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Nos homens, a doença tem sido apelidada de manorexia, uma junção de man, homem em inglês, e anorexia. Faltam dados oficiais no Brasil sobre quantos enfrentam o problema. Mas, de acordo com a psiquiatra Carla Bicca, da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em São Paulo, um em cada seis homens é acometido pelo problema, em diferentes graus. “Se pensarmos de uma forma mais abrangente, num cenário em que o diagnóstico muitas vezes não é feito em razão de o paciente não procurar ajuda médica, podemos ter um número maior de homens com o distúrbio alimentar”, ressalta.
A médica explica que, apesar de a doença ser caracterizada pela não vontade de comer, a fome é constante para os anoréxicos. “Há realmente uma recusa em se alimentar e o pensamento é de quanto mais magro, melhor. Por isso, a pessoa se olha no espelho e nunca se vê suficientemente magra. O homem encontra gordura onde não tem e, muitas vezes, apesar de estar demasiadamente magro, se vê com altíssimo peso, ou seja, há uma compulsão em emagrecer”, esclarece Carla Bicca.
Independemente do sexo, a dificuldade no diagnóstico da doença está na recusa da pessoa em aceitar que tem um problema. No caso do homem, a negação esbarra ainda na falsa certeza de que a anorexia só acomete as mulheres. Quando o diagnóstico é feito no início, o que não é muito comum, o homem anoréxico já perdeu pelo menos 15% do peso corporal. “É necessário que a pessoa admita que precisa de ajuda e procure profissionais capacitados. Isso porque quando há um deficit de nutrientes no organismo, começam a ocorrer fraquezas no corpo e batimentos cardíacos anômalos. Esses problemas afetam sobremaneira a vida do indivíduo”, alerta a psiquiatra.
Perfil
Segundo Fátima Vasconcellos, presidente da Associação Psiquiátrica do Rio de Janeiro (APERJ), os homens gays costumam ser acometidos mais pela doença. Mas a psiquiatra ressalta que o distúrbio alimentar não tem distinção com relação a orientação sexual. “No geral, o perfil do homem anoréxico é o mesmo do das mulheres. Pessoas de uma família que já apresenta transtornos alimentares. Boa parte sofre com efeitos sanfonas de emagrecer e engordar. E há históricos de problemas emocionais com perdas significativas ao longa da vida”, enumera a médica.
O bullying sofrido na infância e na adolescência também pode fazer parte da lista de fatores que desencadeiam o transtorno. “Meninos com obesidade infantil também podem partilhar desse problema. Com a vontade repentina de emagrecer rapidamente para evitar as situações de constrangimento entre os colegas, eles tomam decisões drásticas que podem leva à anorexia”, exemplifica.
Novos padrões
Também tida durante muito tempo como um assunto feminino, a moda entrou no universo masculino com todas as suas vantagens, suas preocupações e seus exageros. Nas passarelas e nas telas dos cinemas, por exemplo, os homens aparecem cada vez mais magros e com roupas apertadas, como a calça skinny e a alfaiataria superjusta. O link possível com a anorexia, segundo Vasconcellos, é de os homens tentarem, a qualquer custo, adotar esse tipo de roupa no dia a dia.
“Como muitos não se enquadram nesse tipo de corpo, exageram na dieta por contra própria, fazendo com que ela se torne uma porta de entrada para um distúrbio alimentar”, relaciona. A psiquiatra lembra que, há pouco tempo, o padrão de beleza masculino era ter o corpo superforte, o que também levou vários a colocarem a saúde em risco.
Em vez de exagerar na musculação ou até apelar para o uso de substâncias ilícitas, homens adotaram comportamentos que revelam uma relação perigosa com a comida. A nutricionista Joana Lucyk lista os principais: contar obsessivamente as calorias, saltar refeições, brincar com os alimentos no prato em vez de comê-los e esconder a comida para “comprovar” que se alimentou. “Esses fatores, na verdade, contribuem para baixos níveis de energia, o que provoca doenças frequentes, como alterações hormonais responsáveis por sintomas que vão do sono excessivo ao desinteresse sexual”, afirma.
Outra complicação perigosa do emagrecimento exagerado é que a autoconfiança costuma ir embora com os quilos. “Isso compromete a saúde mental, com casos de depressão, ansiedade e transtorno bipolar”, diz Vasconcellos. Por isso, o tratamento contra a anorexia envolve apoio terapêutico, às vezes, com o uso concomitante de antidepressivos, estabilizadores de humor ou antipsicoativos. A ajuda de outros profissionais de saúde para a recuperação do peso, o reequilíbrio da alimentação e a prática de atividades físicas também entram na batalha multidisciplinar contra o distúrbio.
Mais cedo
Um estudo publicado em novembro no Jornal da Associação Médica Americana (Jama) comprova que os homens são cada vez mais acometidos pelos distúrbios alimentares. Em uma investigação feita com 5.527 adolescentes nos Estados Unidos, pesquisadores do Hospital Infantil de Boston identificaram que 17,9% dos meninos eram extremamente preocupados com o peso e a condição física.