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Kazu Kobayakawa e a equipe liderada por ele perceberam, em camundongos hiperglicêmicos, que as células imunes chamadas microglias se tornaram superativadas após o trauma na medula. Isso resultou na exacerbação da resposta inflamatória e em resultados patológicos e funcionais pobres. A microglia está envolvida na regeneração dos neurônios e, consequente, na recuperação de lesões. Quando a glicose estava mais alta nas cobaias, essas células hiperestimuladas trouxeram um efeito ruim para a regeneração.
Ao mesmo tempo, ao tratar esses animais com a insulina, a manipulação de concentrações de glicose no sangue resgatou os resultados funcionais, deixando de comprometer a recuperação. Um segundo estudo retrospectivo a partir da análise de dados clínicos de 528 pacientes com lesão medular revelou correlação entre os níveis de glicose no sangue e a melhora na atividade motora. O fenômeno foi percebido até mesmo em pacientes diabéticos — problema metabólico caracterizado pela hiperglicemia. “Os nossos resultados sugerem que a presença de hiperglicemia pode ser um prognóstico ruim para a lesão medular humana aguda e indicam que o controle glicêmico rígido pode melhorar os resultados”, conclui Kobayakawa.
Segundo o endocrinologista do Hospital Sírio-Libanês Antonio Roberto Chacra, a hiperglicemia é prejudicial em todas as circunstâncias. Alguns hospitais, inclusive, trabalham com o protocolo de hiperglicemia hospitalar. Nele, o nível glicêmico de pacientes precisa ser monitorado constantemente e controlado rigorosamente com o uso de insulina caso ultrapasse o índice normal. “Agora, vemos também a necessidade em pacientes com lesão na medula, mas, naqueles em Unidade de Tratamento Intensivo, com doenças coronarianas e em estado crítico, isso já é feito em alguns hospitais”, observa. Chacra ressalta que clinicamente é fácil observar o avanço da melhora quando há esse controle.
Relação inédita
Para o endocrinologista, o mais interessante de observar esses resultados em pacientes com a medula lesionada é a possibilidade de surgimento de um fator que pode estimular a recuperação de vítimas de danos neurológicos que podem levar à paralisia dos membros. “A medula faz parte do sistema nervoso, dela saem todos os nervos que permitem os movimentos das pernas, dos braços e de tudo mais. É muito bom pensar que, ao manipular melhor a quantidade de glicose no sangue, o resultado das sequelas são menores ou, pelo menos, não tão ruins se não fossem tratadas.”
Chacra explica que o manejo correto dos níveis de açúcar no sangue podem diminuir o potencial inflamatório do paciente e a infecção e a morte dentro do hospital. “Ainda não sabemos qual é o princípio molecular de tudo isso, mas imaginamos que, diante da gravidade de uma lesão de medula para os indivíduos que ficaram paraplégicos ou tetraplégicos, qualquer melhora, mesmo pequena, sempre vai ajudar.”
Presidente regional da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) do Distrito Federal, Monalisa Azevedo reforça que ainda não era conhecida a relação entre os níveis de glicose alterados e a recuperação de lesão medular. “Eles demonstraram em estudos com animais os mecanismos para isso, com um respaldo maior para a pesquisa, mas o que foi feito com humanos é apenas uma associação retrospectiva”, pondera. A médica ressalta que, por ser um estudo inicial, os dados precisam ser confirmados em humanos de forma mais específica.
Complicação transitória
Azevedo explica que, normalmente, uma pessoa diabética que sofre um corte, seja de cirurgia, seja de lesão, tem uma cicatrização ruim. “A imunidade, a resposta inflamatória e a vascularização são mais complicadas quando a glicose é alta. Até a enervação fica prejudicada”, detalha. Sob essas condições, uma cirurgia torna-se um procedimento bem mais delicado. No entanto, não são somente esses pacientes que sofrem com o problema. A hiperglicemia transitória também pode levar a essas complicações durante o processo de recuperação.
“Quando falamos em glicemia alta, pensamos em diabetes, mas ela pode subir e a pessoa não ter essa doença. Mas, sabendo dessa informação, dosar a glicose nesse momento pode ser útil”, diz a médica. Uma situação de estresse para o organismo pode levar à alteração transitória. Estima-se que entre 10% e 15% das pessoas internadas apresentam quadro de hiperglicemia hospitalar, sendo mais da metade das ocorrências em diabéticos que desconheciam essa condição antes de chegar e ficar no hospital.
Alguns fatores podem desencadear a hiperglicemia transitória, como a tensão da internação. Isso porque a adrenalina e o cortisol — os hormônios do estresse — diminuem a ação da insulina, que promove a entrada da glicose nas células. Se a produção estiver comprometida, haverá redução de ingresso desse hormônio nas células e, consequentemente, aumento das taxas de açúcar no sangue.
Rastreamento na admissão
A detecção precoce da hiperglicemia hospitalar é a forma mais efetiva de prevenir as complicações a ela associadas, como o prolongamento do tempo de internação e o aumento da segurança em futuros procedimentos médicos. Por isso, vem ganhando força a conduta de realização do exame que mede a glicemia em todos os recém-internados. Independentemente da causa, o paciente com hiperglicemia hospitalar deve, na maioria das vezes, receber insulina pelo menos enquanto estiver internado.
Defesa neural
É a célula humana mais pequena. Tem corpo celular alongado, com muitos prolongamentos curtos e extremamente ramificados. Faz a vigilância ativa da medula espinhal, constituindo as estruturas imunes residentes do sistema nervoso central. Diante de antígenos ou partículas estranhas, cuja presença a célula consegue reconhecer devido à expressão de proteínas na membrana citoplasmática, ela procede à fagocitose (englobamento e digestão de partículas sólidas e micro-organismos) deles. Posteriormente, apresenta essas proteínas a outras células de defesa.