Saúde

Riscos e prevenção na morte súbita de bebês

Colocar a criança para dormir de barriga para cima é a medida mais eficaz para reduzir os casos em mais de 70%. Síndrome não tem causa definida e consenso médico é de que seja resultado de uma combinação de fatores

Bruno Freitas


A chegada de uma criança é sinônimo de festa no seio familiar. Entretanto, quando mimos e exageros se sobrepõem ao cuidado do qual o recém-nascido necessita, há risco em potencial. Nesse contexto, a morte súbita de bebês é uma grave preocupação. Ainda desconhecida por boa parte dos pais brasileiros, a chamada Síndrome da Morte Súbita de Lactentes – a Sudden Infant Death Syndrome (SIDS, em inglês) – exige constante atenção e tem no simples ato de colocar o bebê para dormir de barriga para cima um forte fator de prevenção, podendo reduzir as ocorrências em mais de 70%, segundo o Centro de Pesquisas Epidemiológicas da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no Rio Grande do Sul.


Na maioria dos casos, a síndrome ocorre entre a meia-noite e as 6h, período de sono da criança. O pico de incidência é entre dois e quatro meses de vida. Como não há uma causa definida – apesar de antiga, o consenso médico é de que a origem seja um triplo fator de risco (veja entrevista) – o diagnóstico é quase sempre complexo e inconclusivo. O mito popular de que o bebê pode aspirar vômito e se sufocar quando colocado para cima é uma das principais crenças errôneas em relação à síndrome. Numa situação dessas, o instinto natural da criança é tossir e chamar a atenção dos pais.

A posição mais usual no Brasil, porém, continua sendo a de lado, postura igualmente arriscada se comparada à de barriga para baixo: como é instável, pode levar muitos bebês a rolar, levando à morte. “Uma criança maior ou um adulto acordariam ou trocariam de posição para evitar o sufocamento, mas, em alguns bebês, a parte do cérebro que controla este reflexo não está desenvolvida. Por isso, ele acaba morrendo por asfixia”, explica o doutor em epidemiologia e autor de pesquisa de Pelotas, Cesar Victora.

Estudo recente realizado nos Estados Unidos alerta para o fato de mais da metade dos bebês do país (55%) serem postos para dormir com almofadas, cobertores ou brinquedos, elevando as chances de óbito. A lista de itens nocivos ainda inclui pelúcias e roupas de cama soltas, que podem obstruir as vias respiratórias, levando à asfixia. “Os pais têm boas intenções, mas pode ser que não entendam que mantas, edredons e almofadas aumentam o risco do SIDS e de provocar uma asfixia acidental”, argumenta a autora principal do estudo, Carrie K. Shapiro-Mendoza, dos Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA.

Em países desenvolvidos, a doença é a causa mais comum de mortalidade de lactentes: varia de um a três bebês nos EUA e três a sete na Austrália (a cada mil), diminuindo consideravelmente nas regiões onde foram realizadas campanhas sobre os fatores de risco. O Brasil não tem estatísticas oficiais sobre incidência de síndrome da morte súbita em crianças. As maiores referências são justamente os estudos realizados no Rio Grande do Sul, onde foram observadas taxas que variavam de 1,75 óbitos a cada mil recém-nascidos a 4,5 mortes para 10 mil.

Desde que uma campanha encabeçada pela Pastoral da Criança foi lançada em junho de 2009 foram alcançados esclarecimentos satisfatórios. A iniciativa, comandada pela médica e fundadora da entidade, Zilda Arns, já falecida, reforça aos pais a necessidade de colocar o bebê para dormir de barriga para cima. À época do lançamento, apenas 21% dos bebês menores de 3 meses eram colocados para dormir dessa forma, de acordo com o Comitê de Mortalidade Infantil de Pelotas.

DIFICULDADE NO LAUDO
“As evidências científicas apontam que o decúbito dorsal (barriga para cima) é mais seguro e está relacionado à menor ocorrência de morte súbita. Muitas mortes são dadas como indeterminadas. Em Belo Horizonte, tem-se o agravante de não haver o serviço de identificação de óbito, sem a possibilidade de necropsia voltada a casos clínicos”, aponta a pediatra e membro do Comitê de Segurança Infantil da Sociedade Mineira de Pediatria (SMP), Marisleine Lumena.

A especialista alerta que chegar à conclusão de morte inesperada não é fácil. “Seria preciso ter a necropsia. Sabemos que é uma causa preocupante.” Além da posição de sono, outro fator é a escolha dos móveis do bebê. Nem todos os modelos à venda no mercado oferecem a segurança necessária. É essencial que os pais levem em consideração não somente a aparência de um berço, por exemplo, como também aspectos de qualidade e certificação.



José Hugo de Lins Pessoa, membro do Núcleo Permanente de Estudos sobre o Sono da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)

Quais as principais causas da morte súbita de bebês?
Trata-se de um distúrbio mutifatorial e complexo, que não tem ainda uma causa definida, embora se tenha estudado muito. Admite-se que há um modelo de triplo risco, com vulnerabilidade do controle cardiorrespiratório, período crítico do desenvolvimento (entre dois a três meses de vida) e fatores externos (posição prona ao dormir, tabagismo materno, cobertas encobrindo cabeça), que resultam em uma alteração no mecanismo de despertar. É a teoria mais aceita hoje.

Como a doença pode ser tratada?
A prevenção é muito importante. A principal é colocar a criança para dormir de barriga para cima. Há outras recomendações, como evitar o tabagismo durante a gestação e a exposição da criança ao cigarro depois que ela nasce. Em casa com bebê pequeno, ninguém deve fumar. Também se recomenda que a criança durma no quarto dos pais, mas não na cama deles, o que poderia aumentar o risco de superaquecimento da criança pelo calor proveniente dos pais e até dos cobertores. Bebês pequenos não devem dormir em quartos com temperatura acima de 28 graus. Recomenda-se também a amamentação materna, um fator protetor.

Os pais brasileiros, no geral, sabem do risco?
Sim. O assunto tem sido divulgado. Paulatinamente, há um conhecimento e aceitação maior, mas ainda não está generalizado. O grande problema é o desconhecimento sobre o risco que a criança corre ao dormir de barriga para baixo e de lado (posição mais usada no Brasil). As pessoas acham que as crianças que dormem com a barriga para cima podem vomitar e engasgar, o que não é verdade, porque é muito seguro. Estudos médicos comprovam isso.