Dados divulgados ontem na pesquisa ‘Nascer no Brasil: Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento’, da Fundação Oswaldo Cruz, mostram que o índice brasileiro de cesarianas é de 52%, chegando a 88% na rede privada. O estudo mostra ainda que 70% das mulheres queriam parto normal logo que engravidaram. No total, 23.894 mulheres foram entrevistadas em 266 hospitais de 191 cidades brasileiras entre 2011 e 2012. Leia mais aqui.
Apesar das mortes de mães terem diminuído de 142 para cada 100 mil nascidos vivos, em 1990, para 64 mortes, em 2011, a taxa de mortalidade materna não chegará a 35, em 2015, como estipulado pela ONU. Em países como o Canadá, por exemplo, são registrados oito mortes a cada 100 mil nascidos vivos.
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As quatro principais causas diretas de morte materna no país são: hipertensão, hemorragias, infecção puerperal e aborto (veja gráfico abaixo). “Dentro dessas causas, onde se coloca a cesariana sem indicação? Num país onde se tem uma prevalência tão alta desse tipo de parto, não basta definir a causa da morte como hemorragia porque a raiz dessa hemorragia pode ser uma cesariana desnecessária” adverte Lansky que é também coordenadora do Comitê Municipal de Prevenção de Óbitos Maternos, Fetais e Infantis BH Vida, responsável por investigar a razão de cada morte dentro das categorias citadas.
Para ela, é preciso encarar que o país vive, sim, uma epidemia de cesarianas e que isso é alarmante. A própria cesariana, segundo a especialista, aumenta o risco de complicações em uma próxima gravidez. “A cicatriz da cesariana no útero dificulta e aumenta o risco de implantação anormal da placenta (acretismo placentário) na gestação seguinte. Como consequência, na hora do parto, a mulher pode ter uma hemorragia”, explica. Dentro desse contexto, outro dado preocupante revelado na pesquisa 'Nascer no Brasil' mostra que, entre as adolescentes, o índice de cesarianas foi de 42%. Mulheres com vida reprodutiva precoce tendem a ter um número maior de filhos, consequentemente, estão expostas a mais riscos nas futuras gestações.
A especialista lembra ainda que não é só a cesárea que aumenta o risco de complicações na hora do parto, mas também o abuso de intervenções desnecessárias no parto via vaginal como episiotomia de rotina, uso de fórceps, manobra de Kristeller, entre outros. “As más práticas na assistência ao parto também estão relacionadas à morte materna”, afirma.
Obstetra e presidente da Associação de Ginecologistas e Obstetras de Minas Gerais (Sogimig), Maria Inês de Miranda Lima ressalta as diferenças existentes dentro do próprio país. Apesar de a média brasileira estar em 64 mortes para cada 100 mil, Belo Horizonte, por exemplo, registrou 33 mortes em 100 mil em 2013. “Por outro lado, temos lugares que ainda registram 140 mortes a cada 100 mil”, diz. A complexidade da questão no Brasil é tão grande que, de acordo com Sônia Lansky, há casos de morte materna justamente porque não existe a oportunidade de cesariana.
Maria Inês de Miranda Lima diz que a demora na assistência às necessidades da gestante é o principal problema a ser enfrentado. “São três demoras: identificar o risco no pré-natal é o primeiro deles; o segundo, depois que o risco é identificado, é conseguir acesso à instalação de saúde adequada; e, por último, quando se chega ao local adequado, receber a assistência obstétrica em tempo hábil”. Mulheres hipertensas, obesas, que têm diabetes, cardiopatas, infectadas pelo HIV ou malária entram na classificação de gravidez de risco.
Desafios
Para a presidente da Sogimig, a alta taxa de cesarianas tem um componente cultural. “A mulher canadense, por exemplo, tem orgulho da experiência do parto normal. Se por um lado as brasileiras querem viver essa experiência, por outro, têm pânico da dor. É doloroso, mas suportável. Existe uma tendência da comodidade em função da tecnologia”, observa.
Maria Inês de Miranda Lima acredita que uma forma de mudar o índice de cesarianas no Brasil passa pela aceitação do modelo de atendimento europeu às gestantes, que dão à luz com os médicos plantonistas. “É diferente dessa atenção individualizada que culturalmente existe aqui”, pontua.
Para Sônia Lanky, o descontrole da situação é fruto da falta de regulação do setor privado para cesarianas eletivas e desnecessárias. “Ninguém regula: nem as sociedades médicas, nem os conselhos, nem a vigilância sanitária e nem as operadoras de saúde”, diz. Segundo ela, o Brasil vive um paradoxo em razão do pleno emprego e da entrada da mulher no mercado de trabalho. “A carteira assinada vem com um plano de saúde junto e, de quebra, a mulher adquire uma cesárea com a ilusão de que é melhor, mas o procedimento cirúrgico sem indicação significa impor riscos desnecessários para a mãe e para o bebê”, pontua.
Segundo o 5º Relatório Nacional de Acompanhamento das Metas, a elevada percentagem de partos cesáreos representa um grande desafio para a política de saúde. “Mulheres submetidas a cesáreas correm 3,5 vezes mais risco de morrer (dados de 1992-2010) e têm cinco vezes mais chances de contrair uma infecção puerperal (dados de 2000-2011); sem contar a maior probabilidade de ocorrência de partos prematuros”, informa o documento do governo federal.
Ainda segundo o relatório, a meta B está próxima de ser alcançada: “Em 2011, 99% dos partos foram realizados em hospitais ou outros estabelecimentos de saúde; e por volta de 90% das gestantes fizeram quatro ou mais consultas pré-natais”.
Outros resultados
Das oito metas, o Brasil já cumpriu antecipadamente dois objetivos: Acabar com a fome e a miséria e Reduzir a mortalidade infantil.
Conheça os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
Acabar com a fome e a miséria
Educação básica de qualidade para todos
Igualdade entre os sexos e valorização da mulher
Reduzir a mortalidade infantil
Melhorar a saúde materna
Combater a Aids, a malária e outras doenças
Qualidade de vida e respeito ao meio ambiente
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