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Segundo Elisabeth Neumann, professora do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a microbiota em equilíbrio é capaz de inibir ou reduzir a entrada de patógenos, por competição por nutrientes ou pelos sítios de ligação desses patógenos às células do hospedeiro. Podem, ainda, produzir substâncias antimicrobianas que eliminam o patógeno. Também já foi demonstrado que certos micro-organismos são capazes de produzir vitaminas ou melhorar os sintomas da intolerância à lactose. “Além disso, essa microbiota, em contato direto e constante com as células do sistema imune, faz com que esse sistema esteja sempre 'alerta' e possa desenvolver uma resposta mais rápida quando ocorrer alguma invasão por um micro-organismo patogênico”, explica.
Há, por exemplo, trabalhos científicos que demonstram o efeito hipocolesterolêmico (capacidade de abaixar o colesterol sanguíneo) de algumas linhagens de probióticos. De forma indireta, então, o consumo dessas linhagens microbianas contribui para a melhoria dos quadros de hipertensão. No entanto, nem todos os probióticos têm essa capacidade. Há também no mercado formulações contendo probióticos com a promessa de reduzir o peso. “De fato, na literatura científica há vários estudos que demonstram haver diferença entre os micro-organismos presentes no ambiente intestinal de pessoas com tendência à obesidade e indivíduos magros. No entanto, esses estudos estão ainda em fase inicial e não são suficientes para justificar o uso de formulações contendo probióticos para o emagrecimento”, alerta Neumann.
Apesar de dividir opiniões entre os infectologistas, também há casos de uso de probióticos em pacientes com Aids. Mas, para a especialista, considerando o estado de imunossupressão ao qual os pacientes HIV positivo estão submetidos, o consumo de micro-organismos vivos em grande quantidade precisa ser avaliado com cautela, mediante acompanhamento médico. A melhoria da resposta imune pode contribuir, ainda, para a inibição do crescimento de alguns tipos de tumores. “Por um lado, o consumo de probióticos poderia ajudar o paciente. Porém, assim como para pacientes HIV positivo, o consumo de probióticos por pacientes com câncer precisa de orientação e acompanhamento médico”, alerta Neumann.
DISBIOSE
O uso mais disseminado dos probióticos ainda é nos casos de disbiose. Se o intestino apresenta desequilíbrio entre as bactérias “do bem” e bactérias nocivas, ele não consegue desempenhar suas funções de forma adequada, repercutindo no sistema imunológico e favorecendo o surgimento de doenças virais, bacterianas e por fungos, como os incômodos corrimentos por monília ou candidíase. Segundo o pediatra Tadeu Fernandes, presidente do Departamento de Pediatria Ambulatorial da Sociedade Brasileira de Pediatria, a carência de probióticos também favorece as doenças alérgicas, principalmente a dermatite conhecida como atópica. Para isso, existem as cápsulas e sachês com uma dose considerável de probióticos.
Segundo o especialista, esses micro-organismos atuam no trato gastrointestinal inferior, um ambiente de alta capacidade imunológica que compreende a região do intestino delgado, intestino grosso, reto e ânus. “Elas atuam como agentes reguladores da função intestinal, combatendo quadros de constipação e diarreia, assim como sintomas associados a esses quadros, como gases, náuseas e dor abdominal. As bactérias que habitam o corpo humano localizam-se predominantemente no trato gastrointestinal, por isso a importância de manter o equilíbrio entre as bactérias boas e ruins nessa região. Quando as bactérias ruins passam a existir em maior número do que as boas, instala-se um estado de desequilíbrio que recebe o nome de disbiose”, esclarece.
Estudos sobre a disbiose e seu tratamento preventivo com probióticos têm apresentado grandes avanços nos últimos anos. “Dieta inadequada, ingestão de álcool, uso de antibióticos, entre outros fatores relacionados ao estilo de vida moderno, contribuem para o desenvolvimento do problema, que se manifesta na forma de constipação, diarreia, distensão e dores abdominais, alguns tipos de alergias e certas alterações metabólicas como diabetes e dislipidemia. Quando consumidos com regularidade e em doses adequadas, os probióticos resgatam e mantêm o equilíbrio da microbiota intestinal, o que reflete na saúde do organismo como um todo, interferindo em nossa qualidade de vida e bem-estar”, afirma.
Já o gastroenterologista e pediatra Luciano Amedée Filho, professor associado do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG e membro do setor de gastroenterologia, defende o uso dos probióticos apenas no caso de um transtorno na microbiota intestinal, a disbiose, portanto. “As condições para o consumo de probióticos por meio de sachês e cápsulas é quando se tem uma infecção intestinal, com diarreia aguda; uma diarreia associada ao uso de antibióticos; ou uma diarreia do viajante, quando se vai para uma localidade onde a alimentação é muito diferente. É nessas situações que os estudos indicam alguma ação”, defende.
Segundo Elisabeth Neumann, sempre que passarmos por situações que provoquem o desequilíbrio da nossa microbiota normal, como no uso de antibióticos, o consumo de probióticos pode contribuir para o restabelecimento do equilíbrio. “É como se preenchêssemos temporariamente um local do intestino que ficou vazio, porque o antibiótico eliminou um microrganismo que vive ali normalmente, com um outro, benéfico, que vai impedir que o espaço seja utilizado por um patógeno. As consequências boas são óbvias, porém, em pacientes imunocomprometidos o consumo de probióticos sem orientação médica pode ser uma faca de dois gumes”, alerta.
A Anvisa determina que sejam consumidas de 100 milhões a 1 bilhão de células viáveis do probiótico em uma dose diária recomendada para o produto. A formulação ideal para o consumo é aquela que mantém a viabilidade das células e o número mínimo exigido para que as funções benéficas sejam alcançadas durante todo o prazo de validade do produto. É possível conseguir isso tanto em formulações alimentares (leites fermentados, queijos) como em sachês ou cápsulas, que, para Luciano, são a melhor maneira, por se manterem conservados e terem a dose mínima necessária para efeito probiótico. “Não é qualquer dose que vai fazer efeito. São necessários, no mínimo, 100 milhões de micro-organismos”, explica.
Para o médico, os sachês e cápsulas devem ser usados por três dias no caso de disbiose. Podem, ainda, ser adotados preventivamente no caso de pessoas que vão viajar ou tomar antibiótico. Para tratar a disbiose, os probióticos presentes nos produtos lácteos fermentados seriam limitados. “Não se sabe como é a conservação desses alimentos porque às vezes ficam em câmaras frigoríficas com temperaturas variadas. E não se sabe ao certo que quantidade vai ser ingerida. Teria que usar todo dia para ter efeito”, explica o médico, que vê com bons olhos o consumo diários de leites fermentados, principalmente por indivíduos com intolerância à lactose.
MICROBIOTA
O termo “flora intestinal”, apesar de largamente usado, não é o mais apropriado para denominar o conjunto de micro-organismos que habita o ambiente intestinal humano e de outros animais. O termo adequado é microbiota intestinal. O corpo humano é formado por aproximadamente 10 trilhões de células e 100 trilhões de bactérias. Aproximadamente 70% das bactérias que habitam nosso corpo concentram-se no intestino, formando a microbiota.
PREBIÓTICOS E SIMBIÓTICOS
Além dos probióticos, há no mercado sachês de prebióticos – fibras alimentares especiais que estimulam de forma seletiva o crescimento dos probióticos no intestino – e simbióticos, que associam probióticos com prebióticos em sua composição. Segundo Elisabeth Neumann, os prebióticos, ao chegarem ao ambiente intestinal, são digeridos por micro-organismos da microbiota normal. São benéficos e, por isso, seu consumo tem sido estimulado. A ideia de se juntar prebióticos e probióticos numa mesma formulação se justifica: “Posso, com um mesmo produto, administrar um micro-organismo benéfico e uma substância que o mesmo ou outro micro-organismo já presente no intestino seja capaz de utilizar. O efeito benéfico seria, portanto, potencializado”, defende.