Parte 3 - No best-seller 'Deus, um delírio', Richard Dawkins, considerado o líder do pós-ateísmo e um dos intelectuais mais influentes do mundo, deixa claro que despreza a ideia de que qualquer forma de religião mereça respeito e compara a educação religiosa à crianças ao abuso infantil. Centro de várias polêmicas, recentemente o autor chegou a dizer, via Twitter, que uma das faculdades da Universidade de Cambridge tem mais ganhadores do Nobel que todo o mundo mulçumano.
Ao contrário dos ataques midiáticos que faz à religiosos, em seu livro, Dawkins traz argumentos para sua tese. Mesmo assim, ele provoca convictos e também aqueles que chama de religiosos "por inércia" - aqueles que desconhecem a possibilidade de crer em algo mais -, levando-os a pensar racionalmente e trocar sua crença na religião pela crença na ciência. Para ele, "espíritos livres como esses devem precisar só de um pequeno incentivo para se libertar de vez do vício da religião".
Nem todos os ateus são tão radicais quanto Dawkins, contudo, eles concordam que o método da ciência não combina com a crença em um ser sobrenatural. O médico e professor aposentado Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues, coordenador clínico do Centro de Referência em Neurofibromatose do Hospital das Clínicas da UFMG, é categórico ao dizer que considera a crença em qualquer religião ou Deus incompatível com a postura científica (leia o artigo que ele fez sobre o tema).
Considerando que tecnologia e postura científica são coisas diferentes, ele ressalta que é incoerente filosoficamente acreditar nas duas possibilidades. “Tecnologia é o que você faz com o conhecimento científico, é colocá-lo em prática. Ter uma postura científica é acreditar e confiar somente naquilo que você pode medir, comprovar ou que tenha uma base racional”, pontua. “O que acho incompatível é acreditar em qualquer coisa metafísica e todas as religiões têm perspectivas metafísicas, acreditando que existem inteligências não comprovadas materialmente”, explica.
Para ele, as teorias que unem ciência e fé são tentativas de se continuar sendo religioso e 'engolir' as demonstrações científicas. “É muito difícil conviver com a realidade que a ciência nos mostra”, comenta. A dificuldade de se achar o sentido da vida e das coisas também é, para ele, um dos motivos que tem levado mais pessoas a aderirem pontos de vista 'em cima do muro'.
“Quanto mais individualista nossa sociedade for, mais difícil fica de encarar esse medo da própria morte e do desconhecido. Entendo a dificuldade que as pessoas têm, mas isso não me faz abandonar a coerência que acho na outra proposta e continuo achando que as duas não são compatíveis”, ressalta.
Já o jornalista e mestre em teologia, Michelson Borges, apesar de firme defensor do criacionismo, argumenta que a prerrogativa é possível sim. Na opinião dele, a religião entra onde a ciência não vai. “Quem disse que a realidade se compõe apenas daquilo que podemos mensurar e que faz parte do chamado 'mundo natural'?”, questiona.
Para ele, o fato de muitos cientistas crerem em Deus mostra que o método científico é limitado no que diz respeito às questões relacionadas com o sobrenatural. “Se a ciência provasse por a mais b que Deus não existe, todos os cientistas seriam ateus. De igual modo, se provasse que Deus existe, todos os cientistas seriam crentes. Mas não é isso o que acontece, justamente porque a ciência, quando bem empregada, trabalha dentro de suas limitações óbvias”, afirma.
Leitura literal da Bíblia é ponto principal de polêmica
Um dos principais motivos de divergência é a leitura literal ou não da Bíblia. Borges considera que partes das escrituras devem ser vistas sim como metáforas e alegorias, contudo, ele sustenta que os livros também contém narrativas históricas factuais. O principal e mais polêmico é o livro de Gênesis, que relata a criação do mundo. Para a Teoria do Criacionismo, que surgiu em meados dos anos 1950 nos EUA, a leitura literal do texto dizendo que Deus criou o mundo em sete dias é a verdade sobre o surgimento da vida no planeta e a criação do universo.
Contudo, as provas científicas mostram o contrário. Na versão de criacionistas fundamentalistas, a Terra tem cerca de quatro mil anos de existência, enquanto que a ciência estima que nosso planeta tenha mais de 4,5 bilhões de anos.
Borges afirma que “a história da criação em Gênesis é um dos relatos factuais que alguns querem que seja mitológico”. “Mitologizar as narrativas bíblicas se tornou muito conveniente para aqueles que não querem se divorciar totalmente da religião ao mesmo tempo em que querem viver como bem entendem. Se a história da criação e da queda (pecado) se tratasse de um mito, toda a teologia bíblica seria jogada por terra”, ressalta.
Ignorância intelectual?
Ao contrário do senso comum que tem postulado muitos religiosos de 'ignorantes intelectuais', Luiz Oswaldo Rodrigues discorda da relação direta entre fé e ignorância. Para ele, o fato de uma pessoa acreditar e ter uma postura filosófica científica ou religiosa não tem nada a ver com a sua capacidade intelectual. “Tem a ver com estrutura da personalidade da pessoa, não do caráter dela. Minha impressão é de que a estrutura e criação é que faz a pessoa ter uma menor ansiedade diante da morte e do desconhecido”.
Já o mestre em teologia Michelson Borges acredita que ciência e fé podem estar caminhando para a intolerância total. Segundo ele, a culpa é da mídia, que estaria, cada vez mais, aplicando aos criacionistas o termo de fundamentalistas, o que para ele, se tornou grandemente pejorativo. “Esse estereótipo faz com as pessoas mal informadas vejam os criacionistas como pessoas de mente estreita e até perigosas”, afirma.
O argumento é de que em ambos os lados existem radicalismo e ignorância. “Não podemos tomar o todo pela parte. Há ateus, evolucionistas e religiosos educados, razoáveis e honestos. Esses deveriam lutar para promover o diálogo e o respeito. Só teríamos a ganhar com isso”, destaca.
Ao contrário dos ataques midiáticos que faz à religiosos, em seu livro, Dawkins traz argumentos para sua tese. Mesmo assim, ele provoca convictos e também aqueles que chama de religiosos "por inércia" - aqueles que desconhecem a possibilidade de crer em algo mais -, levando-os a pensar racionalmente e trocar sua crença na religião pela crença na ciência. Para ele, "espíritos livres como esses devem precisar só de um pequeno incentivo para se libertar de vez do vício da religião".
Nem todos os ateus são tão radicais quanto Dawkins, contudo, eles concordam que o método da ciência não combina com a crença em um ser sobrenatural. O médico e professor aposentado Luiz Oswaldo Carneiro Rodrigues, coordenador clínico do Centro de Referência em Neurofibromatose do Hospital das Clínicas da UFMG, é categórico ao dizer que considera a crença em qualquer religião ou Deus incompatível com a postura científica (leia o artigo que ele fez sobre o tema).
Leia a reportagem completa:
Parte 1 - A ciência matou Deus? Para muitos cientistas, a resposta é não
Parte 2 - Deus fez o Big Bang? Documentário defende a ideia de que ciência e fé podem coexistir
Parte 1 - A ciência matou Deus? Para muitos cientistas, a resposta é não
Parte 2 - Deus fez o Big Bang? Documentário defende a ideia de que ciência e fé podem coexistir
Considerando que tecnologia e postura científica são coisas diferentes, ele ressalta que é incoerente filosoficamente acreditar nas duas possibilidades. “Tecnologia é o que você faz com o conhecimento científico, é colocá-lo em prática. Ter uma postura científica é acreditar e confiar somente naquilo que você pode medir, comprovar ou que tenha uma base racional”, pontua. “O que acho incompatível é acreditar em qualquer coisa metafísica e todas as religiões têm perspectivas metafísicas, acreditando que existem inteligências não comprovadas materialmente”, explica.
Para ele, as teorias que unem ciência e fé são tentativas de se continuar sendo religioso e 'engolir' as demonstrações científicas. “É muito difícil conviver com a realidade que a ciência nos mostra”, comenta. A dificuldade de se achar o sentido da vida e das coisas também é, para ele, um dos motivos que tem levado mais pessoas a aderirem pontos de vista 'em cima do muro'.
“Quanto mais individualista nossa sociedade for, mais difícil fica de encarar esse medo da própria morte e do desconhecido. Entendo a dificuldade que as pessoas têm, mas isso não me faz abandonar a coerência que acho na outra proposta e continuo achando que as duas não são compatíveis”, ressalta.
Já o jornalista e mestre em teologia, Michelson Borges, apesar de firme defensor do criacionismo, argumenta que a prerrogativa é possível sim. Na opinião dele, a religião entra onde a ciência não vai. “Quem disse que a realidade se compõe apenas daquilo que podemos mensurar e que faz parte do chamado 'mundo natural'?”, questiona.
Para ele, o fato de muitos cientistas crerem em Deus mostra que o método científico é limitado no que diz respeito às questões relacionadas com o sobrenatural. “Se a ciência provasse por a mais b que Deus não existe, todos os cientistas seriam ateus. De igual modo, se provasse que Deus existe, todos os cientistas seriam crentes. Mas não é isso o que acontece, justamente porque a ciência, quando bem empregada, trabalha dentro de suas limitações óbvias”, afirma.
Leitura literal da Bíblia é ponto principal de polêmica
Um dos principais motivos de divergência é a leitura literal ou não da Bíblia. Borges considera que partes das escrituras devem ser vistas sim como metáforas e alegorias, contudo, ele sustenta que os livros também contém narrativas históricas factuais. O principal e mais polêmico é o livro de Gênesis, que relata a criação do mundo. Para a Teoria do Criacionismo, que surgiu em meados dos anos 1950 nos EUA, a leitura literal do texto dizendo que Deus criou o mundo em sete dias é a verdade sobre o surgimento da vida no planeta e a criação do universo.
Contudo, as provas científicas mostram o contrário. Na versão de criacionistas fundamentalistas, a Terra tem cerca de quatro mil anos de existência, enquanto que a ciência estima que nosso planeta tenha mais de 4,5 bilhões de anos.
Borges afirma que “a história da criação em Gênesis é um dos relatos factuais que alguns querem que seja mitológico”. “Mitologizar as narrativas bíblicas se tornou muito conveniente para aqueles que não querem se divorciar totalmente da religião ao mesmo tempo em que querem viver como bem entendem. Se a história da criação e da queda (pecado) se tratasse de um mito, toda a teologia bíblica seria jogada por terra”, ressalta.
Ignorância intelectual?
Ao contrário do senso comum que tem postulado muitos religiosos de 'ignorantes intelectuais', Luiz Oswaldo Rodrigues discorda da relação direta entre fé e ignorância. Para ele, o fato de uma pessoa acreditar e ter uma postura filosófica científica ou religiosa não tem nada a ver com a sua capacidade intelectual. “Tem a ver com estrutura da personalidade da pessoa, não do caráter dela. Minha impressão é de que a estrutura e criação é que faz a pessoa ter uma menor ansiedade diante da morte e do desconhecido”.
Já o mestre em teologia Michelson Borges acredita que ciência e fé podem estar caminhando para a intolerância total. Segundo ele, a culpa é da mídia, que estaria, cada vez mais, aplicando aos criacionistas o termo de fundamentalistas, o que para ele, se tornou grandemente pejorativo. “Esse estereótipo faz com as pessoas mal informadas vejam os criacionistas como pessoas de mente estreita e até perigosas”, afirma.
O argumento é de que em ambos os lados existem radicalismo e ignorância. “Não podemos tomar o todo pela parte. Há ateus, evolucionistas e religiosos educados, razoáveis e honestos. Esses deveriam lutar para promover o diálogo e o respeito. Só teríamos a ganhar com isso”, destaca.