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Gary Kobinger, um dos autores da pesquisa e professor da Universidade de Manitoba, no Canadá, conta que um estudo realizado pela mesma equipe de cientistas no ano passado embasou a ideia de usar os anticorpos. “Esse experimento mostrou que os primatas não humanos que se salvaram da exposição ao vírus mortal do ebola ao serem vacinados tinham altos níveis de anticorpos específicos, mas os não sobreviventes apresentavam níveis baixos, quase indetectáveis, dessa substância”, detalha. “Pensamos que seria possível usar esses anticorpos em uma terapia. Nós fizemos e deu certo.”
Para maximizar a defesa do organismo dos macacos, os pesquisadores também trataram as cobaias com um adenovírus — vírus criado em laboratório e utilizado geralmente como ferramenta para potencializar a produção de substâncias no corpo. Nesse caso, a equipe quis aumentar a quantidade de interferon alfa, uma citocina produzida pelo sistema imunológico.
As cobaias foram tratadas com as duas estratégias três dias após terem sido infectadas pelo Zaile ebolavírus, um dos subtipos mais letais do vírus ebola. Após a terapia, elas foram totalmente curadas da doença. Os pesquisadores acreditam que os anticorpos ajudaram a neutralizar o vírus e que a maior produção de interferon alfa conseguiu combater de forma mais eficaz a doença. Isso porque, ao tratar macacos somente com o adenovírus, o mesmo resultado não foi obtido.
“No momento, estamos tentando entender exatamente como os anticorpos agem no nível molecular, mas ainda não temos todos os detalhes. Sabemos que podem bloquear a entrada do vírus, que são células sensíveis, mas suspeitamos que exista pelo menos mais um mecanismo que interfira na replicação do ebola”, destaca Kobinger. Os resultados da pesquisa foram publicados na edição de hoje da revista Science Translational Medicine.
Estratégia certeira
Para Gustavo Menezes, professor de biologia celular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o grande destaque do estudo foi utilizar o adenovírus, que não produziu malefícios ao organismo dos macacos e ainda aumentou os níveis de interferon alfa. “Eles utilizam um vírus para combater outro, além das substâncias do próprio agente infeccioso. O resultado foi totalmente positivo, 100% dos macacos testados obtiveram uma total melhora e mantiveram esse estado mais de 20 dias após o tratamento, o que expressa a eficácia”, observa.
Outro ponto de destaque da pesquisa, segundo Menezes, foi tratar o vírus dias após a infecção das cobaias. “O ebola, muitas vezes, pode ser diagnosticado tardiamente. Existem casos em que as pessoas estão em casa com os sintomas, mas não sabem que têm a doença. Ter tratado esses animais três dias após a infecção mostra que, até mesmo depois do diagnóstico, seria possível dar fim ao vírus”, ressalta.
Stefan Cunha, infectologista da Escola Paulista de Medicina, destaca que o uso de um dos subtipos mais letais do ebola também mostra o sucesso do experimento. “Essa é uma das variações mais cruéis da doença. Curá-la no terceiro dia mostra a eficácia do tratamento.” Para ele, a terapia será importante principalmente para as regiões em que o vírus provoca mais vítimas. “Felizmente, o ebola possui poucos risco de provocar uma pandemia, já que o contágio de pessoa para pessoa é mais difícil de acontecer. Mas temos regiões na África com altos números de casos e a mortalidade chega a mais de 50% em alguns locais. Com um tratamento tão eficaz como esse, podemos ter a esperança de uma arma que combata essa doença com sucesso e reduza consideravelmente o número de mortes.”
Menezes acrescenta que a base da terapia tem sido abordada em tratamentos de outras doenças. O uso de anticorpos é utilizado, por exemplo, na terapia contra males não infecciosos, como a esclerose múltipla “Nesse caso, os remédios já são até vendidos na farmácia. Acredito que uma das maiores vantagens que podem surgir em tratamentos com essas substâncias é conseguir algo mais específico, ações que tratem a raiz dos problemas. Claro que ainda existem efeitos colaterais. Por isso, é necessário que os estudos continuem”, pondera.
Gary adianta que o próximo passo do grupo de cientistas será realizar testes com humanos — experimento programado para o início de 2015. Segundo ele, a equipe está bastante esperançosa com os resultados que serão alcançados. “A partir do fato de que podemos tratar os primatas não humanos e detectar o vírus no sangue de todos os animais, futuramente poderemos salvar todos eles de uma morte certa. Essa é uma possível cura da infecção do ebola”, aposta.
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Experimentos com nicotina
Em agosto deste ano, outra terapia também utilizou anticorpos para combater o ebola em macacos rhesus. As três substâncias foram retiradas da nicotina e resultaram em um coquetel terapêutico chamado MB-003. O trabalho é fruto do esforço de pesquisadores da Divisão de Virologia do Instituto de Doenças Infecciosas do Exército dos Estados Unido (USAMRIID) e foi detalhado na Science Translational Medicine. Com a intervenção, eles conseguiram curar 43% das cobaias infectadas pelo vírus dois dias após o contágio. A expectativa dos cientistas é de que a droga esteja disponível para uso clínico até 2018.