Segundo Laís Fontenelle, consultora e psicóloga do Instituto Alana, o que ocorre hoje é que muitas crianças recebem os tais comandos duplos. Ou seja: são alvo de uma educação ambiental voltada para a preservação do planeta, mas, ao mesmo tempo, incitadas a desejar e consumir o tempo todo. “Os pais precisam impor limites. Não vale ensinar aos filhos que dinheiro não nasce em árvore e depois entrar numa loja e sair cheio de sacolas”, explica. Para o psicanalista Jeferson Machado Pinto, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na prática, este conflito entre o que deveria ser feito e o que realmente se faz em matéria de conservação ambiental não existe, uma vez que para as crianças o conceito de defesa do meio ambiente é muito abstrato.
“As crianças não sabem quanto carbono é gasto para fazer um telefone celular, mas aos 6 anos querem um desses aparelhos e aos 8 estão trocando o que ganharam aos 6. Existe uma pressão do consumo que se dá pela produção incessante de tecnologia”, lembra o psicanalista. Na visão dele, esse movimento é comandado pela aliança entre a produção científica e o mercado. “Esse apelo atinge as crianças de um modo especial porque isso define um modo de elas se posicionarem perante os colegas”, analisa. E o pior é que não há expectativa de mudanças.
FORA DO PADRÃO
Sílvia Fortini, de 15 anos, é estudante do 1º ano do ensino médio em uma escola para alunos de alto poder aquisitivo em Belo Horizonte. Ela já teve muitas aulas sobre conservação ambiental na escola, mas reconhece que o mundo lá fora é tentador demais. “A gente aprende essas coisas na escola, mas na verdade fomos educados para comprar e para seguir um padrão de consumo”, afirma. No ano passado, por exemplo, as colegas de escola de Sílvia estavam viajando para a Disney e ela decidiu não acompanhá-las “porque os Estados Unidos jogaram a bomba atômica no Japão”. No fim, voltou atrás e acabou acompanhando as amigas no passeio. “Muitas vezes, tento consumir pouco e agir como aprendi que é o certo. Mas muitas vezes também ignoro tudo isso e tento não pensar”, resume.
Segundo Jeferson Pinto, a impressão que se tem é que existe uma crença poderosíssima na capacidade da humanidade de encontrar soluções para os problemas do planeta, como a falta d’água e o aquecimento global, por exemplo. “Tudo o que se aprende sobre preservação é muito abstrato. Fala-se de preservação de água, mas esses adolescentes frequentam piscinas e em suas casas não falta água encanada”, lembra. Além disso, na visão dele, essa ânsia pela tecnologia e pelo consumo vem transformando as pessoas em objetos e não em sujeitos. “Essas coisas governam a subjetividade e é difícil haver um pensamento ecológico mais forte do que isso, a não ser em situação de calamidade”, conclui o psicanalista.