“Vários trabalhos na literatura já demonstraram que obesidade na vida adulta aumenta as chances de o indivíduo ter Alzheimer quando idoso. Além disso, obesos têm pior performance cognitiva em qualquer idade”, explica Cintia Cercato, endocrinologista da USP e autora principal do estudo que foi publicado no Journal of Clinical Endocrinology & Metabolism.
Segundo Cercato, o efeito da cirurgia nesse processo é pouco estudo. “Existiam trabalhos que indicavam a melhora de memória após o procedimento cirúrgico, mas nenhum havia avaliado o metabolismo cerebral depois da perda de peso”, destaca. Por meio de exame de neuroimagem, foi avaliada a função cerebral de mulheres severamente obesas e com peso normal. Eles foram submetidas a tomografia e a análise de escâner antes da redução do estômago e seis meses depois.
Ao medir a função neural antes da cirurgia, os pesquisadores notaram que as participantes obesas tinham taxas maiores de metabolismo em determinadas áreas do cérebro, como a parte do giro cíngulado posterior — ligada a memórias e ao surgimento do Alzheimer. Após a perda de peso, não houve mais evidência dessa atividade cerebral exacerbada. “Elas estavam iguais às magras do ponto de vista cognitivo”, explica Cercato.
Membro da Academia Brasileira de Neurologia, Marcelo Kawano explica que, ao diminuir o peso, há redução da glicose, melhora da mobilidade e da atividade física. “Isso reflete na autoestima e também na interação social. Todos esses fatores indiretos ajudam na atividade neural.” Kawano destaca que essa melhora pode influenciar na prevenção ao surgimento de doenças neurais. “E isso pode, sim, evitar problemas mais graves, como o Alzheimer. Sabemos há algum tempo também que fatores de riscos cardiovasculares, como o aumento de pressão e o diabetes, aumentam a incidência dessa doença. Por isso, pessoas com obesidade mórbida têm mais chances de ter essa doença.”
Para Sérgio Cunha, endocrinologista do Laboratório Exame, mais estudos voltados para as doenças neurológicas podem contribuir para a melhora nas terapias. “Quanto antes tratarmos problemas como o Alzheimer, podemos aumentar as chances de eficácia de tratamento.” Segundo Cercato, a pesquisa será aprofundada. “A ideia é ampliar o estudo utilizando novas técnicas em neuroimagem, como o uso de marcadores de viabilidade neuronal, além de avaliar maior número de indivíduos e se a perda menor de peso, como a atingida por tratamento clínico, também melhora a atividade cerebral.”