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Segundo o responsável pelo estudo, não são muitas as pesquisas que apontam que o que é feito fora do expediente está relacionado também com o comportamento no local de trabalho. Ele chegou às conclusões após observar 341 funcionários que ficaram livres para escolher e realizar as atividades criativas que mais se identificavam, com opções que variavam desde escrever contos a jogar videogames. “Apesar dessa diversidade, os entrevistados geralmente descreveram esse tempo livre como uma experiência profunda, fornecedora de um monte de informações que, de fato, poderiam ser úteis no ambiente profissional”, relata.
Social media da agência de publicidade Loock’n’feel, o publicitário Renato Amaral, 24 anos, tem, na carreira, uma relação direta com o exercício da criatividade. “O nosso desafio aqui na agência é criar um conteúdo que seja relevante, interessante e atrativo. Ou seja, é fundamental sermos criativos”, diz. Ele lembra que a educação tradicional condiciona o aluno a pensar de forma objetiva e racional, a pensar que existe sempre uma única resposta para cada pergunta. “Mas, na maioria das vezes, os problemas que surgem no dia a dia do trabalho simplesmente não têm uma única resposta”, lembra.
Renato acredita que as soluções para a grande maioria dos problemas que aparece durante a atividade profissional não estão escritas em livros ou manuais, cabendo aos funcionários buscar formas de criá-las e inventá-las. Respostas que nem sempre surgem quando estão dentro da agência. “Nesse sentido, acho que as atividade criativas treinam o nosso cérebro a pensar de uma forma menos óbvia, menos linear e, consequentemente, aumentam a nossa capacidade de solucionar os problemas diários de uma forma diferente, inusitada”, opina.
Em um cenário em que a rotina é cada vez menos manual — e dominada pela tecnologia —, João Pedro Moreira Costa, 27 anos, um dos sócios da agência em que trabalha Renato, valoriza a postura inovadora dos funcionários e cria um ambiente que proporciona isso. “Para garantir ao ambiente mais pró-criatividade, todas as pessoas do time dispõem de autonomia para dar e executar suas ideias e realmente contribuir com projetos relevantes”, explica João Pedro, sobre a dinâmica da agência.
Cabe aos donos rigor com o horário de trabalho para evitar que o estímulo à inovação seja comprometido pelo cansaço e permitir que os funcionários também exercitem a imaginação longe da agência. É natural, reconhece João Pedro, que um trabalho executado às 3h, após 18 horas de empenho seguidas, não seja tão bom quanto um desenvolvido de mente fresca. “A gente raramente extrapola o horário combinado de trabalho. Isso garante um ambiente mais leve, o que propicia o desenvolvimento de soluções diferentes.”
Eschleman alerta para o papel dos empregadores nesse processo. Os patrões devem, sim, incentivar os empregados a participarem de atividades criativas fora do trabalho. Esse apoio, entretanto, não pode virar uma coação. É necessária a preocupação de não forçar ou obrigar as pessoas a assumirem compromissos além do expediente. “Um dos principais pontos a se atentar é que ninguém quer sentir que está sendo controlado pela empresa em que trabalha. Isso pode parecer real quando até as atividades fora do expediente são voltadas ou mesmo recomendadas pelo empregador”, alerta o psicólogo organizacional.
Treinando o cérebro
Há mesmo aqueles funcionários “iluminados”, que chegam com soluções até então impensáveis. As atividades criativas no horário livre não vão deixar todas as pessoas dessa forma, mas especialistas garantem que pensar de forma inovadora faz parte do ser humano. “O que acontece é que a gente pode dar mais ou menos espaço para a criatividade. Essa é uma decisão de cada pessoa, de cada departamento, de cada empresa”, observa Tiago Mattos, sócio-fundador da Perestroika, uma escola de atividades criativas. O projeto foi criado em 2007 com o intuito de ajudar as pessoas a apostarem na própria imaginação. “Queremos ajudar o mundo a ser um lugar mais subversivo, sensível e do bem. Achamos que o ambiente corporativo é muito frio e que isso deve mudar”, explica.
Mattos traz um aspecto biológico à discussão sobre a importância de se permitir ser mais ousado. Segundo ele, o cérebro pode ser educado para responder de formas diferenciadas. Basta “condicioná-lo”. “Quando fazemos alguma coisa pela primeira vez, ele gasta muita energia para registrar o evento. Quando você repete esse evento, o cérebro já não faz tanto esforço porque vai se familiarizando com os estímulos”, explica.
Benefícios em todos os setores
Muitos estudos sobre a capacidade de encontrar alternativas e soluções criativas para dilemas no trabalho têm se concentrado em profissionais da área de saúde e militares. Em comum, quem se dedica a essas especialidades convive diariamente com uma grande carga de estresse, mas Kevin Eschleman, psicólogo organizacional da Universidade do Estado de São Francisco, na Califórnia (EUA), reforça que “esse fator causador de tensão, que é o convívio diário com a necessidade de encontrar novas respostas para as mesmas dúvidas, é inerente à qualquer profissão”. Isso mostra, segundo o especialista, que, por mais que determinada profissão exija do funcionário uma postura sistemática em relação aos afazeres, em algum momento, ele terá de buscar novas respostas e alternativas.
A necessidade surge, inclusive, no funcionalismo público, em que posturas que fujam do tradicional podem permitir que o dinheiro do contribuinte seja mais bem aplicado e os funcionários prestem serviços aos cidadãos da melhor forma possível. Seguindo essa lógica, o Supremo Tribunal Federal (STF) investe desde 2009 no Programa Viva Bem. Nele, as pessoas têm a opção de estimular o corpo e a mente dentro do órgão público. Por meio de aulas de ioga e ginástica laboral, os servidores tentam, a partir de dinâmicas fora do contexto profissional, melhorar o desempenho no trabalho.
A coordenadora do programa, Maria Alves, explica que a ideia é poder promover ações de bem-estar, qualidade de vida, satisfação no trabalho e de incentivo aos hábitos saudáveis, sempre com a perspectiva de melhorar a qualidade do trabalho e a satisfação do servidor. “Em determinado momento, a partir desse leque de opções que oferecemos, como educação financeira e alimentar, surgiu a demanda pelas aulas de ioga”, conta Alves.
Foi aí que apareceu a servidora Marisa Alonso, que havia se formado recentemente como instrutora. “Coincidentemente, uma amiga minha, que também é médica do tribunal, havia se formado comigo. Fomos descobrindo que valia a pena (dar aulas no STF) e montamos o projeto”, conta Marisa. Voluntárias e fora do expediente, as aulas são ministradas uma vez por semana para mais ou menos 13 pessoas. “Isso por conta do tamanho da sala, pois a demanda é muito maior do que conseguimos suprir”, ressalta.
Também dentro do escritório
É possível estimular posturas inovadoras exercendo atividades dentro da empresa, indicam pesquisas recentes. Ouvir música durante o expediente, por exemplo, é uma delas. De acordo com estudo da Universidade de Miami, escutar de 15 a 30 minutos de música melhora a concentração. O benefício, porém, é para funcionários mais experientes. Os novatos tendem a se distrair com os sons.
O experimento também indica que se dê preferência às canções instrumentais, que apresentam os melhores resultados. Estudiosos da Warwick Business School, no Reino Unido, garantem que o uso de redes sociais no trabalho pode aumentar a produtividade. Segundo o artigo publicado no site Bloomberg Businessweek, usar ferramentas como Facebook, Twitter e Skype capacita os funcionários a responder mais agilmente aos clientes e, por fim, converter essa habilidade em bons resultados à empresa.
A pesquisa também mostrou que o acesso a redes sociais gera uma maior colaboração entre os colegas de trabalho, além de deixar os funcionários atentos e digitalmente experientes o suficiente para competir com jovens talentos. Os empregadores, entretanto, devem estar seguros de que suas equipes são capazes de controlar o fluxo de informações das redes sociais, sabendo a hora de entrar e de sair da rede social, alertam os estudiosos ingleses.