A informação genética pode não favorecer o envelhecimento masculino, e alguns fatores fisiológicos, especialmente os hormonais, garantem maior número de anos a elas. Ainda assim, os especialistas asseguram que esses não são os principais motivos para a maior expectativa de vida entre as mulheres. Os hábitos ainda são o grande certificado de longevidade para o público feminino. Os homens bebem e fumam mais, estão sujeitos a maior carga de estresse e, de longe, são as maiores vítimas de morte violenta, como os homicídios.
Apesar dessa vantagem social, já é tempo de as mulheres ficarem mais atentas. As exigências contemporâneas e a equiparação comportamental entre os sexos começam a refletir na aproximação da quantidade dos anos vividos, alertam estudiosos. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a expectativa de vida da população brasileira é de 74,9 anos. Se os dados forem divididos por sexo, no entanto, os homens estão abaixo desse patamar e as mulheres, muito acima. Para eles, a esperança ao nascer é de 71,3 anos; para elas, 78,6.
Em unidades da Federação como Santa Catarina, Espírito Santo, São Paulo, Rio Grande do Sul e no Distrito Federal, as taxas de expectativa feminina ultrapassam os 80 anos. Ao mesmo tempo, principalmente nas localizadas no Norte e no Nordeste, a esperança de vida entre os homens não chega aos 70 anos. Esses também tendem a ser os estados com altos índices de violência urbana, que incidem diretamente sobre a população masculina. Oito dos 14 estados com expectativa masculina abaixo dos 70 anos também estão acima da média nacional no quesito homicídio juvenil: Amazonas, Pará, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia.
Divulgados neste ano, os dados do Mapa da Violência no Brasil contabilizam 54,3 homicídios masculinos a cada 100 mil pessoas; contra 4,8 mulheres para a mesma população. Entre os jovens de 15 a 29 anos, o problema se agrava. São 107,5 jovens do sexo masculino assassinados contra 7,7 meninas. “As mulheres conhecidamente bebem menos, fumam menos e trabalham em casa. Tudo isso funciona e é percebido como uma forma de proteção de fatores como a violência, os acidentes de trânsito e até ao desenvolvimento de doenças”, diz Clineu de Mello Almada Filho, professor do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Marco Aurélio Albernaz, membro da Comissão de Climatério da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), especula se o fenômeno se repetirá na próximas gerações. Segundo ele, tanto os homens quanto as mulheres têm se preocupado mais com a prevenção a doenças, mas elas começam a perder no tempo de vida ao se exporem com mais frequência a fatores de risco. “Ainda não ao ponto de percebemos a diferença na longevidade, mas creio que, com o passar dos anos, vai ser mais evidente. As mulheres que morrem hoje viveram em outro sistema. A pergunta é se as jovens de agora também serão longevas”, analisa.
Epigenética
O problema não é apenas uma questão de exposição aos riscos. Entre as hipóteses para a maior longevidade feminina, está a teoria epigenética. Trata-se da influência de modificações no genoma que não alteram a sequência do DNA. São pequenas mudanças químicas, causadas principalmente pelo meio ambiente, que “ligam” ou “desligam” a expressão de genes. “Não tem a ver com o genoma em si nem com os genes que herdamos e favorecem ou não o envelhecimento saudável. As marcas epigenéticas derivam dos nossos hábitos e batem com a ideia de que a longevidade e o estilo de vida estão relacionados”, diz Carmen Saavedra, professora do Departamento de Genética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Mais que ter os genes — as receitas recebidas pelos pais para produção de proteínas —, o que importa para ter uma vida longa, segundo a doutora em genética do envelhecimento, é como eles são usados. Substâncias agressivas ao organismo deixam marcas no DNA. À medida que entramos em contato com elas, começamos a silenciar alguns genes ou a ativar outros, isto é, a produzir receitas e deixar de fazer algumas. Esse padrão de silenciamento ou de ativação permanece no genoma e pode até ser transmitido por gerações. Não se trata de uma transmissão de mutação genética, mas de marcadores que tornam mais fácil aos descendentes ativarem ou desativarem genes.
“O estilo de vida influencia na forma como a pessoa ‘roda o programa genético’. Ao longo do envelhecimento, de maneira geral, existe uma diminuição da ativação dos genes”, ressalta Saavedra. Ela conta que estudos com centenários mostram que eles têm um padrão específico de quais regiões do genoma estão mais silenciadas e quais mais ativas. Esse desenho é diferente do de um adulto e de pessoas que morrem muito cedo. “Isso quer dizer que eles (idosos com mais de 100 anos) são mais felizes na maneira que formataram o genoma ao longo do tempo. Até podem ter variantes mais vantajosos dos genes, mas, se não ativar, não vai adiantar nada.”
Ao comparar essas alterações em homens e mulheres também aparecerão diferenças, até porque os genes ativados não são iguais. “O ambiente sempre está nos desafiando, sempre temos que fazer frente aos desafios ambientais. A resposta que você acionou vai ficar marcada e mais facilmente vai ser ativada quando for preciso”, ensina Saavedra.
Ao longo das mudanças sociais sofridas pela civilização, porém, os papéis da mulher e do homem também estão mudando. “Elas estão se masculinizando, passando a ter padrões de ativação ou inativação de genes semelhantes aos dos homens e diminuindo a diferença na longevidade. Talvez comecem a aparecer algumas desvantagens”, analisa a especialista. A desvalorização da obrigatoriedade da maternidade é uma das mudanças recentes citadas por Saavedra que podem impactar na expectativa de vida feminina.
A força da prevenção
De acordo com boletim da Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgado neste mês, medidas adotadas em países desenvolvidos para reduzir as doenças não transmissíveis — as principais causas de morte no mundo — têm melhorado a expectativa de vida de mulheres com 50 anos ou mais nos últimos 20 a 30 anos. O estudo constatou que as principais causas de óbito de mulheres nessa faixa etária em todo o mundo são doenças cardiovasculares e cânceres, mas em países em desenvolvimento a morte ocorre mais cedo. Os resultados sugerem que a prevenção, a detecção e o tratamento dessas enfermidades são atualmente insuficientes em muitos países.
Apesar dessa vantagem social, já é tempo de as mulheres ficarem mais atentas. As exigências contemporâneas e a equiparação comportamental entre os sexos começam a refletir na aproximação da quantidade dos anos vividos, alertam estudiosos. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a expectativa de vida da população brasileira é de 74,9 anos. Se os dados forem divididos por sexo, no entanto, os homens estão abaixo desse patamar e as mulheres, muito acima. Para eles, a esperança ao nascer é de 71,3 anos; para elas, 78,6.
Em unidades da Federação como Santa Catarina, Espírito Santo, São Paulo, Rio Grande do Sul e no Distrito Federal, as taxas de expectativa feminina ultrapassam os 80 anos. Ao mesmo tempo, principalmente nas localizadas no Norte e no Nordeste, a esperança de vida entre os homens não chega aos 70 anos. Esses também tendem a ser os estados com altos índices de violência urbana, que incidem diretamente sobre a população masculina. Oito dos 14 estados com expectativa masculina abaixo dos 70 anos também estão acima da média nacional no quesito homicídio juvenil: Amazonas, Pará, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia.
Divulgados neste ano, os dados do Mapa da Violência no Brasil contabilizam 54,3 homicídios masculinos a cada 100 mil pessoas; contra 4,8 mulheres para a mesma população. Entre os jovens de 15 a 29 anos, o problema se agrava. São 107,5 jovens do sexo masculino assassinados contra 7,7 meninas. “As mulheres conhecidamente bebem menos, fumam menos e trabalham em casa. Tudo isso funciona e é percebido como uma forma de proteção de fatores como a violência, os acidentes de trânsito e até ao desenvolvimento de doenças”, diz Clineu de Mello Almada Filho, professor do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Marco Aurélio Albernaz, membro da Comissão de Climatério da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), especula se o fenômeno se repetirá na próximas gerações. Segundo ele, tanto os homens quanto as mulheres têm se preocupado mais com a prevenção a doenças, mas elas começam a perder no tempo de vida ao se exporem com mais frequência a fatores de risco. “Ainda não ao ponto de percebemos a diferença na longevidade, mas creio que, com o passar dos anos, vai ser mais evidente. As mulheres que morrem hoje viveram em outro sistema. A pergunta é se as jovens de agora também serão longevas”, analisa.
Epigenética
O problema não é apenas uma questão de exposição aos riscos. Entre as hipóteses para a maior longevidade feminina, está a teoria epigenética. Trata-se da influência de modificações no genoma que não alteram a sequência do DNA. São pequenas mudanças químicas, causadas principalmente pelo meio ambiente, que “ligam” ou “desligam” a expressão de genes. “Não tem a ver com o genoma em si nem com os genes que herdamos e favorecem ou não o envelhecimento saudável. As marcas epigenéticas derivam dos nossos hábitos e batem com a ideia de que a longevidade e o estilo de vida estão relacionados”, diz Carmen Saavedra, professora do Departamento de Genética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Mais que ter os genes — as receitas recebidas pelos pais para produção de proteínas —, o que importa para ter uma vida longa, segundo a doutora em genética do envelhecimento, é como eles são usados. Substâncias agressivas ao organismo deixam marcas no DNA. À medida que entramos em contato com elas, começamos a silenciar alguns genes ou a ativar outros, isto é, a produzir receitas e deixar de fazer algumas. Esse padrão de silenciamento ou de ativação permanece no genoma e pode até ser transmitido por gerações. Não se trata de uma transmissão de mutação genética, mas de marcadores que tornam mais fácil aos descendentes ativarem ou desativarem genes.
“O estilo de vida influencia na forma como a pessoa ‘roda o programa genético’. Ao longo do envelhecimento, de maneira geral, existe uma diminuição da ativação dos genes”, ressalta Saavedra. Ela conta que estudos com centenários mostram que eles têm um padrão específico de quais regiões do genoma estão mais silenciadas e quais mais ativas. Esse desenho é diferente do de um adulto e de pessoas que morrem muito cedo. “Isso quer dizer que eles (idosos com mais de 100 anos) são mais felizes na maneira que formataram o genoma ao longo do tempo. Até podem ter variantes mais vantajosos dos genes, mas, se não ativar, não vai adiantar nada.”
Ao comparar essas alterações em homens e mulheres também aparecerão diferenças, até porque os genes ativados não são iguais. “O ambiente sempre está nos desafiando, sempre temos que fazer frente aos desafios ambientais. A resposta que você acionou vai ficar marcada e mais facilmente vai ser ativada quando for preciso”, ensina Saavedra.
Ao longo das mudanças sociais sofridas pela civilização, porém, os papéis da mulher e do homem também estão mudando. “Elas estão se masculinizando, passando a ter padrões de ativação ou inativação de genes semelhantes aos dos homens e diminuindo a diferença na longevidade. Talvez comecem a aparecer algumas desvantagens”, analisa a especialista. A desvalorização da obrigatoriedade da maternidade é uma das mudanças recentes citadas por Saavedra que podem impactar na expectativa de vida feminina.
A força da prevenção
De acordo com boletim da Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgado neste mês, medidas adotadas em países desenvolvidos para reduzir as doenças não transmissíveis — as principais causas de morte no mundo — têm melhorado a expectativa de vida de mulheres com 50 anos ou mais nos últimos 20 a 30 anos. O estudo constatou que as principais causas de óbito de mulheres nessa faixa etária em todo o mundo são doenças cardiovasculares e cânceres, mas em países em desenvolvimento a morte ocorre mais cedo. Os resultados sugerem que a prevenção, a detecção e o tratamento dessas enfermidades são atualmente insuficientes em muitos países.