“Em 2013 ganhei pernas que permitirão que em 2014 eu corra atrás do que quero.” Mais do que uma simples noite que passa deixando para trás as últimas 24 horas, a virada do dia 31 de dezembro para 1º de janeiro encerra um ciclo que, para a bióloga Camilla Abrahão, de 29 anos, durou quase 14 anos. Com 146 quilos e um quadro de hipertensão e pré-diabetes, ela já sacrificou muitos sonhos e postergou outros tantos planos. Entre eles o de começar um mestrado em psicobiologia no Nordeste, parado na lista de desejos desde 2009.
“Torci o joelho esquerdo em 2000. Com isso, tive que abandonar todos os esportes que fazia. Como sempre tive tendência a engordar, foi a gota d'água. Com o tempo, ainda surgiu uma depressão e fui só engordando”, lembra. Mas a Camilla que começou 2013 definitivamente não é a mesma que se despede. Uma cirurgia bariátrica em março deste ano mudou os rumos de sua vida. Com 57 quilos a menos em nove meses, ela enxerga um horizonte de novas possibilidades e não vê a hora de começar a escrever uma história diferente nas páginas em branco que só o réveillon é capaz de proporcionar.
O sentimento de renovação é comum a todos que se propõem a fazer da data um verdadeiro ponto de partida rumo a caminhos desconhecidos e desafiadores. Depositar tantas expectativas em uma única noite tem explicação que vai além da emoção e do contágio de uma festa social. “Evolutivamente, o nosso cérebro é programado para responder ao novo. O hipotálamo, que é a área do prazer e da esperança, é ativado em situações como essa”, explica a doutora em neurociência e comportamento pela Universidade de São Paulo (USP) Caroline Alencar.
Novidade que reanima, injeta energia, revigora. Turbilhão de reações que funcionam como um empurrão que deve ser muito bem aproveitado. Passada a euforia, a área racional do cérebro volta a falar mais alto e, sem estímulos constantes, o hipotálamo recua. “A área de cumprimento de metas é outra. Trata-se do córtex pré-frontal. Por isso, tradicionalmente, programa-se muito, mas pouca coisa é feita”, reconhece Caroline Alencar, que também é neurocientista do Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães, em Belo Horizonte. Os passos devem ser dados um a um na direção de um objetivo maior. Daqui a dois dias, a oportunidade de recomeço será dada a todos. Cabe a cada um escolher o caminho a seguir.
Ao longo de 2013 a administradora Valéria Oliveira, de 51 anos, se dedicou a plantar os frutos que espera colher em 2014. Ela conta que, durante uma década, se recolheu em um verdadeiro casulo, que se resumia ao trabalho e à dedicação aos dois filhos. “Durante 10 anos, vivi para a família e para a realização profissional. Acabei ficando parada todo esse tempo”, afirma. A reclusão transformou Valéria em uma pessoa que ela nunca imaginou ser. “Era apática, parada, infeliz e introvertida”, descreve.
A mudança começou quando ela resolveu se abrir para um novo relacionamento, algo que antes nem sequer cogitava. “Foi aí que começou a guinada. Percebi que era hora de mudar. Que não queria mais ser aquela Valéria.” Disposta a tomar as rédeas de sua vida, ela trocou de emprego e investiu na autoestima. “Fiz uma plástica em outubro, que veio fechar com chave de ouro todo o processo pelo qual passei ao longo do ano”, afirma.
As mudanças no corpo tiveram reflexo profundo e revelaram uma mulher mais corajosa e confiante para fazer suas escolhas. Renovada por dentro e por fora, Valéria deposita grandes esperanças em 2014. “Quero um ano diferente. Quero conhecer pessoas e lugares e viver tudo aquilo que não vivi esse tempo todo. Estou aberta a novas possibilidades e descobri que sou capaz de fazer o que quiser”, garante.
Situações diversas, como o início do relacionamento amoroso de Valéria, estimulam provocações íntimas. “Pode ser um livro, um filme, uma fala ou uma cena cotidiana. Aquela experiência dá início a uma organização interna que impulsiona e dá coragem para que a pessoa tome iniciativa rumo à mudança. É uma força trazida pelo acontecimento”, explica a psicóloga Júlia Ramalho Pinto.
O réveillon é mais um desses momentos capazes de mexer com o conceito, as expectativas e mudar a visão das pessoas sobre a rotina. “Existem esses outros eventos bem marcados, como a passagem de ano, a segunda-feira para a dieta, uma formatura. São términos bem definidos que permitem balanços e dão início a uma fase de planejamento”, observa Júlia.
Se nenhum outro acontecimento foi capaz de dar o empurrão esperado, por que não aproveitar o novo ano anunciado pela queima de fogos para tomar as atitudes necessárias? Muitos se aproveitam dessa circunstância. Não é por acaso que a época é marcada pelo estabelecimento de planos e desejos. Mas grandes viradas, como a de Valéria e da bióloga Camilla Abrahão, requerem conquistas diárias e persistência para seguir o caminho proposto.
UM PASSO DE CADA VEZ “A área de prazer e recompensa do cérebro não funciona a longo prazo. Se em pouco tempo nada de realmente novo acontecer, todos aqueles desejos começam a ser descartados”, alerta Caroline Alencar, neurocientista do Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães. Para evitar que isso ocorra e que a euforia dê lugar à frustração, grandes metas devem ser fragmentadas em várias outros objetivos menores, realistas e fáceis de serem alcançados.
“A cada passo cumprido, a meta final é reforçada”, afirma a neurocientista. Para manter o constante estímulo ao hipotálamo, área que proporciona prazer e renova as esperanças, também é importante trabalhar o conceito de recompensa. “Toda vez que uma etapa for superada, se presenteie. Pode ser uma coisa simples, como ir a um restaurante, mas é preciso celebrar de alguma forma”, aconselha Caroline. Diante disso, o hipotálamo passa a produzir serotonina, substância responsável por causar a sensação de bem-estar, fundamental para renovar a vontade de atingir os objetivos finais.
NO CAMINHO CERTO Ciente disso, Camilla já estabeleceu metas para 2014. “Estou esperando a estabilização do peso para que possa ser submetida à cirurgia plástica para retirada do excesso de pele”, conta. Muito disciplinada, ela planeja se dedicar a esse objetivo durante o primeiro semestre do ano. Superada essa etapa, ela já programa o tão esperado mestrado em Natal, no Rio Grande do Norte. “São coisas que antes não pensava que seriam possíveis. Agora já está praticamente encaminhada minha ida para o Nordeste em 2015”, conta.
O doutorado virá na sequência e, com isso, Camilla prevê pelo menos sete anos fora da casa dos pais. “Até lá, 2014 será um ano de muito estudo. Vou aproveitar para conhecer a cidade onde devo morar e a estrutura do laboratório onde vou estudar”, antecipa. Planos que trazem novo brilho ao olhar de Camilla e revelam um novo universo que antes ela via passar pela janela do apartamento. “Sempre passei o ano-novo em casa. Mas já falei com a minha mãe que nesta virada não vou aceitar fazer a mesma coisa. Quero algo diferente”, diz com a segurança de quem não vê a hora de ganhar o mundo.
“Torci o joelho esquerdo em 2000. Com isso, tive que abandonar todos os esportes que fazia. Como sempre tive tendência a engordar, foi a gota d'água. Com o tempo, ainda surgiu uma depressão e fui só engordando”, lembra. Mas a Camilla que começou 2013 definitivamente não é a mesma que se despede. Uma cirurgia bariátrica em março deste ano mudou os rumos de sua vida. Com 57 quilos a menos em nove meses, ela enxerga um horizonte de novas possibilidades e não vê a hora de começar a escrever uma história diferente nas páginas em branco que só o réveillon é capaz de proporcionar.
O sentimento de renovação é comum a todos que se propõem a fazer da data um verdadeiro ponto de partida rumo a caminhos desconhecidos e desafiadores. Depositar tantas expectativas em uma única noite tem explicação que vai além da emoção e do contágio de uma festa social. “Evolutivamente, o nosso cérebro é programado para responder ao novo. O hipotálamo, que é a área do prazer e da esperança, é ativado em situações como essa”, explica a doutora em neurociência e comportamento pela Universidade de São Paulo (USP) Caroline Alencar.
Novidade que reanima, injeta energia, revigora. Turbilhão de reações que funcionam como um empurrão que deve ser muito bem aproveitado. Passada a euforia, a área racional do cérebro volta a falar mais alto e, sem estímulos constantes, o hipotálamo recua. “A área de cumprimento de metas é outra. Trata-se do córtex pré-frontal. Por isso, tradicionalmente, programa-se muito, mas pouca coisa é feita”, reconhece Caroline Alencar, que também é neurocientista do Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães, em Belo Horizonte. Os passos devem ser dados um a um na direção de um objetivo maior. Daqui a dois dias, a oportunidade de recomeço será dada a todos. Cabe a cada um escolher o caminho a seguir.
Ao longo de 2013 a administradora Valéria Oliveira, de 51 anos, se dedicou a plantar os frutos que espera colher em 2014. Ela conta que, durante uma década, se recolheu em um verdadeiro casulo, que se resumia ao trabalho e à dedicação aos dois filhos. “Durante 10 anos, vivi para a família e para a realização profissional. Acabei ficando parada todo esse tempo”, afirma. A reclusão transformou Valéria em uma pessoa que ela nunca imaginou ser. “Era apática, parada, infeliz e introvertida”, descreve.
A mudança começou quando ela resolveu se abrir para um novo relacionamento, algo que antes nem sequer cogitava. “Foi aí que começou a guinada. Percebi que era hora de mudar. Que não queria mais ser aquela Valéria.” Disposta a tomar as rédeas de sua vida, ela trocou de emprego e investiu na autoestima. “Fiz uma plástica em outubro, que veio fechar com chave de ouro todo o processo pelo qual passei ao longo do ano”, afirma.
As mudanças no corpo tiveram reflexo profundo e revelaram uma mulher mais corajosa e confiante para fazer suas escolhas. Renovada por dentro e por fora, Valéria deposita grandes esperanças em 2014. “Quero um ano diferente. Quero conhecer pessoas e lugares e viver tudo aquilo que não vivi esse tempo todo. Estou aberta a novas possibilidades e descobri que sou capaz de fazer o que quiser”, garante.
Situações diversas, como o início do relacionamento amoroso de Valéria, estimulam provocações íntimas. “Pode ser um livro, um filme, uma fala ou uma cena cotidiana. Aquela experiência dá início a uma organização interna que impulsiona e dá coragem para que a pessoa tome iniciativa rumo à mudança. É uma força trazida pelo acontecimento”, explica a psicóloga Júlia Ramalho Pinto.
O réveillon é mais um desses momentos capazes de mexer com o conceito, as expectativas e mudar a visão das pessoas sobre a rotina. “Existem esses outros eventos bem marcados, como a passagem de ano, a segunda-feira para a dieta, uma formatura. São términos bem definidos que permitem balanços e dão início a uma fase de planejamento”, observa Júlia.
Se nenhum outro acontecimento foi capaz de dar o empurrão esperado, por que não aproveitar o novo ano anunciado pela queima de fogos para tomar as atitudes necessárias? Muitos se aproveitam dessa circunstância. Não é por acaso que a época é marcada pelo estabelecimento de planos e desejos. Mas grandes viradas, como a de Valéria e da bióloga Camilla Abrahão, requerem conquistas diárias e persistência para seguir o caminho proposto.
UM PASSO DE CADA VEZ “A área de prazer e recompensa do cérebro não funciona a longo prazo. Se em pouco tempo nada de realmente novo acontecer, todos aqueles desejos começam a ser descartados”, alerta Caroline Alencar, neurocientista do Hospital de Olhos Dr. Ricardo Guimarães. Para evitar que isso ocorra e que a euforia dê lugar à frustração, grandes metas devem ser fragmentadas em várias outros objetivos menores, realistas e fáceis de serem alcançados.
“A cada passo cumprido, a meta final é reforçada”, afirma a neurocientista. Para manter o constante estímulo ao hipotálamo, área que proporciona prazer e renova as esperanças, também é importante trabalhar o conceito de recompensa. “Toda vez que uma etapa for superada, se presenteie. Pode ser uma coisa simples, como ir a um restaurante, mas é preciso celebrar de alguma forma”, aconselha Caroline. Diante disso, o hipotálamo passa a produzir serotonina, substância responsável por causar a sensação de bem-estar, fundamental para renovar a vontade de atingir os objetivos finais.
NO CAMINHO CERTO Ciente disso, Camilla já estabeleceu metas para 2014. “Estou esperando a estabilização do peso para que possa ser submetida à cirurgia plástica para retirada do excesso de pele”, conta. Muito disciplinada, ela planeja se dedicar a esse objetivo durante o primeiro semestre do ano. Superada essa etapa, ela já programa o tão esperado mestrado em Natal, no Rio Grande do Norte. “São coisas que antes não pensava que seriam possíveis. Agora já está praticamente encaminhada minha ida para o Nordeste em 2015”, conta.
O doutorado virá na sequência e, com isso, Camilla prevê pelo menos sete anos fora da casa dos pais. “Até lá, 2014 será um ano de muito estudo. Vou aproveitar para conhecer a cidade onde devo morar e a estrutura do laboratório onde vou estudar”, antecipa. Planos que trazem novo brilho ao olhar de Camilla e revelam um novo universo que antes ela via passar pela janela do apartamento. “Sempre passei o ano-novo em casa. Mas já falei com a minha mãe que nesta virada não vou aceitar fazer a mesma coisa. Quero algo diferente”, diz com a segurança de quem não vê a hora de ganhar o mundo.