“Esse é o primeiro relatório que mostra como o exercício simples tem um efeito direto sobre a visão. Existem alguns trabalhos relacionando os exercícios e a melhora da saúde da retina, e estudos que comprovam os efeitos positivos para a memória. Diante disso, nós nos perguntamos: se o hipocampo tem esse benefício, a retina também teria? ”, conta Machelle Pardue, pesquisadora da Faculdade de Oftalmologia da Universidade de Emory e autora do estudo publicado no Journal of Neuroscience.
Para responder a essa pergunta, Machelle e a equipe liderada por ela fizeram um experimento com ratos. Os animais praticaram exercícios físicos e, depois, foram induzidos a ter degeneração macular por meio da reflexão de luz tóxica nas retinas deles. Após semanas de observação, os cientistas notaram que os ratos que realizaram exercícios mostraram uma menor degeneração de fotorreceptores da retina, responsáveis pela visão, em comparação aos animais que não haviam se exercitado.
Também foram observados os níveis de NPDF – fator neurotrófico do cérebro responsável pela neuroproteção. As taxas foram maiores nos ratos que se exercitaram. Para confirmar se o fator era o responsável pela melhora da visão das cobaias, os pesquisadores anularam a função do NPDF nos ratos beneficiados e notaram que, após a interferência, os efeitos de proteção na retina não permaneceram. “Percebemos que os exercícios físicos parecem diminuir a ‘taxa de morte’ dos fotorreceptores. Nossos experimentos sugerem que isso ocorre devido a um aumento do NPDF no cérebro”, destaca a pesquisadora.
Rodrigo Brant, oftalmologista e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), conta que trabalhos na instituição brasileira já haviam detectado os efeitos positivos das atividades físicas na vascularização dos olhos. “Uma das primeiras coisas que percebemos foi que a prática física também beneficia a pressão ocular, que precisa ser controlada em quem sofre de glaucoma, por exemplo. Ou seja, essa é uma suspeita que tínhamos. Agora, com esse experimento, há mais dados apontando para essa melhora”, destaca.
Outros cuidados
Ana Paula Tupynambá, oftalmologista do Hospital Oftalmológico de Brasília (HOB), ressalta que os exercícios físicos fazem parte de um conjunto de medidas que devem ser tomadas para beneficiar a saúde completa do corpo, não apenas a visual. “Mas outras medidas são tão importantes quanto, principalmente para a saúde ocular, como evitar o fumo e ter bons hábitos alimentares”, pondera.
Ana Paula também ressalta que mais estudos têm surgido relacionando a saúde ocular e a alimentação. “Há uma pesquisa recente que aponta muitos benefícios à visão para quem ingere ômega 3. Isso devido ao efeito dos antioxidantes”, exemplifica. “Acredito que novos trabalhos possam surgir e que as informações cheguem mais rápido às pessoas. Quando falamos de saúde visual, só nos lembramos da catarata, porém existem outros problemas e também tratamentos oferecidos, mas poucos conhecidos.”
Os cientistas da Universidade de Emory buscam agora identificar quais tipos de atividades físicas seriam mais benéficas à retina. “Pretendemos explorar os parâmetros de exercício que são mais importantes para esse efeito e examinar os mecanismos mais de perto”, adianta Machelle Pardue. Ela acredita que os resultados dos experimentos atuais e dos futuros testes poderão potencializar os tratamentos de visão. “As pessoas que estão em risco de degeneração macular ou que demonstram primeiros sinais da doença poderão ser capazes de retardar a progressão da deficiência visual. O exercício desempenharia um papel importante na prevenção de problemas na retina e, assim, salvaria a visão”, aposta.
Rodrigo Brant também avalia que o experimento americano precisa ser aprofundado, mas o especialista destaca que a recomendação médica de se exercitar é recorrente nos consultórios oftalmológicos. “Trata-se de um trabalho que precisa de comprovação em humanos, mas já sabemos que a prática de exercícios físicos pode contribuir para a neuroproteção e auxiliar no não desenvolvimento de uma doença neurodegenerativa, o que já serve como base para a recomendação”, diz.
Terapias disponíveis
A degeneração macular seca não tem tratamento disponível, segundo o Manual Merck de Informação Médica. Medidas paliativas são, inclusive, evitadas quando a doença está em estágio grave. Em um quadro moderado, o paciente pode ser beneficiado por elevadas doses de antioxidante (como vitaminas C e E), de zinco e cobre. No caso da exsudativa, os vasos que crescem ao redor da mácula podem ser destruídos por laser antes de causarem lesões. Outro tratamento promissor é a terapia fotodinâmica, quando se administra uma substância por via intravenosa que sensibiliza os vasos sanguíneos ao raio laser. Lupas, lentes para leitura e telescópios podem ajudar os pacientes que já apresentam dificuldades visuais.
Keila Monteiro de Carvalho, oftalmologista e professora da Universidade de Campinas (Unicamp) -Prevenção conjunta
“O estudo é interessante, mas trata-se de um trabalho experimental em animais. Ainda está longe de se provar o mesmo em humanos. Estudos comprovam que a atividade física regular traz benefícios à saúde em geral, reduzindo a gordura abdominal, o peso, a inflamação sistêmica e melhorando os perfis de lipídios séricos (altamente calóricos). É conhecida a hipótese de que esses fatores tenham um papel na patogênese da degeneração macular relacionada à idade. Um estudo recente da Unicamp mostrou que a doença cardiovascular e a degeneração macular na forma avançada aparentemente apresentam vários fatores de risco em comum e poderiam ser prevenidas conjuntamente por meio de programas de promoção da saúde do idoso, envolvendo combate a fatores como hipertensão arterial, diabetes, obesidade, tabagismo, etilismo e maus hábitos alimentares. Também há indicações de que o exercício físico regular melhora o glaucoma e até mesmo diminui o risco de desenvolvimento da catarata”.