torna uma bengala psicológica.” Se a parceria é de um companheiro real, é mais fácil substituir a dependência psíquica do cigarro.
A médica acredita que, quando os casais se juntam por um objetivo como parar de fumar, também acabam fazendo uma renovação do relacionamento, como se iniciassem uma nova vida juntos, o que dá um sentido simbólico extremamente importante. “Atendemos muitos casais — provavelmente são 10% dos participantes — e vemos exemplo atrás de exemplo. Às vezes, nem é preciso que a dupla vá para a terapia de grupo. Eles se alternam e trocam as experiências em casa”, conta.
A terapia e a reunião em grupo, segundo Duarte, é a parte mais importante do tratamento, que pode incluir ainda a ingestão de medicamentos, o uso de adesivos ou de chicletes de nicotina. A médica afirma que chega a representar 90% da terapia, sendo responsável principalmente por manter a abstinência e impedir as recaídas.
“Quando o parceiro não larga o cigarro, a pessoa que quer parar até consegue começar o programa, mas tem recidiva atrás de recidiva até desistir” - Eliane de Fátima Duarte, coordenadora do programa antitabagismo do Hospital Universitário de Brasília (HUB)
Doenças e divórcio
Se nos votos de casamento os casais prometem ficar juntos na doença e na saúde, é bom saber que o risco de divórcio entre os mais velhos aumenta, principalmente, quando a mulher fica gravemente doente. De acordo com o time da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, as casadas com diagnóstico de um problema de saúde grave têm mais chances de se encontrar lutando com o impacto da doença e, ao mesmo tempo, experimentando o estresse do divórcio. Liderados por Amelia Karraker, os estudiosos analisaram 20 anos de dados sobre 2.717 casais integrantes do Estudo de Saúde e Aposentadoria, realizado pelo Instituto de Pesquisa Social dos Estados Unidos desde 1992. Os pesquisadores examinaram como o aparecimento de quatro enfermidades — câncer, problemas cardíacos, doença pulmonar e acidente vascular cerebral — afetava as uniões e descobriram que, em geral, 31% delas terminaram em divórcio ao longo do período estudado, especialmente quando a pessoa que adoeceu era a mulher. Seguir uma dieta saudável, praticar atividades físicas e livrar-se de vícios como o alcoolismo e o tabagismo são atitudes aconselhadas como preventivas para as doenças consideradas no estudo.