No entanto, o especialista aponta um déficit enorme de cirurgiões plásticos que permita que a lei seja cumprida. “É um verdadeiro crime. Menos de 10% desses profissionais se dedicam à reconstrução da mama. Aos poucos, os próprios mastologistas estão se qualificando, mas é preciso formar mais médicos capacitados para essa tarefa”, declara.
João Henrique aponta a questão de mercado como a principal razão para essa falta de mão-de-obra. “O apelo mercadológico para a cirurgia estética é mais forte. Esses procedimentos estão no mercado particular. A reconstrução da mama está na medicina suplementar”, afirma. Além disso, o médico explica que o cirurgião plástico não sai da residência sabendo fazer a reconstrução. “Depois de se tornar um especialista, é necessário uma formação adicional. É uma cirurgia mais complexa, sujeita a complicações”, aponta.
Com a nova lei, desde que as condições da paciente sejam favoráveis, as duas cirurgias – retirada e reconstrução – são feitas em um só procedimento. Pode acontecer de a pele não ser suficiente para sustentar a prótese de silicone. Nesses casos, ela é inserida vazia e inflada pouco a pouco. Além do volume, a mulher pode perder também a aréola e o mamilo e essa seria uma outra etapa da cirurgia reparadora. Uma técnica ainda pouco conhecida, realizada fora de ambiente hospitalar e indolor, a micropigmentação paramédica é uma das alternativas que as pacientes têm quando há necessidade de reconstituição da aréola e do mamilo. João Henrique Penna Reis cita também outras técnicas (clique e leia), mas a
micropigmentação vem ganhando cada vez mais adeptas e é recomendada por médicos.
A costureira Soraya Pereira Cardoso Chaves, de 49 anos, e a comerciante Michelle Silveira Cristofori, de 37, tiveram câncer muito antes de essa lei ser sancionada e precisaram retirar uma das mamas. Como parte do tratamento de reconstrução optaram pela micropigmentação paramédica. “Não é tatuagem. O dermógrafo (aparelho usado para colorir a pele) tem metade da rotação de um equipamento de tatuagem e, por isso, não causa dor. Usamos pigmento mineral, glicerinado e hipoalergênico à base de óxido de ferro e de dióxido de titânio”, explica a técnica em micropigmentação Inajá Bessa. Soraya optou pelo procedimento estético, mas Michelle escolheu o enxerto com o tecido da virilha seguido da micropigmentação. “Por mais parecido que seja o tecido da virilha, o efeito nem sempre é satisfatório e muitos médicos encaminham as pacientes para mim”, fala Inajá.
Depoimentos
Soraya descobriu a doença há 13 anos e passou pela mastectomia radical de um dos seios. “As opções que eu tinha eram procedimentos invasivos, cirúrgicos e não me interessaram. Eu preferia ficar sem a aréola e o mamilo que passar por outro procedimento cirúrgico. Dez dias após a reconstituição, fiz a micropigmentação”, conta.
“É duradouro e não é absurdamente caro. De vez em quando tem que retocar porque dá diferença na tonalidade de uma aréola para outra. Fica muito perfeito, quem não sabe da doença não percebe”, afirma. A costureira, que é mãe de duas mulheres, uma de 23 e outra de 21, diz que está muito satisfeita e indica para quem lhe pergunta. “Como meu caso é de sucesso, de cura da doença, muita gente me procurou nesses 13 anos que se já se passaram. Sou muito bem resolvida e digo: ‘faça a micropigmentação porque não é agressivo’. Não tenho nada negativo para dizer”, conclui.
Michelle Silveira Cristofori relembra a situação vivida por ela. “Em 2007 tive o câncer e precisei retirar a mama direita. Não deu para preservar nada. Fiz a mastectomia e o médico já implantou a prótese. Três meses depois fiz a reconstrução da aréola e do bico. O cirurgião retirou tecido da virilha para fazer o enxerto”. A comerciante diz que achou o procedimento cirúrgico tranquilo e comenta: “não é dolorido igual ao da mastectomia. Com dois meses estava 100%, mas é preciso repouso e ter cuidado para o implante pegar”, observa. Como houve diferença de cor de uma mama para outra, o médico de Michelle recomendou a micropigmentação. “Ficou excelente. Meu marido, que é da área médica, elogiou muito o resultado”, conta.
Micropigmentação paramédica: o que é?
Inajá Bessa gosta de metáforas para explicar o ofício que realiza há 17 anos e resultou em clientes de várias partes do Brasil. “O meu trabalho nada mais é que um bordado na costura do médico. Só entro onde a ciência termina, é um acabamento. Faço com a agulha o que um pintor faz com o pincel e gostaria que o SUS cobrisse esse trabalho”, declara.
Ela explica que a técnica consiste na implantação de pequenas quantidades de pigmento via agulha na derme (segunda camada da pele) que reagem com os melanócitos na camada basal e resulta na cor desejada na epiderme (camada externa da pele). Segundo a técnica em micropigmentação paramédica, o procedimento tem durabilidade de aproximadamente dois anos, mas por ser uma região que não sofre muito com a influência dos raios solares, a durabilidade é prolongada. Inajá conta que a maioria de suas pacientes são encaminhadas pelos próprios cirurgiões plásticos. É importante ressaltar que, com essa técnica, os mamilos não tem proeminência. O que o profissional faz é um trabalho de perspectiva que simula o efeito de projeção.
Reconstrução de aréolas e mamilos: opções cirúrgicas
O mastologista João Henrique Penna Reis aponta as alternativas para reconstrução de aréolas e mamilos. “Faz-se um enxerto com áreas do corpo em que a pele tem pigmentação parecida, a virilha ou a parte interna da coxa”, diz. O médico explica que para fazer o mamilo, os cirurgiões usam a pele dessas mesmas regiões. “Dobra-se a pele sobre ela própria, como se a pele abraçasse ela mesma para projetar o mamilo”, detalha. Uma outra opção em casos de mulheres com mamilos mais protuberantes é usar um deles – caso não seja necessária a dupla mastectomia – para transformá-lo em dois. O lóbulo da orelha também pode ser usado para reconstruir o ‘bico’ do seio.
Já existem também próteses de mamilo e aréolas. “Existem em várias cores e formatos diferentes e são autoadesivas. Essa opção é a menos usada, o produto é importado, chegou ao Brasil há pouco tempo e não é bem aceita. As mulheres estão buscando uma solução definitiva e mais próxima do natural possível”, comenta.
Penna observa, entretanto, que não é raro - em casos que as pacientes precisam esperar para fazer a reconstrução – elas desistirem da cirurgia. “Elas se acostumam e deixam de dar importância”, diz.
As técnicas cirúrgicas, segundo Penna, são procedimentos tranquilos. “É superficial, só há interferência na pele e em áreas pequenas. A mulher não toma anestesia geral, tem um índice muito baixo de complicações e não tem dor no pós-operatório”, esclarece. No entanto, é comum as mulheres mesclarem o enxerto com a micropigmentação paramédica porque a pele passa por um sofrimento até o local começar a nutrir essa pele transplantada. “Ela despigmenta, fica mais clara e a micropigmentação pode ser necessária para dar cor”, pontua.