A musicoterapia nasceu nos hospitais do pós-guerra. Era preciso trabalhar com os combatentes o aspecto emocional e mesmo alguns distúrbios mentais provocados pelos horrores das batalhas. Diferentemente da musicalização, em que é desenvolvida uma habilidade musical, ela tem um objetivo terapêutico, e este é obtido por meio da música. No Brasil e na América Latina, a prática chegou nos anos 1960, mas só mais recentemente tem conquistado o reconhecimento da área médica, apesar de muitos dos seus benefícios já terem sido comprovados cientificamente.
Formada em musicoterapia, Marina Freire foi buscar no mestrado em neurociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) ferramentas para compreender melhor como o recurso pode ajudar os autistas. Estudos anteriores já sinalizaram que o cérebro desses pacientes, que apresentam dificuldade de comunicação social ou comportamentos estereotipados, percebe o som de modo diferente. Eles têm dificuldade, por exemplo, de fazer um processamento diferenciado do som principal e do som de fundo, o que poderia contribuir para essa dificuldade de se comunicarem.
A pesquisadora quer entender como os autistas processam a música. Alguns são hipersensíveis aos sons, outros tem esse sentido pouco aguçado. “A ideia é aproveitar que ele tem esse processamento diferenciado para direcionar sua percepção auditiva para uma funcionalidade melhor que suas habilidades sociais. Se ele reagir pouco à música, o trabalho engloba sensibilizá-lo primeiro”, explica Marina, que avalia os efeitos da improvisação musical nas crianças com autismo do Ambulatório de Psiquiatria Infantil do Hospital das Clínicas da UFMG.
Uma vez por semana, durante 40 minutos, eles são estimulados a manter contado com a terapeuta por meio da música. “Trabalhamos interação e comunicação. Apresento instrumentos de percussão, crio uma base no teclado ou violão, e tentamos ‘conversar’ com os sons. A música é uma janela para ele se comunicar com o mundo, um meio lúdico de se manifestar. Eles geralmente têm dificuldade de tocarem, mas no final da sessão estão bem mais soltos”, observa a pesquisadora. Depois das 16 sessões, aqueles que no início chegavam a ficar de costas para Marina já mostram melhoria do contato visual e da fala.
OUTROS BENEFÍCIOS
A musicoterapia tem ajudado também muitas crianças com síndrome de Down. Exercícios para fortalecimento da musculatura bucal trabalhados na fonoaudiologia, por exemplo, ganham reforço na terapia com música, que muitas vezes desperta mais por seu aspecto lúdico. “Cantando e brincando com os instrumentos, eles fazem exercícios que se somam ao trabalho da fisioterapia e fono sem nem perceberem, e assim se envolvem mais”, conta a musicoterapeuta Maria Eugênia Albinati, também doutora em ciências da saúde, programa da Escola de Medicina da UFMG.
Gena, como é conhecida, sistematizou sete recursos musicais que podem ser aplicados à saúde de crianças e adolescentes e que podem ser usados de acordo com cada finalidade. Os jogos e brincadeiras musicais mobilizam, ajudam na orientação espacial, no vínculo físico, equilíbrio, deslocamento e trabalham recursos psicomotores. A apreciação promove as reações, enquanto o recurso do canto desenvolve a fala, a respiração e a postura. Os instrumentos musicais valorizam diversos movimentos, enquanto a criação musical (pode ser composição, improviso, arranjo ou paródia) mobiliza a expressão pessoal.
“Se ele não dá conta, descobre que pode fazer a parte mais fácil. Não é preciso obedecer. Criar é mais importante que a música em si. É mais fácil quando se aprende com a música. A fala aciona apenas o hemisfério esquerdo do cérebro, mas no canto os dois hemisférios trabalham. Isso estimula tudo, e a memória funciona mais”, explica a especialista. Já a expressão corporal e a dança colaboram com o aspecto motor, enquanto o sétimo recurso, o ensaio e a apresentação, preparam a pessoa para a interação social. “Ela tem a chance de se sentir a pessoa mais importante, e não aquela que dá trabalho.”
A musicoterapia também foi usada em outros hospitais da universidade e revelou uma mobilização das crianças em tratamento. Maria Eugênia levou as sessões para as salas de medicamento, onde alguns pacientes passavam até quatro horas fazendo hemodiálise e transfusão, por exemplo. O trabalho se voltou para crianças e adolescentes com câncer, paralisia cerebral e doenças degenerativas. “O som mobiliza as crianças. Elas ficavam alegres, mesmo deitadas em uma cama de hospital. A atitude delas depois da música
é diferente.”
Musicalize seu filho
Nenhuma arte é tão acessível quanto a música, permitindo pais, de qualquer condição, estimularem os filhos, principalmente os bebês. Segundo Betânia Parizzi, o importante é variar. “Pode até ser rock, desde que não seja só rock.”
Um jeito de falar experimentado em todo o mundo, o “manhês”, quando os adultos automaticamente falam duas oitavas mais agudo com os menores, deve ser estimulado. Isso porque, no primeiro ano de vida, a criança não fala nem canta, mas se comunica por meio dos sons. “O manhês é vital para o desenvolvimento do bebê. Ele não se importa com o conteúdo semântico da fala. Você pode dizer algo ruim que ele não entende, só entende os sons e as expressões faciais”, explica.
O ideal, inclusive, é que os adultos que se relacionam com esses bebês aprendam a usar ainda mais contrastes na hora de falar com o manhês, acionando outros contrastes e timbres. Outra dicas da especialista é evitar sons mais graves, não enrolar demais o bebê de forma a conter seus movimentos, e oferecer obras musicais diversificadas. Cantar também tem mais efeito que apenas colocar um disco na vitrola.
Formada em musicoterapia, Marina Freire foi buscar no mestrado em neurociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) ferramentas para compreender melhor como o recurso pode ajudar os autistas. Estudos anteriores já sinalizaram que o cérebro desses pacientes, que apresentam dificuldade de comunicação social ou comportamentos estereotipados, percebe o som de modo diferente. Eles têm dificuldade, por exemplo, de fazer um processamento diferenciado do som principal e do som de fundo, o que poderia contribuir para essa dificuldade de se comunicarem.
A pesquisadora quer entender como os autistas processam a música. Alguns são hipersensíveis aos sons, outros tem esse sentido pouco aguçado. “A ideia é aproveitar que ele tem esse processamento diferenciado para direcionar sua percepção auditiva para uma funcionalidade melhor que suas habilidades sociais. Se ele reagir pouco à música, o trabalho engloba sensibilizá-lo primeiro”, explica Marina, que avalia os efeitos da improvisação musical nas crianças com autismo do Ambulatório de Psiquiatria Infantil do Hospital das Clínicas da UFMG.
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OUTROS BENEFÍCIOS
A musicoterapia tem ajudado também muitas crianças com síndrome de Down. Exercícios para fortalecimento da musculatura bucal trabalhados na fonoaudiologia, por exemplo, ganham reforço na terapia com música, que muitas vezes desperta mais por seu aspecto lúdico. “Cantando e brincando com os instrumentos, eles fazem exercícios que se somam ao trabalho da fisioterapia e fono sem nem perceberem, e assim se envolvem mais”, conta a musicoterapeuta Maria Eugênia Albinati, também doutora em ciências da saúde, programa da Escola de Medicina da UFMG.
Gena, como é conhecida, sistematizou sete recursos musicais que podem ser aplicados à saúde de crianças e adolescentes e que podem ser usados de acordo com cada finalidade. Os jogos e brincadeiras musicais mobilizam, ajudam na orientação espacial, no vínculo físico, equilíbrio, deslocamento e trabalham recursos psicomotores. A apreciação promove as reações, enquanto o recurso do canto desenvolve a fala, a respiração e a postura. Os instrumentos musicais valorizam diversos movimentos, enquanto a criação musical (pode ser composição, improviso, arranjo ou paródia) mobiliza a expressão pessoal.
“Se ele não dá conta, descobre que pode fazer a parte mais fácil. Não é preciso obedecer. Criar é mais importante que a música em si. É mais fácil quando se aprende com a música. A fala aciona apenas o hemisfério esquerdo do cérebro, mas no canto os dois hemisférios trabalham. Isso estimula tudo, e a memória funciona mais”, explica a especialista. Já a expressão corporal e a dança colaboram com o aspecto motor, enquanto o sétimo recurso, o ensaio e a apresentação, preparam a pessoa para a interação social. “Ela tem a chance de se sentir a pessoa mais importante, e não aquela que dá trabalho.”
A musicoterapia também foi usada em outros hospitais da universidade e revelou uma mobilização das crianças em tratamento. Maria Eugênia levou as sessões para as salas de medicamento, onde alguns pacientes passavam até quatro horas fazendo hemodiálise e transfusão, por exemplo. O trabalho se voltou para crianças e adolescentes com câncer, paralisia cerebral e doenças degenerativas. “O som mobiliza as crianças. Elas ficavam alegres, mesmo deitadas em uma cama de hospital. A atitude delas depois da música
é diferente.”
Musicalize seu filho
Nenhuma arte é tão acessível quanto a música, permitindo pais, de qualquer condição, estimularem os filhos, principalmente os bebês. Segundo Betânia Parizzi, o importante é variar. “Pode até ser rock, desde que não seja só rock.”
Um jeito de falar experimentado em todo o mundo, o “manhês”, quando os adultos automaticamente falam duas oitavas mais agudo com os menores, deve ser estimulado. Isso porque, no primeiro ano de vida, a criança não fala nem canta, mas se comunica por meio dos sons. “O manhês é vital para o desenvolvimento do bebê. Ele não se importa com o conteúdo semântico da fala. Você pode dizer algo ruim que ele não entende, só entende os sons e as expressões faciais”, explica.
O ideal, inclusive, é que os adultos que se relacionam com esses bebês aprendam a usar ainda mais contrastes na hora de falar com o manhês, acionando outros contrastes e timbres. Outra dicas da especialista é evitar sons mais graves, não enrolar demais o bebê de forma a conter seus movimentos, e oferecer obras musicais diversificadas. Cantar também tem mais efeito que apenas colocar um disco na vitrola.