Em um experimento com ratos recém-nascidos, pesquisadores da Universidade de British Columbia, no Canadá, constataram que o antibiótico, mais tarde, enfraquece o sistema imunológico. “A maior parte das bactérias que vive no nosso aparelho digestivo desempenha um papel positivo na promoção de um sistema imunológico saudável, mas tratamentos antibióticos geralmente não discriminam as bactérias boas das ruins”, observa Kelly McNagny, professor de genética da instituição e principal autor do estudo publicado no Jornal de Alergia e Imunologia Clínica. “Ao se perturbar essa microbiota no início da vida, mesmo que se interrompa o uso do antibiótico, os efeitos sobre o sistema imunológico serão permanentes”, observa.
No estudo, ele testou dois antibióticos — vancomicina e estreptomicina — nos ratinhos recém-nascidos. A primeira droga não alterou as estruturas de defesa dos animais, mas a segunda, utilizada principalmente no tratamento da tuberculose, aumentou, mais tarde, o risco de pneumotite de hipersensibilidade, síndrome pulmonar caracterizada por reações alérgicas após a inalação de mofo, bactéria, fungo e substâncias químicas. Quem sofre do problema pode passar mal quando em contato com uma ampla lista de agentes causadores, como ar-condicionado sujo, borracha sintética e queijo mofado, entre outros.
“Os pais se preocupam tanto com crises alérgicas, não deixando seus filhos brincarem com animais domésticos ou evitando a poeira a todo o custo, enquanto o problema pode estar onde menos esperam”, observa. O médico, contudo, destaca a importância de tratar as crianças com antibióticos quando necessário. “Essas drogas salvam vidas, mas prescrevê-las em excesso não é uma boa coisa”, alerta. Além disso, ele diz que esse estudo ressalta a importância de buscar formas de compensar a morte das boas bactérias pelos antibióticos quando o uso dele é realmente necessário.
Para o geneticista, é possível que os probióticos — micro-organismos vivos que promovem o equilíbrio da flora intestinal — consigam desempenhar esse papel. Consumidas em forma de suplementos farmacológicos ou alimentos, como leites fermentados, essas bactérias benéficas poderiam recolonizar o sistema digestivo afetado pelos antibióticos. “A ideia é: se vamos fazer um tratamento com antibióticos, é melhor prescrever um probiótico que ajude a proteger o sistema imunológico”, defende. Contudo, McNagny alerta que ainda é preciso investigar se essa estratégia funcionará de fato.
Eczemas
No ano passado, a médica Teresa Tsakok, do Hospital de St. Thomas, em Londres, resolveu investigar a associação do uso precoce de antibióticos com o desenvolvimento de outro tipo de alergia, o eczema, a mais comum doença de pele inflamatória, também conhecida como dermatite atópica. Caracterizado por coceira, bolhas e erupções, o problema causa grande sofrimento às crianças. Tsakok fez uma revisão de 20 estudos anteriores que haviam pesquisado a relação entre a exposição pré e pós-natal aos antibióticos e o desenvolvimento de eczema.
“Encontramos uma associação significativa. No caso da exposição pré-natal, não há evidências, mas quando o uso do antibiótico é feito no primeiro ano de vida, a incidência de eczema é até 40% mais alta”, conta a médica, observando que os medicamentos de amplo espectro são os que mais parecem influenciar o surgimento do problema.
Assim como Kelly McNagny, a médica inglesa acredita que o problema esteja na microflora, que é afetada indiscriminadamente pelos antibióticos de amplo espectro. “Os micro-organismos que colonizam o intestino neonatal estimulam o tecido linfoide gastrointestinal, que contém pelo menos 60% de todos os linfócitos do corpo e desempenha um papel importante no desenvolvimento da imunidade no início da vida. Pode ser, então, que a redução e a alteração da diversidade dessa microflora, especialmente no primeiro ano de vida, afete o sistema imunológico ainda em maturação de maneira a promover o desenvolvimento de doenças alérgicas”, acredita.
"No caso da exposição pré-natal, não há evidências, mas quando o uso do antibiótico é feito no primeiro ano de vida, a incidência de eczema é até 40% mais alta” - Teresa Tsakok, pesquisadora do Hospital de St. Thomas