O primeiro consiste em criar uma janela de oportunidade para atuar em novas intenções. Como a pesquisadora expõe, mudar de cidade ou de emprego leva a um cenário mais fácil para abalar a rotina porque altera fatores fortes do cotidiano, como os horários. Caso não seja possível fazer uma troca tão radical, Wood exemplifica que atos como não comprar alimentos gordurosos ou colocá-los em pontos de alcance mais difíceis podem ser um começo.
Repetição, o segundo princípio, é o mais básico, mas não o mais simples. De acordo com a psicóloga, leva-se de 15 a 254 dias para criar um hábito. Pode parecer desanimador, mas o terceiro princípio ajuda: um contexto. Trata-se do foco em uma sequência de atos que fazem sentido. Por exemplo, colocar o prato na cozinha todas as vezes que terminar uma refeição ou escovar os dentes logo após passar o fio dental.
Michelly Scanzi, 30 anos, precisou mudar os hábitos radicalmente e conta que não foi fácil. “Eu era totalmente das arte cênicas e tinha uma rotina bem caótica. Trabalhava em produção de teatro, além de ser atriz, viajava bastante e fazia muitas coisas.” Há um ano e meio, ela assumiu a rotina de concurseira para ingressar na área de segurança pública e diz motivar-se ao saber que poderá repensar a área escolhida enquanto policial. “Ir pelo dinheiro ou estabilidade torna a função muito vazia e desvaloriza o cargo.”
Na nova rotina, Michelly vai para o cursinho de manhã, passa a tarde malhando, nadando ou correndo e estuda em casa até dormir. “Só vou parar depois de ver meu nome no Diário Oficial”, diz, referindo-se ao procedimento de convocação de aprovados. A jovem conta que está aproveitando a nova rotina lhe traz conhecimento além do que é cobrado nas provas. “Por meio dos estudos e das aulas, ampliei minha consciência cidadã e me aproximei bastante de discussões políticas, econômicas e administrativas.”
De acordo com o psicólogo Guilherme Félix, a influência das pessoas é determinante no processo de mudança de hábitos. “Uma técnica que funciona bastante é contar com amigos e familiares próximos, seja para que eles ajudem a lembrar da nova proposta, seja para acompanhar no novo comportamento, como nas caminhadas diárias”, diz.
Michelly classifica as pessoas como “apoiadoras e provocadoras.” No primeiro, enquadram-se a família e alguns amigos. “Tenho apoio de quem me interessa. Mesmo que estranhem minhas novas atitudes e não entendam a decisão”, diz. No segundo, estão aqueles que tentam jogar água fria no projeto. “Elas perguntam coisas como ‘por que você não tem tempo?’ ou me expõem todas as coisas de que eu gostava muito de fazer e tive que deixar de lado. É desanimador.”
Aos poucos
Antes de iniciar o processo de mudança, é preciso fazer uma reflexão sobre alguns aspectos, aconselha a psicóloga Keythiane Cristina. Perguntar-se se você está preparado, quais serão os benefícios conquistados, se haverá pessoas que ajudarão nesse processo são respostas que podem garantir que o projeto não seja deixado de lado. “Tendo essas respostas claras em mente, tem-se a base para um bom planejamento”, garante a especialista.
Sheila Soraia, 43 anos, resolveu assumir uma rotina mais saudável há nove meses e não parou mais. O impulso veio do marido, que gosta de pedalar e sempre a incentivou a fazer atividades físicas mais regularmente. Ela começou indo à nutricionista, que receitou uma dieta balanceada. No início, passava uma hora por dia na academia e fez todo mundo da família mudar a alimentação. “No dia a dia, tirei o pão branco e o arroz branco”, conta.
Hoje, a funcionária pública dedica pelo menos três horas do dia à malhação. Após se convencer do risco de ter diabetes, o que antes era uma obrigação virou divertimento. Sheila diz que a rotina ficou bem mais divertida, se comparada ao tempo em que passava assistindo à tevê no sofá quando voltava do trabalho. E o estímulo aumentou após os resultados ficarem perceptíveis: ela perdeu 12kg em nove meses. “Meu organismo funciona melhor e aprendi a comer coisas que fazem bem. Adoro os exercícios que faço, em especial a dança. E fico muito feliz por encontrar mais roupas do meu tamanho, até gasto mais”, ri.
Segundo Guilherme Félix, Sheila foi bem-sucedida porque se dedicou a uma mudança de hábitos em etapas. “Ninguém corre cinco quilômetros por dia sem ter antes o costume de caminhar. Focar em objetivos claros e razoáveis ajuda a manter a motivação. É melhor comemorar um sucesso do que lamentar um fracasso ao fim do tempo estipulado.” Segundo o especialista, assumir a postura “mudarei completamente de vida” muito provavelmente não vai terminar em bons resultados.
"Ninguém corre cinco quilômetros por dia sem ter antes o costume de caminhar. Focar em objetivos claros e razoáveis ajuda a manter a motivação” - Guilherme Félix, psicólogo
Mais fácil até a adolescência
De maneira geral, quanto menos idade tiver uma pessoa, mais fácil será a mudança de hábito protagonizada por ela. Isso porque a criança se adapta a situações com muito mais facilidade do que o adulto. “A personalidade fica menos flexível no fim da adolescência ou no início da vida adulta. Ainda assim, é possível mudar hábitos em qualquer idade”, diz o psicólogo Guilherme Félix.
Arthur Ramos, 15 anos, por exemplo, não demorou para se acostumar a fazer atividades físicas diárias. Aos 13, era motivo de chacota na escola. “Eu era bem magro, com aquela aparência de fraco. Decidi mudar porque estava cansado daquilo”, conta. Há um ano, o estudante está na academia, ama andar de bicicleta nos tempos livres e comemora as diferença causada pelas novas atitudes. “Estou mais confiante e determinado em outras áreas. Até mais sociável.”
O estudante conta que gastava muito tempo jogando videogame e não se preocupava com o que comia. A evolução foi notada pelos pais: “Quando a minha mãe me colocava de castigo, tirava os jogos. Hoje, fico proibido de sair e de andar de bicicleta”, diz Arthur. O próximo passo do jovem é levar a bicicleta mais a sério e praticar downhill, um tipo de ciclismo que consiste em descer o mais rapidamente possível um percurso, praticado normalmente em ambientes naturais.
Independentemente da idade, porém, ser resiliente ajuda, e muito, no processo de mudança de hábitos, ressalta a psicóloga Carolina Arantes. “A resiliência é a capacidade de lidar com situações adversas, se adaptando a demandas e criando comportamentos para gerar resultados mais favoráveis”, explica “Todo ser humano é capaz de mudar e se adaptar às mais variadas situações. Alguns indivíduos são mais resilientes, mas essa habilidade pode ser desenvolvida em qualquer um.”
Prepare-se
» Tenha consciência do que precisa ser modificado
» Faça um planejamento para chegar ao proposto
» Estabeleça metas simples e razoáveis
» Escreva o plano de ação e deixe em um lugar visível para que ele seja lembrado
» Tire da visão objetos que possam dificultar a mudança de hábito, como o maço de cigarro
» Peça apoio das pessoas ao redor
Fontes: psicólogos Guilherme Félix Bastos e Keythiane Cristina
A vantagem de mudar
“Alguns hábitos são vistos como os únicos capazes de gerar algum tipo de prazer e alívio. Muitas vezes, os mantemos mesmo não gerando muitos benefícios, mas trazendo conforto. O que se deve ter em mente são as vantagens do novo comportamento e as desvantagens da atitude já existente. O que colabora para a criação de um hábito é ser recompensador ao indivíduo. Quanto mais gratificante um comportamento for, mais a pessoa tende a repeti-lo. Um exemplo disso é o hábito de comprar, que gera prazer e satisfação, além de distrair e aliviar de situações e pensamentos que possam estar gerando estresse e ansiedade.” - Carolina Faria Arantes, psicóloga