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Em tempos de tecnologia avançada, de tablet ao alcance de bebês, a narração se tornou o resgate de uma tradição. “Os conhecimentos passados por via oral são a arte mais antiga da humanidade. Houve um tempo em que a narrativa era a única forma de passar cultura”, destaca Sylvia Flores, psicóloga, psicopedagoga e professora do Centro Universitário Newton Paiva. Nas antigas sociedades agrárias, os mais velhos estavam sempre contando casos e lendas. Mas o costume foi se perdendo com a modernização, principalmente nos grandes centros. Nem todas as famílias mantiveram a tradição. Por outro lado, há os pais que ainda as contam por acreditar que, assim, além de ensinar, estão estreitando os laços com os filhos.
E é verdade. Prova disso é o pequeno Gabriel Morais, de 2 anos e 7 meses, que ao ouvir da mãe, Valéria Morais Ramos, de 35, o “era uma vez...”, larga brinquedos para trás e tudo mais que estiver fazendo só para ficar com os olhos e ouvidos atentos em Valéria. “Gosto de ouvi-las sempre na hora em que vou dormir e também quando estou almoçando. E sempre que dá conto para meu irmão mais novo”, confessa a pequena Maria Eduarda, de 5, filha dos advogados e professores universitários Felipe Martins e Letícia Junger. Já Gabriel Santos Ferreira, de 8, cresceu ouvindo histórias da mãe, Roberta Fernandes Santos, e, hoje, conta orgulhoso que está na 80ª página de um livro com 112 páginas. “Gosto de ler e aprendi também a contar minhas histórias.”
A leitura de capítulos ou a invenção deles, segundo destaca a psicóloga e psicopedagoga Sylvia, é uma forma de os pais se aproximarem de seus filhos. “As crianças que vivem em um ambiente assim desenvolvem o interesse pelo lúdico e o prazer pela leitura. Elas vencem medos e aprendem valores.” Para a contadora de histórias e editora-chefe da Aletria e de livros infantis, Rosana Mont'Alverne, contar histórias é um ato de resistência. “É um antídoto contra essa onda de comportamentos padronizados. Contar é afeto, é dar seu tempo para a imaginação. Por isso é importante o lobo mau, Joãozinho e Maria. São repertórios que nos ajudam a lidar, de forma gostosa, com as angústias da primeira infância”, diz, ressaltando que, assim, ouvindo fábulas, casos e contos na sua infância, tornou-se uma adulta com os próprios pensamentos. “Esse é meu maior tesouro. Não me tornei uma Maria vai com as outras. Com as histórias, você consegue pensar sozinho. Comecei a ler o mundo e tomar as minhas decisões”, orgulha-se.