Saúde

Hospital público de BH será referência para redução de cesarianas na rede privada do Brasil

Encontro que reuniu lideranças da Agência Nacional de Saúde (ANS), Institute for Healthcare Improvement (IHI) e Hospital Israelita Albert Einstein para conhecer processos, soluções e metodologias de trabalho do Hospital Sofia Feldman servirá na elaboração de ação propositiva para reduzir índices de cesariana em 25 maternidades privadas e três do SUS

Valéria Mendes

Sofia Feldman é hospital de excelência na área de parto humanizado. Na foto, a enfermeira-obstetra Adrinez Cançado auxilia parto de Tatiana Almerinda do Nascimento
Depois de o Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Saúde (ANS) anunciarem as medidas para redução de cesariana na rede privada, como o uso partograma - relatório médico detalhado sobre a evolução do trabalho de parto e vinculá-lo ao pagamento do profissional -, além da obrigatoriedade de as operadoras de saúde em informarem percentuais de cesáreas e partos normais de hospitais e médicos, muita gente tem se perguntado se, na prática, as novas regras darão conta de pôr fim à epidemia que coloca o Brasil como campeão mundial de cesarianas: na rede particular, 84% dos bebês nascem pelo procedimento cirúrgico e, para citar apenas uma das consequências graves, assistimos ao aumento do índice de prematuridade.


O caminho ou a ‘inspiração’ para mudar a forma como se nasce no país pode estar em um hospital público de Belo Horizonte, o Sofia Feldman, que, nas palavras do médico especialista em segurança do paciente e melhoria da qualidade em saúde e consultor da Unimed Brasil e Unimed Fesp, Paulo Borem “é um hospital de excelência na área de parto humanizado e, apesar dos poucos recursos que recebe, produz muitas inovações nessa área, é um modelo a ser seguido e reconhecido no mundo todo”.

Borem é também representante no Brasil do Institute for Healthcare Improvement (IHI), organização norte-americana sem fins lucrativos, com sede em Boston, que atua no mundo inteiro para promover a qualidade e a segurança do paciente nos sistemas de saúde de diversos países, e visitou o Sofia Feldman nesta terça-feira (27/01) junto com representantes da Agência Nacional de Saúde (ANS), do Hospital Israelita Albert Einstein e da Comissão Perinatal Secretaria Municipal de Saúde de BH.

O objetivo do encontro foi conhecer processos, soluções e metodologias de trabalho do hospital da capital mineira para elaborar uma ação propositiva de redução dos índices de cesariana em 25 maternidades privadas do Brasil e três do Sistema Único de Saúde (SUS). “Viemos atrás de estratégias que dão certo para aprender e adaptar", afirma a gerente executiva de aprimoramento entre prestadoras de serviços e operadoras da ANS, Jaqueline Torres. O Sofia Feldman tem uma das menores taxas de cesariana do país: 24,7%.

Segundo ela, a reunião faz parte de um acordo de cooperação assinado pelo ANS e o IHI para desenvolver um trabalho piloto no Hospital Israelita Albert Einstein e aprender o que funciona e o que não funciona nas estratégias para redução dos índices de cesariana dentro da perspectiva de pensar o sistema de saúde de forma unificada, sem a divisão de público e privado, para uma melhor assistência à mulher e ao bebê.
Quarto PPP (pré-parto, parto e pós-parto) do Sofia Feldman, hospital-referência na assistência humanizada ao parto

A ANS está finalizando os critérios de seleção das maternidades que quiserem participar voluntariamente do projeto. “Em fevereiro vamos apresentar ao público a metodologia proposta pelo IHI e o que o hospital precisa para participar”, explica. Caso a procura seja maior que o número de vagas disponíveis, a ideia inicial é que "cada capital do Sul e Sudeste tenha uma vaga, algumas capitais do Norte, Nordeste e Centro Oeste, cidades do interior e também queremos mesclar hospitais que são 100% privados com os que adotam o modelo misto e atendem também pelo SUS", explica Jacqueline Torres.

Entenda a metodologia do IHI
Chamada ‘ciência da melhoria’, a metodologia do IHI será utilizada no Brasil para reduzir o percentual de cesáreas e melhorar a qualidade de assistência ao parto. Como consultor da Unimed no Brasil, Paulo Borem já desenvolveu, junto à operadora de saúde em parceria com o IHI, um projeto que conseguiu, por exemplo, reduzir de 99,3% para 50%, entre 2012 e 2013, o índice de cesarianas na Unimed de Jaboticabal, em São Paulo. Unidades da Unimed de Itapetininga (SP), Americana (SP) e Belo Horizonte (MG) também integram o programa, mas o dados, segundo o especialista do IHI, ainda não estão consolidados em razão da fase do projeto em cada unidade está. Mas uma excelente notícia não pode passar em branco: em todas essas maternidades que aplicaram a metodologia aconteceu a redução de 60% no número de internações em UTI neonatal. “Comprovamos que o excesso de cesarianas estava provocando iatrogenia”, pontua Borem. Prematuridade iatrogênica é quando o bebê não está pronto para nascer.

Entre as medidas adotadas, as principais foram: proibição da marcação de cesariana antes de 39 semanas e sem entrar em trabalho de parto, os médicos passaram a ser remunerados por plantão e não, por parto, e a enfermeira obstétrica passou a integrar a equipe de profissionais que acompanham a gestante. “O papel da enfermeira obstétrica é importantíssimo porque tira o foco da questão do nascer do médico e passa a ser da equipe. Se eu pudesse resumir as estratégias, citaria três grandes pilares: educar a comunidade, pacientes e profissionais para o novo modelo de assistência ao parto; redesenhar o processo de cuidado da gestante, ou seja, o médico que faz o pré-natal não é o mesmo que fará o parto e, por fim, a mudança de modelo de remuneração - ao invés de por evento, por plantão”, explica o representa do IHI no Brasil.

É importante ressaltar que as medidas propostas pelo IHI para as unidades da Unimed não serão necessariamente replicadas às maternidades que integrarão o projeto da ANS. Paulo Borem ressalta que os hospitais que participarão do projeto terão algumas metas individuais de promoção de melhorias contínuas e uma meta coletiva.

Hospital Sofia Feldman tem uma das menores taxas de cesariana do país: 24,7%