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Publicado na revista Cell Reports, o estudo afirma que, além de muitas vezes ocorrerem em conjunto, o autismo e a deficiência intelectual podem compartilhar causas genéticas. De acordo com Chiara Manzini, líder do estudo, uma mutação no gene CC2D1A está ligada às duas complicações. “São problemas heterogêneos, ou seja, causados por genes distintos. Então, tivemos que focar em grandes famílias com muitas crianças afetadas de modo que uma análise genética pudesse ser realizada de forma independente”, detalha.
Manzini conta que escolheu trabalhar com famílias de países do Oriente Médio. “Pais com cerca de oito a 10 filhos são comuns nesses lugares”, justifica. Três famílias da Arábia Saudita e uma do Paquistão, todas com mutações no CC2D1A, foram selecionadas para a análise dos genomas. “Enquanto as crianças afetadas apresentavam níveis de leve a grave de deficiência intelectual, alguns irmãos também tinham autismo ou convulsões, mostrando que a mesma mutação pode causar diferentes manifestações”, observa a pesquisadora.
Segundo Carlos Aucélio, professor de neuropediatria da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB), a deficiência intelectual pode surgir como consequência do mau funcionamento do cérebro autista. “O autismo pode apresentar uma heterogenidade de sintomas, e cada sintoma é definido por um ou vários genes. Assim, a manifestação clínica dele vai depender de quais genes alterados o paciente herdou”, explica
Se recebida de ambos os pais, a falta de expressão do CC2D1A pode causar deficiência intelectual de leve a grave, autismo e convulsões. “Verificamos que, quando a alteração genética ocorre em ambos os cromossomos, o que chamamos de mutação recessiva, ela provoca uma redução da capacidade cognitiva, acompanhada, às vezes, pelo autismo e por convulsões”, explica Manzini.
Conexões reduzidas
A mutação no CC2D1A leva, segundo Aucélio, à redução das conexões entre os neurônios que fazem parte da área cognitiva do cérebro, responsáveis, por exemplo, pela capacidade de aprendizagem e pela inteligência. “Os pacientes autistas que apresentam mutação nesse gene podem evoluir com retardo mental. Em resumo, o problema no CC2D1A vai causar a deficiência mental nos pacientes com autismo”, explica o neuropediatra não integrante do estudo.
Em experimentos com camundongos, os cientistas das instituições norte-americanas constataram que a mutação no CC2D1A reduz o tamanho e a complexidade dos diferentes tipos de neurônios e interrompe a sinalização intracelular. Ao usar drogas para modular a função da sinalização, conseguiram restaurar, nas cobaias, a morfologia neuronal. O resultado, avaliam, abre portas para o desenvolvimento de uma droga que trate o autismo em humanos.
Jaime Vaz Brasil, psiquiatra do Instituto Fernando Pessoa, acredita que a pesquisa apresenta uma possibilidade real de tratamento, mas pondera que a intervenção não será adotada em pouco tempo. “Ainda não se sabe o potencial da descoberta em termos de criar um tratamento efetivo a curto prazo, pois os estudos para essa etapa ainda dependem de outras descobertas.” A opinião é compartilhada por Aucélio. “As pesquisas na área de genética têm sido um grande avanço em patologias como o autismo, porque nos permitem conhecer melhor as características de cada doença.”