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Segundo o urologista Lucas Nogueira, coordenador do Grupo de Uro-oncologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Departamento de Uro-oncologia da Sociedade Brasileira de Urologia, atualmente os marcadores são a dosagem do PSA (sigla em inglês para antígeno prostático específico) e a biópsia, mas o câncer de próstata precisa de melhores marcadores, no caso moleculares, para uma identificação de tumores de comportamento diferentes. “Esses marcadores moleculares estão sendo estudados há muito tempo e em um futuro bem próximo devem estar disponíveis. A partir deles será possível identificar melhor aqueles tumores que precisam ser tratados de forma mais rápida, e de que forma”, explica.
O planejamento do tratamento é a grande contribuição dessa evolução. Segundo o oncologista Túlio Eduardo Flesch Pfiffer, do Hospital Sírio-Libanês, de São Paulo, o futuro do tratamento do câncer de próstata aponta para novas terapias hormonais e é a combinação entre elas o foco dos estudos daqui para frente. “Esperamos entender melhor qual a melhor sequência das terapias disponíveis e o que é possível combinar para uma maior sobrevida e uma menor toxicidade. De quatro anos para cá tivemos um crescimento exponencial das opções terapêuticas, com pelo menos cinco novas formas de tratar o câncer de próstata. A comunidade científica agora quer aprender qual a melhor forma de sequenciar e combinar essas novas drogas”, explica.
A conferência da Sociedade Americana de Oncologia Clínica (Asco) sobre câncer geniturinário, encerrada sábado, em São Francisco, nos Estados Unidos, revisou os avanços da última década, considerada de progresso para o câncer de próstata. Segundo Behfar Ehdaie, cirurgião no Sidney Kimmel Center for Prostate and Urologic Cancers, de Nova York, houve uma grande mudança no comportamento epidemiológico da doença nos últimos 10 anos. Em parte, isso está relacionado à melhor detecção e tratamento do tumor. O manejo da doença está cada vez mais individualizado em função de uma estratificação do risco. Novas ferramentas também foram definidas nesse período, assim como medicamentos.
“Para o futuro próximo, podemos antecipar que o uso de testes moleculares e genéticos na clínica vai promover a qualidade do tratamento ao estabelecer métricas de performance das terapias e, com elas, um melhor retorno para os especialistas. As técnicas cirúrgicas e de imagens avançadas também vão continuar evoluindo”, acredita Ehdaie. A diretora associada de pesquisa clínica da Universidade de Michigan, Maha Hussain, também acredita que as futuras contribuições passem pelos meios de sequenciar e combinar os novos agentes terapêuticos, pela identificação de subtipos moleculares e biomarcadores, e também pela identificação de novos caminhos para a segmentação do tratamento. “Não há dúvidas que o melhor está por vir.”
ATENDIMENTO PELO SUS
A boa notícia no tratamento da doença localizada é que ela tem hoje boa cobertura no Sistema Único de Saúde (SUS), no Brasil. “É grande a demanda pela cirurgia e radioterapia, mas o fluxo é rápido no HC/UFMG”, revela o oncologista Lucas Nogueira. O SUS hoje paga, inclusive, a prótese peniana, que é o tratamento para a disfunção erétil. O esfíncter artificial, um dos tratamentos para a incontinência, só é conseguido por meio judicial. Desde o início do ano essa cirurgia e o aparelho são cobertos pelos planos de saúde. No entanto, a realidade não é a mesma no tratamento da doença avançada. Segundo o oncologista Emílio Lacerda, do Centro Paraibano de Oncologia, em João Pessoa, o tratamento do estágio mais avançado da doença é muito restritivo no SUS, deixando o paciente sem acesso aos novos medicamentos e tecnologias. “O que de mais novo podemos usar é uma medicação já estabelecida há oito anos. Ou seja, paciente do SUS está sendo subtratado para os padrões da oncologia”, revela.
Francisco José do Prado Pizarro, 61 anos, fotógrafo: câncer vencido
Francisco viu a mãe morrer de câncer, mas também viu o pai e o irmão caçula enfrentarem a mesma doença e sobreviver a ela. Os três homens da família foram diagnosticados com o câncer de próstata. No caso de Francisco, foi há cinco anos. Ele já vinha fazendo a dosagem de PSA e o exame de toque anualmente, sem que se constatasse qualquer alteração. Mas daquela vez foi diferente. “Receber a notícia foi como tomar uma pancada. Sumiu tudo em volta”, lembra. Na véspera de casar os filhos, adiou a cirurgia por alguns meses, mas depois a enfrentou e comemorou seu sucesso. Nada de sequelas: nem impotência, nem incontinência. Mas em 2011 uma oscilação no PSA sugeriu uma anormalidade. Uma biópsia confirmou a desconfiança: o câncer tinha tido uma recidiva. Ele era menor e a experiência de já ter passado por aquilo o tranquilizou. Mas
o tratamento foi completamente diferente: Francisco passou por uma combinação de tratamento hormonal com radioterapia.
As seis injeções do hormônio foram dolorosas. Francisco cogitou desistir, mas o apoio da família e a fé na cura o fizeram seguir. As dores de cabeça com a radioterapia também foram um grande incômodo, assim como a perda da libido. A vontade de viver, entretanto, animou Francisco, hoje curado. “Os homens precisam deixar esse orgulho de lado. O exame de toque é rápido e seguro. É preferível passar por ele a ser submetido a uma cirurgia e morrer de câncer de próstata. Perdi um tio assim, que não quis se tratar.”
Atuação multidisciplinar é positiva
São vários os cenários para o tratamento do câncer de próstata, que evoluiu muitos nas últimas décadas, trazendo benefícios para os pacientes. Segundo Lucas Nogueira, da UFMG, um exemplo é a quimioterapia para esse tipo de câncer, só disponibilizada em 2004. Para o urologista, o tratamento da doença tende a ser cada vez mais multidisciplinar, com a atuação conjunta dos urologistas com os oncologistas. Há dois estágios do câncer de próstata: quando a doença ainda está localizada, ou seja, não foi disseminada para outras estruturas, e quando ela já está avançada. Estão nessa última, um estágio mais grave, as mais recentes novidades.
Segundo o oncologista Alexandre Fonseca, da Oncomed, na doença localizada os pacientes podem ser subdivididos em de baixo risco, risco intermediário e alto risco, o que depende de fatores específicos como nível de PSA no sangue, extensão da doença na próstata e classificação histopatológica. Há diversas modalidades de tratamento e as opções devem ser discutidas entre o médico de forma individualizada com o paciente, principalmente no que se refere a possíveis efeitos colaterais, caso da incontinência urinária e da impotência. De acordo com Nogueira, enquanto a incontinência atinge até 5% dos pacientes em tratamento, a impotência pode afetar 30%.
Para pacientes de baixo risco, a cirurgia de retirada da próstata (aberta, por vídeo ou mesmo robótica), a radioterapia (externa ou por braquiterapia, quando “sementes” radioativas são implantadas diretamente na próstata) e a chamada vigilância ativa (o acompanhamento rigoroso dos pacientes sem intervenção em um primeiro momento) são as opções. Para a doença de risco intermediário, a cirurgia ou radioterapia associada a tratamento hormonal por seis meses são estratégias adequadas. Já para a doença de alto risco localizada indica-se a radioterapia associada a tratamento hormonal por dois ou três anos, sendo que a cirurgia pode ser usada também em casos bem selecionados. Em determinados pacientes, a radioterapia pode ser necessária após o tratamento cirúrgico.
RECUPERAÇÃO RÁPIDA
Apesar de as técnicas cirúrgicas terem evoluído bastante, estudos revelam pouca diferença entre as três modalidades disponíveis. “Dez anos atrás uma cirurgia de remoção da próstata durava cinco horas, hoje não passa de duas horas. A recuperação é rápida, o paciente passa apenas dois dias no hospital e as sequelas como incontinência e impotência diminuíram muito. Mas, apesar de a cirurgia laparoscópica já ser usada há muito tempo, ela não tem muita diferença em relação à cirurgia aberta, apenas o aspecto estético”, explica o urologista Lucas Nogueira.
As opções terapêuticas para a fase avançada da doença foram as que mais evoluíram nos últimos anos, aumentando a sobrevida dos pacientes e melhorando sua qualidade de vida. Segundo Alexandre Fonseca, muitos agentes terapêuticos se provaram ser benéficos na última década. O tratamento hormonal da doença, já consolidado há vários anos, vem recentemente ganhando reforços. “A incorporação de novos agentes hormonais com diferentes mecanismos de ação é uma realidade: seja pela inibição da produção hormonal na glândula suprarrenal, caso da abiraterona, ou seja, por meio de antiandrogênicos mais potentes, como a enzalutamida”, explica Alexandre.
VACINAS
A utilização de quimioterapia também está estabelecida, com benefícios em sobrevida para o paciente. Durante o congresso, foi discutida a estratégia de estimular o sistema imunológico para atacar as células tumorais, por meio de vacinas, por exemplo. Para Túlio Pfiffer, entretanto, essa opção não deve ser disponibilizada no Brasil. “É muito personalizado. Só dois centros nos Estados Unidos fazem esse tratamento em que o sangue do paciente é retirado, exposto a antígenos e depois devolvido a ele. O impacto de sobrevida é de três meses e é uma das primeiras opções para o tratamento do tumor avançado. Mas o paciente teria que ir aos Estados Unidos fazer”, explica. Outro foco de atuação é o tratamento dos pacientes com câncer de próstata resistente à castração que já têm metástase óssea, sendo o cloreto de rádio 223 a principal novidade. (C.C.)
*A jornalista viajou a convite da Bayer