Antes mal acompanhado do que só. O conhecido ditado se inverte quando o assunto são as leis da atração. Pelo menos foi o que concluiu uma dupla de pesquisadores da Universidade de San Diego, na Califórnia, que demonstrou a existência do chamado efeito cheerleader (líder de torcida, em inglês). O fenômeno, agora testado em laboratório, foi descrito pela primeira vez em uma obra sem nenhuma pretensão científica: um seriado cômico da televisão norte-americana. Em How I met your mother, o personagem mulherengo Barney Stinson, interpretado por Neil Patrick Harris, contesta os elogios rasgados que seus amigos dirigem a um grupo de seis moças em um bar. “Um grupo de mulheres parece muito atraente, mas somente em grupo, assim como as líderes de torcida. Elas parecem muito atraentes, mas, analisando cada uma individualmente, cães sarnentos”, rebate.
Os amigos, a princípio, não acreditam. Barney pede que observem as moças isoladamente, sem a interferência do grupo. Surgem na tela, então, closes de mulheres caolhas, bigodudas e banguelas. Entre elas, inclusive, está um homem vestido de mulher. Para o personagem de Harris, o efeito também pode ser facilmente intitulado de “o paradoxo da madrinha de casamento”, “a síndrome da garota da fraternidade” ou, por um breve período dos anos 1990, “a conspiração das Spice Girls”. Pois essa teoria aparentemente absurda foi testada e comprovada em cinco experimentos reais, cujos dados foram divulgados este mês na revista Psychological Science.
Para os autores do estudo, o efeito cheerleader é produzido por fatores cognitivos humanos. Ao observar um grupo de pessoas, o sistema visual calcula automaticamente representações do conjunto de rostos apresentados. Os membros individuais do grupo são uma tendência para que seja tirada uma “média” da aparência do conjunto. Essa média dos rostos seria mais atraente que os indivíduos separadamente, como se houvesse um equilíbrio entre as características físicas negativas e positivas — algo impossível de ser feito para apenas um indivíduo.
Os rostos medianos seriam mais atraentes porque o sistema visual criaria uma espécie de padrão que ignora algumas particularidades de cada pessoa, normalmente, as imperfeições. Para descrever esse fenômeno, um dos autores da pesquisa, Drew Walker, parafraseia o escritor russo Leon Tolstoi no início de uma de suas obras mais famosas, Anna Karenina: “Todas as pessoas bonitas se parecem, cada pessoa não atraente é não atraente à sua maneira”.
Avaliações
Walker e seu colega Edward Vul já suspeitavam que a atratividade de rostos médios, junto à tendência do ser humano de codificar grupos (de objetos ou de pessoas) como um conjunto, poderia levar ao efeito enunciado por Barney Stinson. Para testar a hipótese, mais de 130 alunos de graduação voluntários foram convidados a apontar o índice de atratividade de quase 100 rostos. Às vezes, a pessoa avaliada estava em um retrato de grupo e, em outras, era exibida sozinha (veja infografia).
Em todas as situações, os participantes consideraram as pessoas retratadas mais atraentes quando estavam em grupo. E o efeito se mostrou verdadeiro tanto para rostos femininos como masculinos. A união, no entanto, não opera grandes milagres: a diferença percentual conferida pelo benefício de ter o grupo aumenta a atratividade da pessoa de 49% para 51%. “O efeito cheerleader é definitivamente pequeno, mas alguns de nós precisamos de toda a ajuda que pudermos conseguir”, brinca Vul.
Algumas particularidades foram observadas. As imagens não precisavam ser de um retrato de grupo unido para obter esse efeito. Quando os participantes julgavam rostos individuais ou no meio de um mosaico de fotos do tipo 3x4, o fenômeno voltava a se repetir. Em geral, as avaliações com nove pessoas eram mais positivas comparadas aos grupos de quatro ou 16 indivíduos. “Se a média é mais atraente porque idiossincrasias pouco atraentes tendem a se misturar, então os indivíduos com características faciais complementares — uma pessoa com olhos estreitos e uma pessoa com os olhos arregalados, por exemplo — poderiam desfrutar de um maior impulso na atratividade do que grupos compostos por indivíduos que têm características físicas mais semelhantes”, imagina o pesquisador.
Contexto
Para o professor do Departamento de Psicologia do câmpus Bauru da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) Sandro Caramaschi, o estudo mostra a chamada avaliação contextual da atratividade, e o mais interessante é que ela vai contra o senso comum. Normalmente, imagina-se que colocar uma pessoa feia próxima a outras muito bonitas faria com que ela parecesse ainda mais desagradável. “Mas o que acontece é o contrário. A pessoa acaba sendo julgada no grupo como um todo. Como se quem avaliasse o contexto o enxergasse de forma mais homogênea”, diz.
Ele acredita que o contrário também aconteceria. Uma pessoa muito bonita junto a pessoas feias também pareceria menos elegante. “É o contrário do senso comum, e é nesse ponto que a ciência fica mais interessante. Esses resultados, inclusive, podem ser extrapolados, ultrapassando a esfera física.” Caramaschi descreve que um homem fotografado próximo a uma mulher muito atraente tende a ser visto como mais feliz, mais saudável, de melhor condição financeira e de maior escolaridade. Se sua acompanhante não estiver dentro dos padrões de beleza, por outro lado, ele pode ser enxergado como mais feio, mais baixo e mais pobre. “Chamamos isso de aura do acompanhamento. As pessoas acabam fazendo um julgamento geral.”
Na opinião da psicóloga e professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Renate Michel, estar sozinho acarreta uma série de reações corporais que também contribuem para uma certa perda de atratividade. Estar só em uma situação social deixaria o indivíduo mais tenso, com o corpo fechado, ombros encolhidos e inseguro. “Agora, se a mulher chega na festa com outras três amigas, ela empina o bumbum, estufa o peito, joga o cabelo. É outra atitude. Como se ela dissesse: ‘Eu estou atraente e estou podendo, porque, se ninguém me quiser, eu já estou com a minha turma e sou aceita’.”
"O efeito cheerleader é definitivamente pequeno, mas alguns de nós precisamos de toda a ajuda que pudermos conseguir"
Edward Vul, coautor do estudo