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De acordo com Aron José Pazin de Andrade, diretor do Centro de Engenharia em Assistência Circulatória do Instituto Dante Pazzanese, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já aprovou os experimentos com o coração artificial em seres humanos. O dispositivo já foi testado em bezerros, mas ainda sem o formato almejado pelos pesquisadores. O aparelho ficou fora do corpo do animal para que tivesse o funcionamento avaliado. Aspectos eletrônicos, como o risco de aquecimento, e o volume do sangue bombeado foram alguns dos itens avaliados. “Tivemos sucesso. Agora, selecionaremos candidatos que se enquadrem no perfil do aparelho para que possamos testá-lo. É algo que leva tempo pela dificuldade de encontrar pessoas que se adequem, mas é uma etapa importante e necessária para dar validade ao projeto”, destaca.
Uma decisão já tomada a partir dos resultados atingidos é a necessidade de diminuir o tamanho do dispositivo. “Como ele é implantado dentro do tórax ou do abdômen, pode comprimir órgãos como o diafragma, o pulmão e até o próprio coração. Daí, quanto menor, melhor”, explica Andrade. O protótipo tem o tamanho de uma laranja média e é formado por duas câmeras de bombeamento e quatro válvulas. “É uma bomba normal, feita com materiais que não agridem o organismo ao ter contato com o corpo. Tem um desenho especial justamente para isso. Caso contrário, pode gerar mais problemas aos pacientes”, diz José Roberto Cardoso, coordenador do projeto e diretor da Poli/USP.
O pesquisador destaca que o coração artificial não tem fios nem conexões atravessando a pele do paciente, o que reduz o risco de infecções. A recarga da bateria dele será feita por indução. “Dentro do corpo ficará uma bobina. Do lado de fora, teremos outra, que vai carregar a primeira por indução”, explica. A estimativa é de que o processo que garantirá o funcionamento ininterrupto do coração artificial seja feito diariamente e dure 40 minutos (veja infográfico).
“Esse aparelho diferencia-se por ser totalmente implantado, deixando, assim, o paciente que espera por um transplante em uma situação mais cômoda. Outra diferença é que tentaremos deixá-lo mais barato que os aparelhos disponíveis hoje, que são importados”, compara Cardoso. A intenção é de que o equipamento custe até R$ 10 mil. “Os americanos custam cerca de R$ 200 mil e são vendidos somente no exterior”, completa.
Demanda crescente
Para o cardiologista do laboratório Exame Rafael Munerato, o dispositivo criado pelos cientistas da USP tem potencial para amenizar um grave problema de saúde pública. O Ministério da Saúde estima que cerca de 200 pessoas estão na fila de transplante de coração no Brasil e que, anualmente, 300 mil morrem em decorrência de doenças cardiovasculares. “Hoje, tratamos doenças do coração com recursos melhores, mas isso não impede que futuramente haja complicações nesses pacientes, o que chamamos de cardiopatias. Acredito que, no futuro, o número de pessoas que poderá vir a precisar de um transplante aumente, agravando ainda mais essa espera na fila”, avalia.
Cardoso também explica que a fila caminha lentamente justamente devido à piora da situação dos pacientes. “Ela funciona seguindo a prioridade. As pessoas que têm o estado agravado passam na frente, o que dificulta para quem segue estável”, explica. “Algo que nos incomoda é ver pacientes na UTI aguardando por um órgão que nunca chega. A maior vantagem dessa pesquisa é que ela colocaria um coração interno nessas pessoas, que poderão tolerar a situação durante um prazo maior e em uma situação mais confortável.”
Hilton Chaves, professor adjunto da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), acredita que a pesquisa precisa ser mais aprofundada até que se comece a pensar no uso clínico do coração artificial. Mesmo assim, ele destaca a importância de engenheiros e médicos brasileiros estarem se dedicando ao tema. “O Brasil engatinhava nessa área e, agora, começa a produzir um produto que tenta ser validado. Outra vantagem é que, por ser colocado dentro do paciente, ele se diferencia dos outros. Mas ainda não foi testado em humanos, um passo importantíssimo e que precisará de bastante investimento.”
Segundo Cardoso, o Brasil tem vivido um aumento significativo de pesquisas científicas em engenharia biomédica. “É uma das áreas que mais cresceram recentemente. Não só em transplantes. Em outras aplicações, a engenharia biomédica tem um grande potencial de inovação e promete render frutos ao Brasil”, destaca. O desenvolvimento e a produção de próteses e de equipamentos tanto para o diagnóstico quanto para o tratamentos de doenças também são alvo de estudo de médicos e engenheiros.