Presidente do Comitê de Neurologia Infantil da Sociedade Mineira de Pediatria, Marli Marra considera o modelo sem pedal uma alternativa interessante. Ela explica que o desenvolvimento neuropsicomotor vai da cabeça para as pernas. “Primeiro a criança firma o pescoço. Na sequência, passa a brincar mais com as mãos e ganha o controle do tronco. Nas etapas do desenvolvimento, senta antes de aprender a engatinhar”, exemplifica. Segundo ela, a ‘balance bike’ vai trabalhar o equilíbrio estático (que é a criança parada) e o dinâmico (a criança andando ou correndo). “Aqui no Brasil a gente tem o hábito de dar a bicicleta com a rodinha, mas a criança menor não sabe pedalar”, observa.
A pediatra elucida que é a partir dos 4 anos, quando a criança consegue subir e descer a escada alternando os pés e sem apoio, que é o momento em que ela está apta a pedalar. “Precisa dessa coordenação”, pontua. Tem menino que pedala com 3 anos? “Sim, tem”, a especialista responde. “É igual falar, tem criança que fala um pouco antes. Mas estamos falando da média”, pondera. Para ela, o que é importante os pais terem em mente é ‘não querer passar o carro na frente dos bois. “Do ponto de vista neurológico antes dos 4 anos uma criança não está apta para pedalar”, afirma.
Outro ponto observado pela especialista é sobre o risco de acidente. Ela reforça que não existe trabalho científico que mostra que a ‘balance bike’ diminui o risco de quedas e tombos. No entanto, segundo ela, “como a criança controla essa bicicleta com os pés – ao contrário da outra que os pés estariam apoiados no pedal – parece que aumenta o controle de frear e diminui a chance de a bicicleta pegar velocidade sem controle”. A médica reforça a necessidade de equipamentos de segurança para garantir a tranquilidade da brincadeira.
Bike de Flora é sucesso em BH
O pai de Flora conta que a filha começou a usar a ‘balance bike’ como se tivesse andando em pé. “Depois ela foi sentando, aprendendo a questão da direção – virava para um lado, depois para o outro – ganhando confiança. Em seguida vieram as passadas maiores e, posteriormente, começou a andar cada vez mais rápido. Ela já faz algumas descidas sem o pé no chão”, conta. O modelo da ‘balance bike’ da menina não tem freio e Ricardo diz que ela para o veículo com os próprios pés. “Quando tem uma descida que ela não tem confiança ela desce segurando a bicicleta no pé. Quando está segura, deixa embalar e vai. A decisão é 100% dela, no tempo dela, nunca interferi em nada”, diz. Já tem um ano que a belo-horizontina é dona de uma magrela.
O designer conta que descobriu o modelo sem pedal na internet. “Eu sou extremamente contra crianças que têm carrinho elétrico, é contra meus princípios, e queria oferecer um brinquedo que estimulasse a prática de atividade física. Vi a proposta do modelo sem pedal – bicicleta de treinamento que ajuda o ciclista a aprender direção e equilíbrio – e gostei”, relembra.
Flora usa a bicicleta em praças e parques da cidade. Por onde vai, segundo Lodi, desperta o interesse imediato não só das crianças, mas também dos pais de meninos e meninas que têm idade próxima da dela. “Querem saber por que não tem pedal, explico a proposta, perguntam onde comprei, o interesse continua e a conversa também”, conta. O designer diz que além de não ser fácil encontrar no Brasil, o valor aqui ainda é caro.
Veja vídeo de Flora e sua bike:
Raphaël, 2 anos: ‘quero pegar uma rampa’
Reconhecido pelos títulos conquistados em campeonatos brasileiros de Street BMX, Sérgio Sant´anna, mais conhecido como Serginho, já cortou todo o país em cima de duas rodas. Foram 17 anos como atleta profissional na modalidade e sua trajetória já lhe rendeu protagonismo em campanhas publicitárias e até homenagem de uma fábrica de bicicletas brasileira que intitulou um de seus modelos de quadro com o nome do atleta. Atualmente ele mora em Genebra, na Suíça, continua pedalando, mas sem focar em competições. Casado e pai de Raphaël, de 2 anos, optou pelo modelo sem pedal para o filho. Para ele, além de ser a maneira mais fácil de aprender o equilíbrio do veículo, a criança não se machuca. “A rodinha na bicicleta funciona quase como um andador. É uma falsa liberdade, a criança acha que está andando, mas quando tirar a rodinha, vai querer apoiar e vai cair. Sem rodinha, a criança precisa do equilíbrio. Pedalar é a impulsão que faz a gente andar. Na bicicleta sem pedal, a criança já sabe que se não colocar o pé no chão vai cair para o lado”, diz.
Serginho conta que o processo de aprendizagem do filho se deu muito rápido. “Ele ganhou na data do aniversário e no mesmo dia já saiu andando sozinho. Ele caminhava com a bicicleta no meio das pernas. Uma semana depois, já conseguia andar rápido. Nunca pedi a ele para levantar as perninhas, nunca forcei nada, eu sempre quis que ele aprendesse se fosse um desejo dele. Quatro meses depois já tirava o pé do chão. Ele já consegue andar reto e vai direto para bicicleta com pedal sem a rodinha”, diz. O pai de Raphaël conta que diariamente o filho dá uma volta pela manhã. “Às vezes, ele pega a bike, olha para mim e diz: ‘quero pegar uma rampa’. Nessas horas eu explico que ele ainda é pequeno para isso”, conta.
Sem pedal para adultos
Thiago Tiganá é voluntário do Bike Anjo BH, projeto onde ciclistas experientes ensinam gratuitamente as pessoas que querem aprender a pedalar nas ruas com segurança. Ele conta que a técnica de retirar os pedais da bicicleta é usada para ensinar adultos a aprenderem a usar o veículo. “Fazemos isso para que a pessoa se preocupe apenas como equilíbrio sobre a bike, sem se preocupar em pedalar. Propomos tirar um pé, depois outro, para ir sentindo a bicicleta. A gente sente que o aluno fica mais seguro, ele não tem que dividir a preocupação de se equilibrar e pedalar ao mesmo tempo”, afirma.
Ele explica que a estratégia foi adotada pelos voluntários do Bike Anjo São Paulo e incorporada por aqui. “Os resultados são ótimos”. Segundo Thiago, como as bicicletas usadas pela equipe de voluntários são dobráveis, é possível tanto retirar os pedais como dobrá-los. “Depois do treinamento de equilíbrio, voltamos os pedais à posição normal e temos resultados muito bons”, comenta.
O ciclista considera a ‘balance bike’ uma opção interessante para as crianças. “Acaba estimulando mais o desenvolvimento do equilíbrio delas”, afirma. Thiago diz que ainda não teve o prazer de ver uma criança em BH com esse modelo de bicicletinha. Mas a pequena Flora está por aí, com a sua magrela de madeira visitando parques e praças da capital mineira aos fins de semana. E eles ainda vão se esbarrar...
Um vídeo que que circula entre ciclistas na Internet, mostra a desenvoltura de uma criança em sua bicicleta sem pedal. Vale a pena!