Quando o tecido está esgarçado, é preciso remendar com um material forte o suficiente para deixá-lo como novo. O mesmo acontece com o coração. Muitas vezes, o órgão, símbolo da vida perde o viço, torna-se roto, apresentando furos e rasgos. A solução pode estar nas células-tronco. Duas pesquisas divulgadas recentemente revelaram o potencial terapêutico dessas estruturas para reparar danos provocados por problemas como infarto e insuficiência cardíaca. Os resultados, promissores, apontam para uma nova era da medicina cardiovascular.
Na Universidade de Washington em Seattle, a equipe do patologista cardíaco Charles Murry conseguiu recuperar o coração de macacos infartados usando células-tronco embrionárias humanas. Até agora, isso só tinha sido possível em ratos. De acordo com o cientista, o estudo, publicado na última edição da revista Nature, é um passo importante rumo a um novo tratamento para falência cardíaca. Em vez do órgão, o transplante, no futuro, será de células, disse.
O infarto do miocárdio acontece quando a artéria coronária fica obstruída por placas de gordura, impedindo o fluxo de sangue e oxigênio no coração. Apesar de não ser uma condição necessariamente letal, os danos são perenes, pois o músculo cardíaco não tem a capacidade de se regenerar sozinho. Com o tempo, o coração começa o processo de falência. De acordo com Charles Murry, já se sabia que as células-tronco embrionárias humanas têm potencial de recuperar os tecidos avariados do órgão, mas, como nunca havia se testado essa técnica em primatas, a dúvida era se ela funcionaria. “Não sabíamos, por exemplo, se conseguiríamos produzir um número suficiente de células e, então, utilizá-las para recompor o músculo cardíaco de um animal grande, com fisiologia similar à dos humanos”, relata Murry.
Primeiro, o pesquisador cultivou os cardiomiócitos — células do músculo cardíaco —, derivados de embriões humanos. A equipe obteve 1 bilhão de unidades, 10 vezes mais do que se havia conseguido até então. Depois, induziu-se o infarto nos macacos. Passadas duas semanas, os animais, que sofriam de falência do coração, receberam uma injeção das células do músculo cardíaco. “Em pouco tempo, elas formaram tecidos que repararam os danos musculares”, comemora Murry. A regeneração foi de 40% da área danificada pelo infarto. Além disso, não houve rejeição e os cardiomiócitos transplantados se adequaram ao coração dos macacos. Em três meses, estavam completamente integradas ao músculo cardíaco dos animais.
De forma geral, Murry diz que os resultados foram bastante animadores. Em alguns animais tratados com a terapia, a fração de ejeção melhorou com o tempo — esse é um indicativo da capacidade de o coração bombear o sangue. Não se sabe por que nem todos apresentaram esse resultado, contudo. Outra boa notícia, conta o médico, é que o novo tecido cardíaco foi revascularizado por artérias e veias do coração das cobaias. Com o sucesso da pesquisa, Charles Murry acredita que, até 2018, serão iniciados os testes com humanos. Antes disso, porém, a equipe terá de encontrar meios para reparar um efeito colateral que, nas experiências com ratos, não havia se manifestado: as arritmias cardíacas.
Aliadas
Em alguns centros de pesquisa dos Estados Unidos, estão sendo realizadas terapias complementares com células-tronco em pacientes cardíacos. Nesses casos, diferentemente do que ocorreu no experimento de Charles Murry, elas não são o tratamento principal, o que dificulta saber se a eficácia é desse protocolo ou do tradicional. Mas, segundo um estudo divulgado, na semana passada, pelo Centro Cochrane, há bons motivos para se acreditar que essas estruturas são mesmo a promessa da medicina regenerativa cardíaca.
Os pesquisadores analisaram dados de 1.255 participantes de 23 estudos. Em todos, os indivíduos receberam o tratamento-padrão para doença isquêmica cardíaca e falência cardíaca congestiva. Parte também foi submetida à terapia com células-tronco tiradas da própria medula óssea. A comparação entre os grupos indicou que houve menos mortes entre os pacientes que fizeram uso das células-tronco aliado aos medicamentos usuais: 5% versus 15%. “Essa é uma evidência encorajadora de que esse tipo de terapia tem benefícios para os pacientes cardíacos”, observa Enca Martin-Rendon, do Cochrane Heart Review Group e da Universidade de Oxford.
A médica, contudo, diz que é preciso cautela com os resultados, pois estudos de maior porte devem ser realizados. “Não está claro que tipos de células-tronco trabalham melhor ou por que as terapias com elas parecem funcionar para algumas pessoas, mas não para outras. Precisamos descobrir o que há de diferente nos pacientes que não respondem bem a esse tratamento para, então, desenvolvermos estratégias mais personalizadas”, defende.
“O coração é um órgão forte, mas, depois do infarto, a área alimentada pela artéria afetada começa a morrer e se formam cicatrizes no local. Ao longo do tempo, esse dano pode levar à falência cardíaca, especialmente quando um infarto ocorre atrás do outro. Novos tratamentos usando células-tronco, que têm o potencial de se transformar em uma variedade de células cardíacas, podem potencialmente reparar e regenerar o tecido danificado. Os resultados são dramáticos, mas esse é um campo ainda muito novo. Alguns estudos mostram um ganho modesto na função cardíaca, enquanto outros nem isso. Ao mesmo tempo, há os que indicam uma melhora absurda. Essa variedade de resultados é, em parte, porque os pesquisadores usam abordagens diferentes. Algumas células são tiradas da medula óssea, outras de um embrião, outras do próprio coração do paciente. Temos de esperar mais tempo para saber qual será, de fato, o papel das células-tronco no tratamento das doenças cardíacas”,
Richard Lee, professor da Escola de Medicina de Harvard
Na Universidade de Washington em Seattle, a equipe do patologista cardíaco Charles Murry conseguiu recuperar o coração de macacos infartados usando células-tronco embrionárias humanas. Até agora, isso só tinha sido possível em ratos. De acordo com o cientista, o estudo, publicado na última edição da revista Nature, é um passo importante rumo a um novo tratamento para falência cardíaca. Em vez do órgão, o transplante, no futuro, será de células, disse.
O infarto do miocárdio acontece quando a artéria coronária fica obstruída por placas de gordura, impedindo o fluxo de sangue e oxigênio no coração. Apesar de não ser uma condição necessariamente letal, os danos são perenes, pois o músculo cardíaco não tem a capacidade de se regenerar sozinho. Com o tempo, o coração começa o processo de falência. De acordo com Charles Murry, já se sabia que as células-tronco embrionárias humanas têm potencial de recuperar os tecidos avariados do órgão, mas, como nunca havia se testado essa técnica em primatas, a dúvida era se ela funcionaria. “Não sabíamos, por exemplo, se conseguiríamos produzir um número suficiente de células e, então, utilizá-las para recompor o músculo cardíaco de um animal grande, com fisiologia similar à dos humanos”, relata Murry.
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De forma geral, Murry diz que os resultados foram bastante animadores. Em alguns animais tratados com a terapia, a fração de ejeção melhorou com o tempo — esse é um indicativo da capacidade de o coração bombear o sangue. Não se sabe por que nem todos apresentaram esse resultado, contudo. Outra boa notícia, conta o médico, é que o novo tecido cardíaco foi revascularizado por artérias e veias do coração das cobaias. Com o sucesso da pesquisa, Charles Murry acredita que, até 2018, serão iniciados os testes com humanos. Antes disso, porém, a equipe terá de encontrar meios para reparar um efeito colateral que, nas experiências com ratos, não havia se manifestado: as arritmias cardíacas.
Aliadas
Em alguns centros de pesquisa dos Estados Unidos, estão sendo realizadas terapias complementares com células-tronco em pacientes cardíacos. Nesses casos, diferentemente do que ocorreu no experimento de Charles Murry, elas não são o tratamento principal, o que dificulta saber se a eficácia é desse protocolo ou do tradicional. Mas, segundo um estudo divulgado, na semana passada, pelo Centro Cochrane, há bons motivos para se acreditar que essas estruturas são mesmo a promessa da medicina regenerativa cardíaca.
Os pesquisadores analisaram dados de 1.255 participantes de 23 estudos. Em todos, os indivíduos receberam o tratamento-padrão para doença isquêmica cardíaca e falência cardíaca congestiva. Parte também foi submetida à terapia com células-tronco tiradas da própria medula óssea. A comparação entre os grupos indicou que houve menos mortes entre os pacientes que fizeram uso das células-tronco aliado aos medicamentos usuais: 5% versus 15%. “Essa é uma evidência encorajadora de que esse tipo de terapia tem benefícios para os pacientes cardíacos”, observa Enca Martin-Rendon, do Cochrane Heart Review Group e da Universidade de Oxford.
A médica, contudo, diz que é preciso cautela com os resultados, pois estudos de maior porte devem ser realizados. “Não está claro que tipos de células-tronco trabalham melhor ou por que as terapias com elas parecem funcionar para algumas pessoas, mas não para outras. Precisamos descobrir o que há de diferente nos pacientes que não respondem bem a esse tratamento para, então, desenvolvermos estratégias mais personalizadas”, defende.
1 bilhão: Quantidade de células do músculo cardíaco derivadas de embriões humanos usadas no tratamento testado em macacos
Resultados distintos“O coração é um órgão forte, mas, depois do infarto, a área alimentada pela artéria afetada começa a morrer e se formam cicatrizes no local. Ao longo do tempo, esse dano pode levar à falência cardíaca, especialmente quando um infarto ocorre atrás do outro. Novos tratamentos usando células-tronco, que têm o potencial de se transformar em uma variedade de células cardíacas, podem potencialmente reparar e regenerar o tecido danificado. Os resultados são dramáticos, mas esse é um campo ainda muito novo. Alguns estudos mostram um ganho modesto na função cardíaca, enquanto outros nem isso. Ao mesmo tempo, há os que indicam uma melhora absurda. Essa variedade de resultados é, em parte, porque os pesquisadores usam abordagens diferentes. Algumas células são tiradas da medula óssea, outras de um embrião, outras do próprio coração do paciente. Temos de esperar mais tempo para saber qual será, de fato, o papel das células-tronco no tratamento das doenças cardíacas”,
Richard Lee, professor da Escola de Medicina de Harvard