Saúde

Casal deve vivenciar novas situações para manter a paixão

Pessoas que se conheceram ainda adolescentes e estão juntos desde então provam que, muitas vezes, o primeiro relacionamento tem tudo para dar certo. Saiba dez dicas para manter a chama acesa

Paula Takahashi

"Fizemos muita coisa juntos. Apesar de eu ter sido a primeira namorada do Rodrigo, ele nunca demonstrou nenhum interesse em aproveitar a vida sem mim", diz Mariana Fonseca, psicóloga, casada com Rodrigo Ferreira

 

Um só namoro. O primeiro beijo. A perda da virgindade. Um só amor. Sem dúvida ingredientes perfeitos de histórias românticas que parecem estar presas a meados do século passado e cada vez mais distantes da realidade, que insiste em estimular o novo e experiências as mais diversas possíveis. Não é por acaso que os amores ditos eternos parecem ter traços próprios e serem exclusividade de um grupo restrito, dominado por nossos avós e, quando muito, frequentado por nossos pais.


Quando casais jovens, na casa dos 30 anos, dizem estar quase metade da vida juntos, a reação é certa. Um misto de surpresa e incredulidade, permeado por uma certa curiosidade, já que casos assim parecem estar em vias de extinção. A psicóloga Mariana Fonseca, de 31 anos, e o representante comercial Rodrigo Santos Ferreira, de 33, mesmo tão novos, estão na contramão dos relacionamentos voláteis e passageiros. Juntos desde o primeiro beijo na exposição de Sete Lagoas, em 1999 – ela então com 17 e ele com 19 – os dois completam, em agosto, 15 anos de cumplicidade.

Mariana jura que eles nunca terminaram sequer um dia e, no único semestre que ficaram mais afastados um do outro, contava os dias para chegar o fim de semana. “Eu me mudei para Belo Horizonte para estudar. Ele também veio, mas voltava para Sete Lagoas todos os dias”, lembra Mariana. O que começou como um namoro de adolescente ganhou status de compromisso sério e eles se viram curtindo os 20 e poucos anos um ao lado do outro.

“Fizemos muita coisa juntos. Apesar de eu ter sido a primeira namorada do Rodrigo, ele nunca demonstrou nenhum interesse em aproveitar a vida sem mim. Estávamos muito certos do nosso amor”, conta Mariana. Para Rodrigo, um equilibra o outro. “Ela é muito acelerada e despachada. Sou mais retraído”, descreve. Ele ainda acrescenta o respeito e a preservação da individualidade como preceitos fundamentais para a longevidade do relacionamento.

Nesses 15 anos de jornada, compartilharam desafios, estabeleceram objetivos e se comprometeram com o futuro da relação. O fato de terem começado do zero e praticamente construído toda a vida em dupla pode estar por trás do sucesso que Mariana e Rodrigo conquistaram nos vários anos de convívio, e também ajuda a explicar por que os empresários Kátia Pessoa Fernandes, de 35, e Fábio Barbosa dos Santos, de 39, estão há 23 anos juntos. Ou por que a médica obstetra Quésia Villamil, de 33 anos, e o advogado Arthur Villamil, também de 33, estão desde os 14 para 15 anos trilhando o mesmo caminho. A verdade é que não há fórmula para casos como estes, mas é possível decifrar algumas posturas, atitudes e até comportamentos fisiológicos que contribuem para uma vida em casal mais duradoura acompanhada pela qualidade na convivência.

SIMPLES ATITUDES
Pesquisa mostra que, para manter a paixão viva depois de 20 anos de casamento, é preciso que o casal vivencie junto novas situações


O primeiro desafio na lista dos amores eternos é manter viva a paixão. Os mais céticos não acreditam que o amor possa durar tanto, que a rotina é certa e que a vida sexual se tornará uma lembrança boa dos tempos de juventude. É preciso confessar que todos os relacionamentos estão fadados a situações como as citadas, mas, para seguir caminho contrário, é preciso postura e dedicação. “Em uma pesquisa com casais há mais de 20 anos juntos, foi revelado que a paixão era mantida viva entre aqueles que faziam atividades um com o outro, de preferência coisas novas”, afirma a médica fisiologista, Cibele Fabichak, autora do livro Sexo, amor, endorfinas & bobagens.

Mesmo atitudes simples, como ir a um restaurante, fazer uma viagem, mudar alguma coisa na casa – mesmo que seja um móvel de lugar – e até posições diferentes no sexo justificam o estreitamento dos laços. “À medida que os casais participam juntos de uma situação nova, fisiologicamente estarão aumentando os níveis de dopamina, neurotransmissor que tem relação direta com a liberação do hormônio oxitocina. O cérebro é então inundado por uma sensação de prazer”, descreve Cibele.

Sob o efeito desse sentimento de bem-estar, as áreas do hipocampo (relacionada à memória) e sistema límbico (responsável por controlar as emoções) são acionadas. “Com isso, o cérebro passa a relacionar situações novas e prazerosas com aquele indivíduo com o qual se está praticando a atividade”, diz a médica fisiologista. Diante da associação entre os momentos de alegria e bem-estar com a presença do parceiro, “o cérebro aprende e se habitua que estar com o outro é ter prazer garantido e, por isso, o desejo e a excitação podem continuar presentes por décadas”, revela Cibele. As relações se estreitam, os laços se fortalecem e o convívio é, então, prolongado.

Os empresários Fábio Barbosa dos Santos, de 39 anos, e Renata Kátia Pessoa Fernandes, de 35, sabem bem disso. Lado a lado desde que ela tinha 12 e ele 16, os dois reconhecem que é preciso empenho e muita sintonia para que a relação se mantenha saudável. “Quando nos conhecemos, ela tinha um som CCE e eu uma bicicleta. Juntos, conseguimos unir as economias e comprar uma moto. Dali em diante, foi tudo muito natural. Em parceria, um completando o outro, conseguimos chegar até aqui”, conta Fábio. Os desafios foram vários e eles construíram toda a vida como parceiros inseparáveis.

Além das conquistas financeiras, carinho, amizade e companheirismo permearam os mais de 23 anos de união e a rotina não tem espaço na vida dos dois. “Às vezes corremos juntos na Lagoa da Pampulha, vamos à academia ou simplesmente marcamos um jantar. Principalmente para quem tem filhos, como é o nosso caso, é importante ter esses momentos só do casal”, afirma Renata. Eduarda nasceu quando ela tinha 28 anos e já está com 8. Para que os momentos de intimidade não se percam, o casal propôs programações sozinhos. “Viajamos a cada dois anos e tentamos sair uma vez na semana. Tudo sem ela”, conta Renata.

INTIMIDADE Tirar um tempo só para o casal é fundamental para manter fortes os vínculos que o une. “A rotina, o dia a dia e as pressões que as pessoas sofrem de filhos, trabalho, sociedade, família e status fazem com que a intimidade e o sexo fiquem em segundo, terceiro e até quarto plano”, reconhece Cibele Fabichak. Quebrar a rotina com propostas como a de Renata e Fábio é um dos caminhos. “É preciso buscar novas formas de vivenciar o sexo e a intimidade. Ir ao motel, passar um final de semana romântico na praia, enfim, querer fazer mais de formas diferentes. Ambos têm que estar empenhados neste objetivo”, aconselha a especialista.

Há 23 anos, os empresários Renata Fernandes e Fábio dos Santos são parceiros inseparáveis e fazem questão de ter momentos a sós, sem a filha de 8 anos


Ter boa comunicação, celebrar as conquistas um do outro e estar aberto a ceder também são elementos comuns aos casais que compartilham décadas juntos. “O relacionamento é muito dinâmico e flexível e, por isso, é importante ir se adaptando”, pondera Cibele. Para a psicóloga Mariana Fonseca, de 31 anos, saber dar tempo para o outro, respeitar a individualidade e não desistir no primeiro contratempo foram premissas para os últimos 15 anos na companhia de Rodrigo Santos Ferreira, de 33.

“A gente também conversa muito, tem transparência. O fato de termos valores parecidos, entre eles a união com a família, também ajudou muito”, garante. Agora, eles planejam dar mais um passo no que garantem ser uma relação eterna. “Estamos tentando ter um filho. Espero que até a data da comemoração do aniversário de 15 anos juntos (em agosto), ele já esteja na barriga”, planeja Rodrigo, com ansiedade.

VIDA LÍQUIDA
Sociólogo destaca a volatilidade da sociedade moderna para explicar os relacionamentos pouco duradouros


Os relacionamentos passageiros podem ser consequência de uma dinâmica da própria sociedade. “O sociólogo polonês Zygmunt Bauman discute a volatilidade das relações no livro Amor líquido. A justificativa para que as pessoas não queiram relacionamentos profundos pode estar no fato de sermos bombardeados o tempo todo com uma série de estímulos”, afirma a médica fisiologista Cibele Fabichak.

Entre esses estímulos estão o incentivo ao consumo desenfreado e a necessidade de experimentar tudo de forma simultânea – posturas que estão extrapolando o universo do consumo e sendo levadas para o convívio amoroso. “As pessoas estão passando rapidamente umas pelas outras, querem experimentar a maior quantidade possível e acabam vivenciando uniões superficiais”, reconhece Cibele. Para a especialista, a incapacidade de mergulhar profundamente nos relacionamentos é justificada pela ansiedade em conhecer mais e ter menos.

A obstetra do Instituto Nascer, Quésia Villamil, e o advogado Arthur Villamil nunca foram influenciados por esse tipo de estímulo externo. “A gente é muito cristão e sempre quis uma vida em família. Escolhemos esse estilo de vida”, afirma Quésia. A liberdade sexual conquistada pelas mulheres nunca foi, para a obstetra, sinônimo de prazer e felicidade. “Por isso, nunca acreditei que seria necessário ficar com várias pessoas para saber o que quero. Quis encontrar a certa para construir uma vida”, afirma.

Quésia e Arthur Villamil têm uma vida muito intensa e, com a convivência, aprenderam a superar os obstáculos e transformá-los em conquistas


Postura compartilhada por Arthur. “É importante decidir amar e assumimos essa decisão”, conta. As divergências e conflitos vieram como em qualquer convívio regular, mas a forma como encararam as intempéries foi essencial para a construção da vida a dois. “Conversamos muito, sabemos nossas prioridades e respeitamos um ao outro. É importante também saber que será importante abrir mão de alguma coisa. Até relações de amizade são assim”, reconhece Quésia. Vencer os desafios e as dificuldades juntos ajudou a fortalecer a união. “Viemos de uma sequência de lutas e conquistas. Nossa vida é muito intensa, o que nos ajuda a não cair na rotina”, diz Arthur.

MÃOZINHA Assim como todos os relacionamentos, Arthur e Quésia contaram com o auxílio de um importante hormônio relacionado ao amor. “Sabemos no meio médico que a oxitocina é gerada principalmente na relação sexual e tem grande relação com momentos de prazer”, conta a obstetra. Para ser liberado, é importante associar momentos de relaxamento no convívio diário. “Mulheres e homens mais tranquilos e pessoas que têm momentos de lazer com e contato com a família estão mais propensas à produção do hormônio. Por isso a relação recente da oxitocina com bem-estar e fidelidade conjugal”, afirma.

 

"É certo que o sexo é uma poderosa ferramenta para aumentar a produção de oxitocina e, à medida que a frequência cai, os casais podem se sentir menos próximos", diz Paul Zak
ENTREVISTA - Hormônio do amor
Paul Zak, Cientista e autor do livro "A molécula da moralidade"


O coração sempre levou a fama de abrigar o amor, mas é no cérebro que o sentimento ganha vida. A oxitocina é um dos hormônios protagonistas neste processo e vem sendo chamado, há anos, de hormônio do amor. Especialista no assunto, o norte-americano Paul Zak já publicou um livro em que a oxitocina é considerada a molécula da moral e está relacionada com fidelidade e confiança, fatores fundamentais para a durabilidade dos relacionamentos.
Em entrevista ao Estado de Minas, ele fala sobre as melhores alternativas para estimular a produção do hormônio e a importância nas uniões duradouras.


Qual a relação entre a oxitocina e a durabilidade dos relacionamentos? A presença do hormônio estimula a confiança e a fidelidade?

A oxitocina é a cola das relações sociais. Ela nos motiva a interagir com pessoas familiares e que inspirem segurança e é a base de sustentação dos relacionamentos duradouros. Isso porque ela atua em circuitos do cérebro que nos fazem sentir bem quando estamos próximos do nosso parceiro romântico, amigos e filhos. O casal que sempre libera oxitocina um com o outro é mais propenso a ter um relacionamento longo. Esses estímulo pode ocorrer por meio de um abraço, sexo ou simplesmente fazendo atividades juntos, principalmente aquelas mais excitantes, como andar de montanha russa. A oxitocina liberada no cérebro sustenta o sentimento de confiança, já que faz com que tenhamos maior empatia pelo próximo e nos tornemos mais conectados emocionalmente.

O orgasmo é um dos momentos de maior liberação da oxitocina, juntamente com o parto. Mas é sabido que a medida que o relacionamento se consolida, a frequência das relações sexuais tende a diminuir. Como as relações podem durar mais se um dos momentos mais importantes de produção da oxitocina é comprometido?
É certo que o sexo é uma poderosa ferramenta para aumentar a produção de oxitocina e, à medida que a frequência cai, os casais podem se sentir menos próximos. Isso pode ser combatido com medidas como estipular “noites de sexo”. Ou então encontrar outras atividades que também estimulem a produção do hormônio, como as já citadas. Até mesmo ver um filme romântico e utilizar as redes sociais pode ter importantes efeitos. A grande chave é fazer essas atividades juntamente com o parceiro romântico.

Outras situações como comprar uma casa, um carro e ter um filho também podem ter efeitos na produção deste hormônio?
Em 12 anos de experimentos, só descobrimos ligação entre as relações sociais e a liberação de oxitocina. Comprar uma casa ou ter um filho podem ser fatores importantes para o casal ficar junto por mais tempo, mas isso geralmente está relacionado a razões financeiras e não tanto com a ação do hormônio. A oxitocina tem uma meia vida de apenas três minutos. Portanto, é uma resposta muito rápida a um beijo, abraço ou a um presente ganho. É preciso alimentá-la constantemente para manter os relacionamentos.

A produção da oxitocina tem alguma relação com a idade? Pessoas mais novas liberam mais que as mais velhas?
Descobrimos recentemente que a liberação da oxitocina não diminui com a idade. Portanto, não importa quantos anos a pessoa tenha, ela será capaz de sustentar os relacionamentos. A resposta das mulheres mais jovens à oxitocina varia de acordo com os níveis de estrogênio. Portanto, ao longo de um mês, a mulher se sentirá mais ou menos ligada ao seu parceiro. Altos níveis de testosterona, por sua vez, inibem a liberação do hormônio. Com isso, homens entre 15 e 25 anos, fase em que esses níveis de testosterona estão mais elevados, são menos propensos a manter relacionamentos de longo prazo. Um estudo com 1 mil pessoas concluiu que as mulheres produzem mais oxitocina para uma determinada situação do que os homens. Esta é uma das razões que justificam o fato de a mulher se ligar mais aos seus parceiros, ser mais amável, mais compassiva e mais empática que a média dos homens.