A retomada do sarampo fez com que o Ministério da Saúde (MS) promovesse novas campanhas concentradas na vacinação em massa de meninos e meninas expostos ao vírus. Além disso, a idade para a primeira dose foi reduzida para 6 meses. De acordo com o calendário de vacinação nacional, uma primeira dose deve ser ministrada aos 12 meses de vida. A segunda, de reforço, três meses depois. “As pessoas esqueceram, mas o sarampo não é uma doença tranquila. Tem complicações especialmente em crianças com doenças de base, com problemas de imunidade, muito novas ou mesmo em indivíduos mais velhos”, adverte o pediatra Marco Aurélio Palazzo Safadi, membro do Departamento Científico de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
Segundo Safadi, os riscos são de complicações pulmonares, neurológicas e até oculares, em alguns casos, associados à possibilidade de morte. “É possível fazer um exame para descobrir se a pessoa está imune ao vírus, porém, na dúvida, é melhor tomar a vacina, encontrada em qualquer posto de saúde.” O secretário de Vigilância em Saúde do MS, Jarbas Barbosa, garante que a imunização existente é capaz de proteger contra todos os subtipos do vírus do sarampo. A alta qualidade do imunizante assegura 95% de proteção na primeira dose, que precisa ser reforçada para garantir os outros 5%.
Ainda assim, como a maioria dos casos brasileiros é de crianças com menos de 1 ano, há uma necessidade, segundo Barbosa, de pressionar a comunidade internacional. “Enquanto não eliminarem o sarampo no resto do mundo, você sempre vai ter casos aqui que podem gerar outros. Mesmo a vacina sendo muito eficiente, primeiro é preciso que todos façam o esquema vacinal adequado”, defende.
O secretário de Vigilância em Saúde diz que, em janeiro e fevereiro, os Estados Unidos registraram 24 casos de sarampo. O Canadá enfrentou um surto da doença na província de Alberta entre outubro de 2013 e janeiro deste ano, com quase 80 casos. “Como ainda tem muito casos na Europa, na Ásia e na África, é esperado que exista detecção aqui. Quando diagnosticamos a doença, não só confirmamos que é sarampo, mas fazemos um exame para saber de onde é o vírus”, diz. A maioria dos casos encontrados no Brasil é do subtipo D8, mais comum na Europa, que diagnosticou 8.500 pessoas com a doença no ano passado.
Efeito carnaval
Do início deste ano até a primeira semana de março, foram registrados 101 casos comprovados de sarampo no Brasil, sendo 93 no Ceará, um em São Paulo e sete em Pernambuco. O surto da doença, que há muito tempo não preocupava as autoridades de saúde pública, teve início na capital do frevo provavelmente pela grande quantidade de estrangeiros que veio à cidade durante o carnaval de 2013. Os casos no ano passado no estado chegaram a 181. Após cerca de nove meses de intensa campanha de vacinação para conter o micro-organismo transmitido pela tosse ou mesmo pela respiração, a transmissão está praticamente interrompida. Apenas os municípios de Recife e Caruaru ainda podem ter vírus circulante, pois os últimos casos aconteceram há menos de 90 dias.
Como principal forma de controlar a doença, Pernambuco promoveu em 2013 duas campanhas extras contra o sarampo, que totalizaram mais de 408 mil crianças imunizadas. No ano anterior ao início do surto, houve uma notificação no estado, mas rapidamente constatou-se que o contágio havia ocorrido na França. “A pessoa chegou de viagem doente, informou logo no início o que poderia ser e conseguimos conter a transmissão. Em 2013, não. Foram alguns estrangeiros que estavam com o vírus, doentes ou ainda sem sintomas”, compara Roselene Hans, diretora-geral de Controle de Doenças e Agravos da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco.
O morbilivírus, micro-organismo causador do sarampo, tem uma incubação que varia de 10 a 15 dias. Durante esse período, não manifesta qualquer sintoma, mas já é infeccioso. Por esse motivo, a principal hipótese é de que, no ano passado, a pessoa chegou sem sintomas, adoeceu no Brasil e buscou assistência médica. “No início, crianças bem novinhas devem ter tido contato com alguns estrangeiros. O surto começou logo após o feriado de carnaval e tivemos muitos casos de contaminação em salas de espera de hospitais, públicos e particulares”, diz Hans. Depois disso, foi apenas uma questão de tempo até que surgissem registros de pessoas contaminadas por brasileiros doentes.
Em 2013, além dos 181 casos pernambucanos, outros registros foram feitos em diversos locais do país. Um deles no Distrito Federal, com o subtipo viral B3, também importado de outro continente, mas mais comum em países da África, da Ásia e do Oriente Médio. Segundo Jarbas Barbosa, a variedade de subtipos virais é mais recorrente em locais como São Paulo, onde o trânsito de estrangeiros e de brasileiros que viajam ao exterior é muito intenso. Dos cinco casos diagnosticados em terras paulistas, dois eram do subtipo D8, um do D4 e nos restantes não foi possível determinar o genótipo do patógeno. As outras unidades da Federação em que houve registro do sarampo no ano passado foram Paraíba (10), Minas Gerais (dois), Santa Catarina (um), Ceará (um) e Espírito Santo (um).
"As pessoas esqueceram, mas o sarampo não é uma doença tranquila. Tem complicações especialmente em crianças com doenças de base, com problemas de imunidade, muito novas ou mesmo em indivíduos mais velhos"
Marco Aurélio Palazzo Safadi, pediatra
Marco Aurélio Palazzo Safadi, pediatra
330 mortes por dia
De acordo com a OMS, o sarampo é uma das principais causas de morte entre crianças, apesar de uma vacina segura e de baixo custo estar disponível. Em 2012, foram contabilizadas 122 mil mortes no mundo — cerca de 330 óbitos por dia. A vacinação, entre 2000 e 2012, resultou em uma queda de 78% em mortes por sarampo. Em 2012, cerca de 84% das crianças receberam uma dose da vacina até o primeiro aniversário por meio de serviços de saúde de rotina — um aumento considerável se comparado aos 72% de 2000.