“Nossos estudos anteriores mostraram que os homens de 70 anos e com participação ao longo da vida no futebol apresentam um equilíbrio postural e da força muscular rápida que é comparável ao de homens não treinados e que têm 30 anos”, conta Krustrup. Desta vez, a equipe analisou a intensidade do treino de futebol e os efeitos na saúde em idosos não treinados com pouca experiência no esporte. Para chegar a esses resultados, foram convocados 26 homens destreinados com 63 a 75 anos. Uma série de testes avaliou o estado de saúde dos participantes antes dos experimentos.
A partir dos primeiros resultados, eles foram divididos em três grupos. O primeiro participou de um treinamento de força fora do campo de futebol; o segundo, apenas de futebol; e o terceiro fez parte do grupo de controle, que permaneceu inativo. Os dois primeiros jogaram o esporte coletivo por uma hora, duas vezes na semana, durante um ano. A bateria de exames iniciais foi repetida quatro meses depois e ao fim do estudo. Diferentemente do esperado, os treinos de força e de futebol melhoraram a capacidade funcional e a resposta fisiológica ao exercício submáximo, e o futebol também elevou a aptidão aeróbica máxima e o desempenho do exercício exaustivo.
Segundo a fisiologia do exercício, o desempenho do corpo humano em atividades se divide em faixas de resistência física e anaeróbica em escalas de 20% em 20%. Ele é considerado submáximo quando tem a carga de 80% da capacidade total, sendo a última definida a partir do consumo de oxigênio, da carga muscular, do limiar anaeróbico, entre outras variáveis (veja Para saber mais).
Os resultados indicaram ainda que o futebol funciona como uma intensa atividade intervalada que provoca picos cardíacos, períodos com alta rotatividade de energia anaeróbia e impacto musculoesquelético. “Além disso, por um período de 16 semanas, pareceu melhorar a capacidade funcional, bem como o desempenho do exercício aeróbico exaustivo e submáximo e o desempenho do exercício intermitente mesmo em idosos com pouca ou nenhuma experiência prévia de futebol”, detalha o artigo.
O treinamento de força, por outro lado, provocou alta rotatividade de energia anaeróbica, mas frequências cardíacas de baixa a moderada. “O estudo revelou que os idosos inativos melhoraram o consumo máximo de oxigênio em 15% e o desempenho durante o exercício em até 50% por jogar futebol por uma hora, duas vezes por semana, ao longo de quatro meses. Além disso, a função muscular foi melhorada em 30% e a mineralização óssea no colo femoral aumentou 2%”, detalha Krustrup. “O futebol aumenta a capacidade física e a saúde do coração, até minimizando o risco de quedas e fraturas”, reforça.
Com cautela
Presidente do Departamento de Exercícios e Esportes da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Nabil Ghorayeb alerta que as incursões nos gramados não são só flores. Mesmo com os possíveis benefícios, é preciso considerar que o futebol é uma atividade de impacto, com choques entre os jogadores, a bola e o chão. “O esporte de contato em idosos traz um enorme risco, independentemente do problema cardíaco comum nessa idade. É um risco inerente a ele. Esporte de contato significa lesão, seja uma distensão, seja uma lesão de ligamentos. Levando em conta a idade das pessoas, mais problemas ainda”, explica Ghorayeb.
Isso porque, segundo o especialista, existe uma fragilidade do aparelho locomotor, já ameaçado pela osteoporose e pela osteopenia, mesmo entre os que estão nos primeiros estágios desses males. A questão cardiovascular também deve ser considerada por ser a principal causa de problemas de saúde nessa faixa etária. “Além do mais, a pessoa já apresenta um envelhecimento de órgãos importantes que fará com que ela tenha mais riscos de quedas e traumatismos, como labirintite e doenças pulmonares crônicas.”
Praticante de futebol há décadas, o administrador aposentado Joanílson Ventura Torres, 70 anos, só parou porque o joelho reclamou muito. Há pouco menos de dois anos, as chuteiras precisaram ser penduradas por um problema na articulação. Antes disso, no entanto, nenhum problema de saúde havia sido diagnosticado. “Nunca tive nada e sempre me mantive ativo. Mas também não tenho a menor dúvida de que o futebol pode ter contribuído para essa lesão no joelho. A idade e o peso da gente podem desgastar as articulações”, acredita.
Joanílson garante que todos os médicos com os quais se consultou durante a vida sempre estimularam a prática do esporte coletivo. “Ainda bem. Consegui continuar jogando por muito tempo até que a idade me parasse. Hoje, sinto muita falta”, lamenta. A atividade física se mantém na rotina do aposentado dentro da piscina, para evitar impacto, mas as corridas praticadas pelo menos três vezes na semana também precisaram ser abandonadas.
Respostas rápidas
A professora Eva Helge, do Departamento de Nutrição, Exercício e Esporte da Universidade de Copenhague, explica que o exercício precisa ser monitorado sempre e adaptado para as condições do indivíduo. “Os jogadores (do estudo) tiveram taxas de coração que eram altíssimas e correspondiam aos valores obtidos durante os jogos de futebol de elite”, alerta Helge. Ela conta que os participantes do estudo foram observados literalmente passo a passo.
A análise das medições por GPS e vídeo mostraram, por exemplo, que, no futebol, há muitas corridas rápidas, em que o indivíduo para, gira, dribla e passa, o que fornece estímulos fortes para o músculo e adaptações ósseas. Isto é, mesmo com o risco de lesões, do outro lado desse cabo de guerra, é possível que o futebol também promova a formação normal do tecido ósseo.
“As ações rápidas e os movimentos intensos não ortodoxos podem muito bem ser a causa de um grande aumento na mineralização óssea no osso fêmur e no colo do fêmur depois de apenas quatro meses, além da melhoria de 3% de quatro a 12 meses de treinamento.” Estudos ósseos conduzidos por ela mostram que quatro meses de futebol recreativo para idosos tiveram um efeito osteogênico, desenvolvido após 12 meses. Um resultado bastante positivo em comparação com o treinamento de resistência, que não surtiu qualquer efeito.
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Melhora na função muscular percebida nos idosos que, durante um ano, jogaram futebol por uma hora, duas vezes na semana
Melhora na função muscular percebida nos idosos que, durante um ano, jogaram futebol por uma hora, duas vezes na semana
Para saber mais: o papel do oxigênio
O uso do oxigênio para a queima e a produção de energia durante o exercício físico define o tipo de atividade que é praticada. No exercício aeróbico, o elemento químico funciona como fonte de queima dos substratos que produzirão a energia transportada para o músculo em atividade. O exercício aeróbico é de longa duração, contínuo e de baixa e moderada intensidade, estimulando a função dos sistemas cardiorrespiratório e vascular, além do metabolismo, pois aumenta a capacidade cardíaca e pulmonar para suprir de energia o músculo a partir do consumo do oxigênio. São consideradas anaeróbicas as atividades físicas que trabalham grupos musculares durante um determinado e constante período de tempo, de forma contínua e ritmada. Esse tipo de treino melhora significativamente o funcionamento do coração, dos pulmões e de todo o sistema cardiovascular, contribuindo para uma entrega de oxigênio. É um exercício de alta intensidade e curta duração que envolve um esforço intenso realizado por um número limitado de músculos.