Os benefícios da interação podem ser vários. Segundo a psicóloga Cristina Brisolara, entretanto, o principal seria o fato de que o afeto criado pela relação permite que a criança desenvolva aspectos emocionais e saiba também se portar melhor socialmente. “A maior contribuição está no convívio emocional e social da criança. Um animal doméstico atua sempre como uma importante ferramenta para os exercícios afetivos”, explica.
Além disso, o contato com os animais também traz maior resistência para o organismo infantil. Algumas alergias, por exemplo, podem ser combatidas por agentes de defesa que se desenvolvem devido ao convívio com os bichos. “O contato com os pets desde os primeiros meses de vida propicia uma série de experiências imunológicas, ajudando a criança a desenvolver capacidades de defesa contra agentes variados”, afirma a doutora em psicologia e médica-veterinária Ceres Faraco. Para garantir esses benefícios, no entanto, é preciso, segundo a especialista, que os animais vivam em boas condições físicas e de higiene.
Paixão
Quando João Guilherme, 10 anos, nasceu, o contato da família com animais já existia. Anos antes, os pais haviam comprado uma cachorra para a filha mais velha, Marianna, pensando em desenvolver o gosto e o apego dela pelos bichos. No entanto, de todos familiares, o garoto foi o que mais se afeiçoou aos bichos. “Bem cedo, ele se adaptou bem e acabou sendo o que mais gosta deles em casa”, conta a mãe, Andrea Victor, 51 anos, servidora pública. Hoje, são três: a porquinha-da-índia Marcela, a hamster Jadiane e a cachorrinha Deby. E, pela casa, já passaram vários outros, de peixes a calopsitas. Segundo Andrea, todos são tratados como verdadeiros parentes. “É nosso cotidiano cuidar deles. Aqui, todos os vemos como parte da família.”
Divertir-se com eles, abraçá-los e dar carinho faz parte da rotina do garoto. “Não consigo imaginar como minha vida seria sem ter os animais”, diz João. Entretanto, também existe o momento para o cuidado. Apesar de os adultos se juntarem para não deixar faltar nada, o menino sabe que tem responsabilidades. “É uma responsabilidade compartilhada, todos cuidam, mas ele também. É um embrião para que um dia ele possa assumir, quem sabe, todos os cuidados”, explica a mãe.
Quando é momento de escolher um novo membro para a família, João Guilherme assume, espontaneamente, a obrigação de pesquisar qual será a raça e investigar preços. Depois da escolha, que é sempre por fêmeas, João dá o nome. Ele também consegue imaginar vantagens de ser um bichinho: “Eu acho que incentiva a cuidar mais do meio ambiente. Você pode aprender a ajudar os animais, a ter mais cuidados com eles.”
Andrea acredita que os benefícios, como o senso de responsabilidade que os animais trazem para as crianças, dependem muito da estrutura e das atitudes familiares. “Os animais ajudam, sim, mas é um processo longo e paulatino. O que dá sentido de fato é a criação dentro de casa. Por si só, o contato não gera necessariamente um compromisso.” Para Andrea, os bichos contribuíram para tornar João mais responsável justamente porque existe afeto. “Essa ideia de que o animal não é um objeto, é um ser vivo que depende de cuidados, gera essa responsabilidade, até porque ele mesmo quer ter o bicho e tem carinho por eles.” Além disso, a mãe acredita que o convívio desperta sentimentos positivos, como o amor pelos animais.
Critérios
Ceres Faraco explica que a escolha do animal depende das condições disponíveis para a criação. A família precisa ponderar a possibilidade que tem de abrigá-lo, pensar no espaço que ele ocupará, no tempo que será necessário para cuidar dele e analisar qual espécie se adequa melhor à rotina da casa. “Os fatores são a motivação familiar, o espaço, a disponibilidade de tempo, as características da vida familiar e a capacidade financeira de arcar com os custos.” Para a psicóloga Patricia Oguma, a afinidade da criança também é um fator que deve ser levado em conta. “Tudo vai depender do espaço e do interesse que a criança terá pelo bichinho. É válido perguntar para ela que animal gosta mais e qual gostaria ter. Assim, o vínculo é mais fácil.”
A presença dos animais pode ser um estímulo para o desenvolvimento dos pequenos. De acordo com Oguma, pesquisas mostram que as crianças com mais estímulos, sejam quais forem, se desenvolvem melhor cognitivamente. Por isso, a especialista explica que os animais são uma das maneiras de estimular e que não se pode dizer que crianças que não tenham convívio com eles poderão ter menos desenvolvimento. “O animal é uma ferramenta a mais, sendo um estímulo entre tantos outros que a criança possui.”
Aos 3 anos, Maria Eduarda, hoje com 10, ganhou o primeiro cachorro, um poodle. O pai, Kelson David, pedagogo de 35 anos, conta que esse foi o ponto inicial de uma paixão que a filha passou a ter pelos cães. A relação da menina com os animais de estimação se tornou tão forte que, hoje, ela pesquisa se há bichos que precisam de adoção e, sempre que encontra algum, vai logo pedir aos pais que o adotem. “Desde o primeiro cão, o afeto se estendeu e a fez se interessar por adoção”, conta Kelson. Como não é possível ter todos os cães que gostaria, Maria Eduarda se contenta em cuidar e dar afeto em casa a Troy, um cachorrinho da raça pug. O pai diz que a experiência possibilitou à filha ter uma relação emocional com os animais que se refletirá no futuro e no convívio com as pessoas. “Ela se abriu para a experiência, que, acredito, será levada para além dos animais”, afirma.
O pedagogo considera que o amadurecimento e a responsabilidade foram os principais benefícios que o convívio com os cães deram à filha. “Ela cuida deles como se fosse a mãe. É um amadurecimento muito grande, é como se aumentasse a noção de responsabilidade que ela tem.” O cuidado com o pequeno animal também aproxima a família, segundo Kelson. “Todo mundo se une para cuidar. Além disso, ela desenvolve um carinho e um amor ao próximo.”
Em muitos casos, a criança enxerga o animal como companheiro, amigo e até cúmplice de aventuras e descobertas. Segundo Patricia Oguma, por causa dessa proximidade, conceitos de sensibilidade, companheirismo e sociabilidade são desenvolvidos. “As crianças param de olhar apenas para si mesmas e precisam aprender a se importar com o outro”, explica.
Sinceridade
O comerciante Wilkerson Souza, 40 anos, conta que, quando nasceu a filha Luiza, 4, atribulações fizeram com que a família precisasse doar o cachorro que tinha. No entanto, ficou a vontade de deixar a pequena se aproximar de animais. “Com o passar do tempo, achamos importante que ela tivesse algum bichinho”, conta Wilkerson, que é, por formação, filósofo e teólogo. Há cerca de seis meses, uma tia ofereceu um cão da raça yorkshire, o Dug, para a menina, e os pais encontraram a oportunidade ideal.
Para Wilkerson, o contato com os animais faz as crianças identificarem conceitos da vida que serão importantes mais tarde. O comerciante acredita também que a presença dos bichos dá alegria à família. “Os animais têm facilidade de trazer alegria para a casa, principalmente para as crianças. Também, a relação com eles é sem a hipocrisia de muitas pessoas. Ou eles gostam ou não”, afirma. A satisfação que os animais demonstram com a chegada dos donos, por exemplo, é um ensinamento que Wilkerson espera que a filha possa aprender. “Não só as crianças, todos podemos aprender com os animais a ter mais alegria com a chegada do outro.”
“Os animais aceitam as pessoas como são, e isso permite uma interação muito rica. Bicho não tem preconceitos, é sincero. O diferencial nessa relação é que ela dispensa palavras e complicações”, afirma Patricia Oguma. Segundo a psicóloga, pode acontecer de o vínculo com um animal ser usado para substituir outras necessidades ou relações. No entanto, o problema, nesse caso, estaria mais relacionado à pessoa do que ao tipo de proximidade. “Trata-se de uma distorção que pode acontecer também em outras relações e atividades.”
Para saber mais...
Existe hora certa?
Uma pergunta comum quando se pensa na relação entre crianças e animais de estimação é se existe idade adequada para se ter o primeiro bicho. Não há um consenso entre especialistas, mas todos concordam que, independentemente da idade, a orientação e a supervisão dos pais são fundamentais. Segundo a psicóloga e médica veterinária Ceres Faraco, o ideal é que aconteça a interação desde o nascimento, se houver condições. “A convivência, de certa forma, já ocorre naturalmente, pois o universo infantil é repleto de animais. Em qualquer idade, ela proporcionará experiências inestimáveis.”
A psicóloga Cristina Brisolara acredita que a idade ideal é a partir dos 3 anos, porque, com essa idade, a criança já possui certa independência e é capaz de entender regras. Ela concorda, no entanto, que, com a supervisão dos pais, não existe problema. “Nada impede que ela já conviva com o animal doméstico antes disso, sempre de forma assistida e cuidadosa”, afirma.