“O ouro é considerado um modificador do curso da doença. A inflamação desaparece, e o estado geral do paciente melhora, mas o depósito dele nos tecidos provoca grandes efeitos colaterais”, esclarece a clínica-geral Ana Maria de Araújo Rodrigues, especialista em antroposofia aplicada à saúde. Apesar da eficácia, o uso continuado gera consequências como problemas nos rins e lesão na medula. Por isso, a pesquisadora decidiu testar uma nova forma de aproveitar o metal, seguindo o método antroposófico. Ao evaporar, o ouro perde a ação densa sobre órgãos e tecidos do corpo humano, responsável pelos efeitos colaterais, mas não perde suas propriedades terapêuticas. Em casos de artrite reumatoide, ele ajuda por ser anti-inflamatório, antidepressivo e imunogênico (agente que melhora a imunidade).
No estudo, que será realizado no Ambulatório de Reumatologia da Santa Casa de Belo Horizonte, o metal será associado, pela primeira vez, a uma planta abundante no Brasil: a cavalinha. “Ela é osteogênica, pois regenera os ossos, é anti-inflamatória, cicatrizante e contém silício, o maior componente dos ossos com o cálcio”, destaca a especialista, acrescentando que tem alcançado bons resultados com as duas substâncias para tratar a artrite reumatoide. Rodrigues comenta que os medicamentos antroposóficos, usados há 30 anos no Brasil, são autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Setenta e cinco mulheres com grau de inicial a moderado de artrite reumatoide — que ainda serão recrutadas — usarão por seis meses o medicamento Aurum metallicum/Equisetum arvense. Além de analisar a eficácia das substâncias, os pesquisadores vão testar uma nova maneira de administrar a medicação. Ana Maria explica que as voluntárias receberão as doses por via subcutânea, método menos doloroso e que permite ao paciente aplicar sozinho, na perna ou no braço, duas vezes por semana. Os outros participantes tomarão o medicamento em gotas, duas vezes ao dia.
No tratamento convencional da doença, utilizam-se medicamentos para alívio da dor, entre analgésicos, corticoides e anti-inflamatórios, e outros de uso contínuo que previnem lesões nas articulações, em especial o metotrexato, usado em todo o mundo. Integrante da equipe de pesquisadores que vão analisar a eficácia do ouro, a reumatologista Adriana Kakehasi pontua que uma parcela dos pacientes não responde bem ao uso da droga, desenvolvendo intolerância ou sofrendo com efeitos colaterais, daí a necessidade de buscar alternativas.
“É preciso entender que alguns pacientes sempre vão se beneficiar de alternativas. O ouro não vai ser pior nem melhor, vai ser mais uma possibilidade”, defende Kakehasi, que é professora do Departamento do Aparelho Locomotor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e coordenadora do Ambulatório de Artrite Reumatoide do Hospital das Clínicas. Ela conta que muitos pacientes chegam ao consultório com o interesse de associar a medicina alopática à integrativa. “Indico desde atividade física até acupuntura e homeopatia. Desde que não faça mal à saúde, só tem a ajudar. Um tratamento trabalha em colaboração com o outro.”
Aliado do tradicional
A coordenadora da Comissão de Artrite Reumatoide da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), Licia Maria Henrique da Mota, revela que 75% dos pacientes recorrem a tratamentos alternativos. Diante da necessidade de uso contínuo da medicação e da falta de perspetiva de cura, eles tentam buscar outras soluções. Apesar de concordar com o uso de terapias que não trazem malefícios, a reumatologista adianta que não é possível comprovar a eficácia da maioria delas para tratar a doença.
“Para a quase totalidade, não há evidências de que tragam benefícios. Isso sempre deve ser comunicado ao paciente para que ele possa avaliar com muito cuidado. Mas orientamos que, em hipótese alguma, o tratamento alternativo deve substituir o convencional. Ele deve ser um aliado”, opina a médica, que também é professora de pós-graduação da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (UnB).
Como revela Licia Mota, o cenário do tratamento da enfermidade no Brasil é um dos mais favoráveis em todo o mundo. As opções eram limitadas há três décadas, mas hoje os pacientes podem contar com uma gama de alternativas terapêuticas oferecidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A reumatologista comenta que o metotrexato apresenta eficácia adequada, o que acabou contribuindo para que medicações menos seguras, incluindo o ouro, fossem substituídas ao longo do tempo.
O ouro é um modificador do curso da doença. A inflamação desaparece, e o estado geral do paciente melhora, mas o depósito dele nos tecidos provoca grandes efeitos colaterais”
Ana Maria de Araújo Rodrigues,
clínica-geral
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10 FATOS SOBRE ARTRITE REUMATOIDE
» 1. A cada 100 indivíduos, um apresenta a doença
» 2. Acredita-se que os hormônios femininos tenham ligação com a artrite reumatoide, por isso ela é mais comum em mulheres
» 3. A doença costuma se manifestar na vida adulta, principalmente entre os 40 e 60 anos, mas pode surgir em qualquer idade
» 4. A causa exata da artrite reumatoide é desconhecida, embora observe-se que ocorre um desequilíbrio do sistema imunológico. As células inflamatórias se acumulam nas articulações e acabam destruindo as estruturas normais.
» 5. O principal componente ambiental que favorece a doença é o tabagismo. Os fumantes têm mais chance de desenvolver a enfermidade e podem não responder bem ao tratamento
» 6. A artrite reumatoide se manifesta mais frequentemente em mãos, joelhos e pés. É comum ocorrer nos dois lados do corpo
» 7. Dor moderada, inchaço, dificuldade de movimentação e rigidez matinal são os sintomas mais frequentes
» 8. Em casos mais raros, o paciente pode apresentar mal-estar, desânimo, febre baixa, emagrecimento, falta de apetite, anemia e até depressão
» 9. É importante definir o diagnóstico o mais cedo possível, já que algumas alterações são irreversíveis. O ideal é iniciar o tratamento em poucas semanas
» 10. Quando não é tratado, o mal pode evoluir para destruição articular, deformidades e incapacidade motora. Cerca de 30% dos pacientes atendidos no ambulatório de reumatologia do Hospital das Clínicas da UFMG param de trabalhar por causa da doença
Fonte: Adriana Kakehasi, reumatologista