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A dissertação de mestrado do pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), sob o título 'Degradação de cabelo causada por tensoativos: quantificação por meio da análise das soluções de lavagem por espectrofotometria UV-VIS', avalia os surfactantes (moléculas com atividade detergente responsáveis pela limpeza dos cabelos) e seu poder em provocar a perda de proteínas e de melanina, substâncias de grande importância para a manutenção dos fios. Essa fibra natural que recobre a cabeça é composta de diferentes camadas que costumam ser diretamente atingidas pelas substâncias danosas. Cutícula e córtex são as mais afetadas. A primeira é a parte mais externa do fio, enquanto a segunda reúne macrofibrilas de queratina, uma proteína fibrosa composta por aminoácidos.
A principal motivação para o estudo foi um pedido de uma indústria específica da área. “Uma empresa do setor de cuidados pessoais nos procurou para saber se era possível desenvolver uma metodologia mais prática para quantificar e comparar os danos aos cabelos gerados em longo prazo pelo uso de xampus com diferentes tensoativos”, conta Rafael Oliveira. Ele já havia realizado trabalhos de pesquisa com os fios e aceitou o desafio de se aprofundar no tema. “Meu estudo visou analisar e quantificar os danos gerados por diferentes substâncias tensoativas usadas em xampus”, diz.
O químico analisou 16 surfactantes. Sua metodologia consistiu em expor mechas de cabelo em frascos contendo cada um dos tensoativos por 96 horas. No fim desse período, o cientista observou o líquido de cada um dos frascos utilizando um espectrofotômetro, aparelho capaz de quantificar substâncias de acordo com a absorção de luz característica dela. A partir de tal leitura, foi possível ter noção da extensão dos danos aos cabelos provocados por cada produto.
“Para quantificar o grau de degradação de um tensoativo, uma amostra de cabelo castanho escuro foi colocada em contato com uma solução da substância e deixada por um longo tempo a 38ºC, que é a temperatura média da água do banho”, diz o pesquisador. Contudo, Oliveira ressalta que o tempo prolongado de contato dos cabelos com os surfactantes procurou igualar-se a um resultado cumulativo, que extrapolasse os efeitos dos tensoativos na fibra capilar. Para detectar o quão degradante era a ação de cada substância, partiu-se da medida quantitativa de cor na solução do tensoativo com o qual o cabelo estava em contato.
Nos resultados, Rafael observou que “os tensoativos que mais agridem os cabelos são os aniônicos, entre eles o lauril éter sulfato de sódio, que está presente na maioria das formulações de xampu do mercado, independentemente do valor do produto”. A pesquisa concluiu que todos os surfactantes causam danos aos cabelos (uns mais e outros menos), provocando ressecamento dos fios e tornando-os mais quebradiços, principalmente nas pontas. “Como esperado, tanto os tensoativos quanto a água causam degradação da fibra capilar, desde a remoção de fragmentos de cutícula até a extração de melanina do córtex e de material proteico”, explica.
Em suas observações, o pesquisador notou um grau de degradação da fibra capilar que varia de acordo com o HLB dos tensoativos. “É um índice, chamado balança hidrófilo-lipófilo, presente em tensoativos aniônicos, que extraem em maior quantidade ou mais rapidamente as substâncias do cabelo (sujidades, gordura, poeira etc.). Já os tensoativos anfotéricos, que têm menor força detergente, degradam menos os fios”, acrescenta.
Os tensoativos não iônicos, segundo Oliveira, podem atingir o cabelo em intensidade igual ou até menor que a água. Mas são usados, geralmente, como agentes de consistência, em condicionadores capilares e cremes diversos.
Opções
Sendo assim, segundo Oliveira, a indústria poderá escolher os tensoativos menos danosos. “O método que desenvolvi pode ser incorporado às práticas de pesquisa dentro das empresas, possibilitando a avaliação e a quantificação de danos que as substâncias causam nos cabelos”, frisa. Ademais, surfactantes menos nocivos podem ser incluídos na formulação dos xampus, que não necessitarão de tamanha quantidade de componentes condicionadores, “que conferem o aspecto dito saudável do cabelo”.
Oliveira comenta que a indústria faz constantes estudos sobre a utilização de várias fórmulas em seus produtos. No entanto, como não há a publicação em periódicos científicos, na maioria das vezes não ocorre a validação das pesquisas por outros cientistas. “Em geral, as indústrias do setor cosmético requerem patentes das formulações para proteger as suas pesquisas em vez de publicá-las. Além disso, poucas empresas desse setor têm laboratórios de pesquisa científica alocados no Brasil”, afirma. Segundo o pesquisador, o desenvolvimento científico advém de laboratórios localizados nos Estados Unidos e na Europa, onde se encontram as matrizes das multinacionais.
Quanto à segurança, Rafael Oliveira garante que as indústrias não usam componentes que sejam prejudiciais à saúde dos usuários e seguem as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Apesar de causarem danos aos cabelos, os tensoativos utilizados são seguros à saúde, conforme as orientações da Anvisa. “Um bom xampu é aquele que melhora o aspecto dos cabelos do consumidor”, exalta o pesquisador da Unicamp.
Escolha pode ser mais segura
“Xampus são de grande importância na higiene pessoal, e a cada dia aumentam as ofertas desse tipo de produto, em função da descoberta de substâncias que podem torná-lo mais eficaz. Os consumidores, no entanto, se esquecem de perguntar sobre segurança. Independentemente das novas moléculas milagrosas que passam a habitar as fórmulas de xampus, desde sempre os tensoativos, ou detergentes, capazes de remover gorduras dos fios de cabelo e do couro cabeludo, sempre estiveram presentes nos produtos. Contudo, mesmo que essas substâncias sejam empregadas há muitos anos nos xampus, faltavam estudos que comprovassem sua segurança para os fios. O lado bom do estudo realizado na Unicamp é que preenche uma lacuna — talvez, agora, os fabricantes possam realizar alterações nas fórmulas dando preferência a tensoativos com um melhor perfil ou desenvolver produtos mais modernos. Além disso, os consumidores, com esses dados em mãos, poderão escolher os produtos com mais confiança. Contudo, vale frisar que substituições em fórmulas normalmente só são feitas depois de aprovação da Anvisa, órgão que no Brasil legisla sobre medicamentos e materiais de cuidados pessoais e higiene, entre outros.”
Pedro Azevedo, farmacêutico da Universidade