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Consciente sobre a importância de ser orientado por profissionais qualificados, o advogado Thiago Torres, de 32 anos, começa a perseguir seus objetivos no trithlo amparado por uma equipe, além de ficar atento aos exames regulares. “Saí de um amadorismo muito grande e hoje tenho acompanhamento com nutricionista, endocrinologista e um treinador”, conta. As temidas lesões, segundo Marconi Gomes, presidente da Sociedade Mineira de Medicina do Exercício e do Esporte (Smexe), são fruto de uma intensidade excessiva, à qual o corpo ainda não está preparado para ser submetido.
“Isso ocorre com pessoas que querem reduzir o tempo a qualquer custo, bater recordes e realizar muitas provas ao longo do ano. Submetem-se a estímulos muito intensos sem o descanso necessário, o que acaba aumentando o risco”, observa. Por isso, o ideal é fazer o treino correto para a prova que o atleta está disposto a encarar. “Muitas pessoas têm competições de mais de 100 quilômetros, mas nunca treinaram essa quilometragem”, afirma Marconi. O ideal é ir para o percurso pelo menos no mesmo nível da prova. “Se for abaixo, o risco de ter problemas é grande”, orienta.
As lesões são apenas algumas das dificuldades, mas o atleta ainda pode apresentar hipertermia (aumento da temperatura corporal) ou hipotermia (queda da temperatura corporal) e até comprometer o funcionamento renal. “Evitar perda excessiva de peso durante a prova e monitorar a hidratação também são fundamentais”, aconselha Marconi.
ALIMENTAÇÃO
Claro que a alimentação adequada deve acompanhar todo esse processo e pode ser uma arma também para evitar lesões. “A dieta é adequada a cada momento, tanto pré, durante e pós atividade física. Além de ajudar na performance, trabalha na prevenção de lesões ao fortalecer a parte muscular e reduzir o catabolismo, que seria a perda de músculos por conta dos treinos extenuantes”, explica o nutricionista esportivo Guilherme Oliveira. Por isso a importância de uma equipe multidisciplinar capaz de auxiliar o atleta a atingir seus objetivos.
Apesar de não ter nenhum patrocínio, Carla conta com um grupo de apoiadores que inclui o treinador, médicos e nutricionista e até um engenheiro responsável por pesquisar os equipamentos mais adequados para cada uma das provas que ela compete. “Ele levanta o tipo de material para uma prova no deserto, outro para as montanhas. Tudo isso varia de acordo com a prova e até a altimetria que será enfrentada”, explica.
São justamente os avanços na tecnologia de roupas, equipamentos e até suplementos que fazem com que os limites estejam sempre à prova. “Todos esses aparatos fazem com que o atleta venha se superando a cada dia. Diante dessa evolução, fica difícil falar em limites. Hoje não se sabe mais onde ele está”, reconhece Fernando Nogueira.

Mais do que o corpo, é a cabeça a grande responsável pelos resultados em competições extremas, como as ultramaratonas ou provas de triathlo. “O limite físico é ultrapassado apenas pelo psicológico”, garante a jornalista Daniela Santarosa, de 37, que pretende se dedicar às provas de ultrarrail, as corridas de longa distância na natureza. “Durante a prova, nossa briga mental é muito grande e a gente não vê a hora de chegar e aliviar esse embate”, afirma. Fernando Nogueira, que já participou de 65 ultramaratonas em toda a vida, arrisca dizer que 70% do resultado depende da cabeça e o restante, do condicionamento físico. “O psicológico pode derrotar um atleta”, afirma.
A ultramaratonista Carla Goulart, de 37, conta que durante a prova, se desliga de todo o entorno. “Sei que tem o cansaço, as dores no pé, mas não deixo que nada atrapalhe o meu desempenho. As dores no corpo desaparecem e não consigo enxergar nada ao meu redor”, conta. Fernando reconhece que para chegar nesse ponto é preciso estabelecer com clareza o foco e estar bem resolvido em relação aos objetivos. “Mas também há artifícios. Corro com música, que me transporta para outro mundo. É como um transe e como se eu estivesse fora do planeta”, descreve.
O professor-adjunto da UFMG Franco Noce explica que esse fenômeno de concentração extrema é chamado de flow felling, ou um estado de fluidez em que se atinge uma condição de plena concentração na atividade. “Mas isso realmente não é para qualquer um. Esses são seres humanos diferenciados”, pondera Noce. Inclusive no nível de desconforto e dor que são capazes de tolerar e na capacidade de resiliência que têm. “Do ponto de vista psicológico, é a capacidade da pessoa lidar com situações críticas e seguir em frente”, observa o especialista. Depois de correr 217 quilômetros sem parar, Carla afirma que precisa apenas de dois a três dias para retomar os treinamentos. “Já começo a trotar.”