Gabriel Santos Ferreira, de 8 anos, ainda não é um Monteiro Lobato, mas já tirou dos livros lições e criatividade. De tanto ouvir histórias contadas pela mãe, Roberta Fernandes Santos, ele foi o primeiro de sua turma na escola a ler, e aos 6 anos foi escalado para ser narrador de uma peça de teatro na sua formatura. “Ele é um menino curioso e pergunta muito. Muitas vezes, por meio dos casos que conto, é que explico o que ele quer entender. Lembro-me de que, quando ele tinha 4 anos, tinha medo do escuro. Então, li para ele um livro infantil sobre quem tem medo de escuro. E, desde então, ele perdeu o pavor do apagar das luzes”, comenta Roberta. Gabriel concorda e diz que foi a melhor obra, pois o ajudou a perder seus medos. “Gosto de quando minha mãe lê para mim. Ela fala coisas engraçadas e a gente fica mais pertinho”, confessa o menino, que hoje é fã das livrarias.
De acordo com Roberta, o livro tem um encanto natural. “Com ele você imagina os lugares, as pessoas. Ele traz a magia que as outras coisas não trazem”, diz, destacando que muitos pais têm perdido esse momento, deixando os equipamentos eletrônicos ganharem a imaginação dos filhos. “Isso não pode se perder. Muitos não compram livros mais. É triste”, lamenta. Para a psicopedagoga Sylvia Flores, contar histórias é importante, principalmente porque elas se tornam metáforas. “Contando ou lendo João e Maria, por exemplo, estamos ensinando aos pequenos conceitos morais. Não adianta se sentar com uma criança e querer falar de regras para ela. Ela não vai entender. As fábulas, lendas, contos ou aquelas histórias que os adultos inventam são uma maneira lúdica de passar os códigos de conduta”, afirma a especialista.
Segundo ela, os contos de fadas de hoje trazem para as crianças novos valores. “Se antigamente as princesas esperavam o príncipe para salvá-las, hoje esses contos mostram essas princesas com atitudes.” Na casa de Felipe Martns, advogado e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), os medos de Maria Eduarda, de 5 anos, e João Felipe, de 1, são trabalhados com o universo encantado das palavras. “Além das tradicionais, contamos nossos casos de infância. Maria Eduarda adora. Minha mãe lia para mim e hoje leio e conto para eles”, comenta Felipe Martins. De tanto venerar o momento, Maria Eduarda não se contenta em apenas ouvi-la antes de dormir. A narrativa precisa ser feita também na hora do almoço. “Tem que ser todos os dias. Se não somos nós a contar no horário do almoço, é nossa funcionária que faz esse papel. Já ocorreu de eu dormir quando contava e ela me acordar para terminá-la”, diverte-se a mãe de Maria Eduarda, Letícia Junger, advogada e professora da UFMG.
Apaixonada por tudo que seus pais contam, Maria Eduarda diz que, mesmo sem saber ler, repassa o que ouve para o irmão João, de 1 ano. “Gosto da Rapunzel, da Branca de Neve, da Turma da Mônica e de todas os casos sobre a infância dos meus pais. Fico acordada até chegar ao final. Quero que eles me contem isso para sempre”, diz. De acordo com a psicopedagoga, crianças e adultos vencem os medos por meio das fantasias. “Temos medo do que a fantasia tem gerado na nossa mente. Precisamos entrar no mundo delas para nos livrarmos de nossos medos. Para ter uma ideia da importância que as obras infantis trazem, para muitas pacientes minhas recomendo as histórias infantis”, defende.