Quimioterapia e radiação são dois tratamentos recorrentes no combate ao câncer, mas muito agressivos ao organismo. Em busca de alternativas mais eficazes e que diminuam os efeitos colaterais, cientistas dos Estados Unidos propõem o uso de uma bactéria para reduzir tumores. Os detalhes do estudo foram divulgados na revista científica Science Translational Medicine.
Encontrada no solo, a Clostridium novyi (C.novyi) prolifera-se em ambientes com baixa quantidade de oxigênio. Por não gostar do elemento químico, ela se multiplica em tumores, que têm regiões pouco oxigenadas, condição que reduz a ação da radioterapia. A equipe de médicos da Universidade Johns Hopkins criou uma versão menos nociva do micro-organismo, que levou o nome de C.novyi-NT. Para isso, removeram genes dele, deixando-o menos tóxico e mais seguro para uma aplicação terapêutica.
Nicholas Roberts, líder da pesquisa, e a equipe coordenada por ele optaram por uma abordagem direta, injetando esporos da bactéria diretamente em tumores. Os primeiros experimentos foram feitos em camundongos com câncer de cérebro induzido. Os resultados apontaram que os esporos destruíram as células tumorais e se alimentaram de fragmentos delas sem danificar as estruturas saudáveis próximas.
A partir dessa etapa, os pesquisadores ampliaram os testes com cães. Dos 16 animais do estudo, seis apresentaram respostas positivas 21 dias após o primeiro tratamento. Desses, três tiveram tumores completamente eliminados e os outros, reduções de pelo menos 30% da doença. Esses resultados são animadores porque, segundo Roberts, há muitas semelhanças entre os cânceres em cães e em seres humanos. Em alguns casos, os tratamentos envolvem as mesmas drogas, que geram efeitos secundários parecidos. “Os cães são exemplos do que pode acontecer em humanos”, afirma Roberts.
Sabrina Chagas, professora da Escola Médica da PUC-Rio, afirma que não há surpresa nas equivalências. “O câncer origina-se a partir de um erro na multiplicação celular de um tecido. Essa alteração pode ocorrer independentemente do animal em questão”, explica. A especialista complementa dizendo que o mecanismo de ação da terapia proposta pelos cientistas da instituição norte-americana é inovador. “Esse tratamento parece ser mais eficaz em tumores pouco vascularizados. Sendo assim, devemos procurar cânceres com esse perfil e testar o efeito nesse grupo.”
Ação de enzimas
A equipe da Johns Hopkins também testou a abordagem em uma mulher com câncer. Os tumores apresentados eram de tecido mole, encontrados principalmente na região do abdômen dela. A bactéria, porém, foi injetada em um tumor metástico também de tecido mole no ombro da voluntária. O tratamento com a C.novyi-NT reduziu significativamente o câncer em volta do osso, mas não teve nenhuma manifestação direta em outros, que continuaram a crescer.
A suspeita dos pesquisadores é de que, uma vez inseridos no tumor, os esporos da bactéria crescem e liberam enzimas que destroem as estruturas cancerígenas, mas não sobrevivem fora do ambiente privado de oxigênio. “Nos concentramos em tumores de tecidos moles porque podem se espalhar para o tecido normal”, explica Roberts.
Rodrigo Medeiros, oncologista da unidade de Brasília do Centro Oncológico do Hospital Sírio-Libanês, afirma que o foco dos pesquisadores também se deve ao fato de que o tratamento proposto não pode se aplicar a todas as formas da doença. “Existem tumores que já nascem como um problema sistêmico, os linfomas e as leucemias, por exemplo. Não é possível fazer uma injeção local para esses casos já que, desde o início, a doença está em circulação por todo o corpo”, explica.
Medeiros complementa pedindo cautela em relação ao experimento norte-americano. “Embora os resultados sejam encorajadores, é fundamental que todos os passos da metodologia científica sejam cumpridos”, ressalva. A ideia de que uma infecção bacteriana possa ser usada em tratamentos contra o câncer não é nova, segundo os pesquisadores. Mas tentativas anteriores não tiveram sucesso devido à forma com que o tratamento foi aplicado, por meio de terapias intravenosas.
Roberts concorda com os especialistas e afirma que ainda são necessários mais testes para determinar o perfil dos tumores que são aptos ao tratamento e a dose a ser usada. “No momento, não tratamos um número suficiente de pessoas para ter certeza se as respostas que vemos em cães vão recapitular verdadeiramente o que veremos em humanos”, pondera.
Uso complementar
O oncologista do Sírio-Libanês em Brasília acredita que o tratamento com as bactérias deve ser utilizado de maneira complementar. “Precisamos de frentes de batalha para combater o tumor local e também as metástases e, ao mesmo tempo, poupar os pacientes dos potenciais efeitos deletérios para os tecidos e os órgãos sadios”, completa.
Segundo Sabrina Chagas, já existem outros tratamentos que poupam os tecidos não cancerígenos próximos ao tumor, mas toda nova terapia com essa proposta é bem-vinda. “As que têm essa característica são as chamadas terapia alvo-molecular. Mas o câncer ainda não tem uma cura definitiva. Por isso, todas as alternativas comprovadamente benéficas devem ser incluídas no arsenal terapêutico”, afirma.
Áreas de suporte
Também chamado de sarcoma de partes moles, esse câncer afeta tecidos localizados entre a pele e os órgãos internos, com exceção dos ossos. Manifesta-se em tecidos de suporte do corpo, como vasos, músculos, tecido gorduroso, nervos e tendões; ou em órgãos como o útero, o estômago, a pele e o intestino.
Disseminação
Termo usado para o espalhamento das células doentes do tumor original para outras partes do corpo por meio da corrente sanguínea ou do sistema linfático (rede de vasos que recolhe líquido dos tecidos que não retornou ao sangue), formando novos tumores.
Encontrada no solo, a Clostridium novyi (C.novyi) prolifera-se em ambientes com baixa quantidade de oxigênio. Por não gostar do elemento químico, ela se multiplica em tumores, que têm regiões pouco oxigenadas, condição que reduz a ação da radioterapia. A equipe de médicos da Universidade Johns Hopkins criou uma versão menos nociva do micro-organismo, que levou o nome de C.novyi-NT. Para isso, removeram genes dele, deixando-o menos tóxico e mais seguro para uma aplicação terapêutica.
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A partir dessa etapa, os pesquisadores ampliaram os testes com cães. Dos 16 animais do estudo, seis apresentaram respostas positivas 21 dias após o primeiro tratamento. Desses, três tiveram tumores completamente eliminados e os outros, reduções de pelo menos 30% da doença. Esses resultados são animadores porque, segundo Roberts, há muitas semelhanças entre os cânceres em cães e em seres humanos. Em alguns casos, os tratamentos envolvem as mesmas drogas, que geram efeitos secundários parecidos. “Os cães são exemplos do que pode acontecer em humanos”, afirma Roberts.
Sabrina Chagas, professora da Escola Médica da PUC-Rio, afirma que não há surpresa nas equivalências. “O câncer origina-se a partir de um erro na multiplicação celular de um tecido. Essa alteração pode ocorrer independentemente do animal em questão”, explica. A especialista complementa dizendo que o mecanismo de ação da terapia proposta pelos cientistas da instituição norte-americana é inovador. “Esse tratamento parece ser mais eficaz em tumores pouco vascularizados. Sendo assim, devemos procurar cânceres com esse perfil e testar o efeito nesse grupo.”
Ação de enzimas
A equipe da Johns Hopkins também testou a abordagem em uma mulher com câncer. Os tumores apresentados eram de tecido mole, encontrados principalmente na região do abdômen dela. A bactéria, porém, foi injetada em um tumor metástico também de tecido mole no ombro da voluntária. O tratamento com a C.novyi-NT reduziu significativamente o câncer em volta do osso, mas não teve nenhuma manifestação direta em outros, que continuaram a crescer.
A suspeita dos pesquisadores é de que, uma vez inseridos no tumor, os esporos da bactéria crescem e liberam enzimas que destroem as estruturas cancerígenas, mas não sobrevivem fora do ambiente privado de oxigênio. “Nos concentramos em tumores de tecidos moles porque podem se espalhar para o tecido normal”, explica Roberts.
Rodrigo Medeiros, oncologista da unidade de Brasília do Centro Oncológico do Hospital Sírio-Libanês, afirma que o foco dos pesquisadores também se deve ao fato de que o tratamento proposto não pode se aplicar a todas as formas da doença. “Existem tumores que já nascem como um problema sistêmico, os linfomas e as leucemias, por exemplo. Não é possível fazer uma injeção local para esses casos já que, desde o início, a doença está em circulação por todo o corpo”, explica.
Medeiros complementa pedindo cautela em relação ao experimento norte-americano. “Embora os resultados sejam encorajadores, é fundamental que todos os passos da metodologia científica sejam cumpridos”, ressalva. A ideia de que uma infecção bacteriana possa ser usada em tratamentos contra o câncer não é nova, segundo os pesquisadores. Mas tentativas anteriores não tiveram sucesso devido à forma com que o tratamento foi aplicado, por meio de terapias intravenosas.
Roberts concorda com os especialistas e afirma que ainda são necessários mais testes para determinar o perfil dos tumores que são aptos ao tratamento e a dose a ser usada. “No momento, não tratamos um número suficiente de pessoas para ter certeza se as respostas que vemos em cães vão recapitular verdadeiramente o que veremos em humanos”, pondera.
Uso complementar
O oncologista do Sírio-Libanês em Brasília acredita que o tratamento com as bactérias deve ser utilizado de maneira complementar. “Precisamos de frentes de batalha para combater o tumor local e também as metástases e, ao mesmo tempo, poupar os pacientes dos potenciais efeitos deletérios para os tecidos e os órgãos sadios”, completa.
Segundo Sabrina Chagas, já existem outros tratamentos que poupam os tecidos não cancerígenos próximos ao tumor, mas toda nova terapia com essa proposta é bem-vinda. “As que têm essa característica são as chamadas terapia alvo-molecular. Mas o câncer ainda não tem uma cura definitiva. Por isso, todas as alternativas comprovadamente benéficas devem ser incluídas no arsenal terapêutico”, afirma.
Áreas de suporte
Também chamado de sarcoma de partes moles, esse câncer afeta tecidos localizados entre a pele e os órgãos internos, com exceção dos ossos. Manifesta-se em tecidos de suporte do corpo, como vasos, músculos, tecido gorduroso, nervos e tendões; ou em órgãos como o útero, o estômago, a pele e o intestino.
Disseminação
Termo usado para o espalhamento das células doentes do tumor original para outras partes do corpo por meio da corrente sanguínea ou do sistema linfático (rede de vasos que recolhe líquido dos tecidos que não retornou ao sangue), formando novos tumores.