Casos de idosos, como Lásara, que aderiram ao mundo digital se tornam cada dia mais comuns. No Brasil, a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada neste ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostra que, de 2005 a 2011, houve um aumento de 222,3% no número de pessoas com mais de 50 anos que usam a internet. O que significa dizer que 5,6 milhões de idosos passaram a utilizar a web nesse período. Das faixas etárias analisadas, essa foi a que apresentou o maior crescimento. Mas, apesar do aumento, os idosos, segundo o IBGE, ainda são a camada que menos acessa a rede mundial de computadores: em 2011, os internautas representavam apenas 18,4% da população mais velha, contra, por exemplo, 74,1% das pessoas entre 15 e 17 anos.
A facilidade de acesso aos itens de informática — que se tornaram mais baratos nos últimos anos — pode ser uma das justificativas para o aumento do número de idosos usando computadores, tablets e smartphones para entrar na rede virtual. “Hoje, os itens de informática estão financeiramente acessíveis. Aliado a isso, os idosos passaram a ter contato com esses itens no dia a dia”, avalia Silvana Maria Affonso de Lara. Cientista da computação, Silvana é autora de uma tese de doutorado na Universidade de São Paulo (USP) que tratou dos entraves para o acesso dos mais velhos à informática e propôs modos de facilitá-lo.
Segundo a psicanalista e educadora de idosos Andréa Freire, outro fator que contribuiu para aumentar o uso da internet entre os mais velhos é o desejo do idoso de se integrar ao modo de vida da sociedade atual. “Isso acontece porque ele passa a acreditar mais em suas potencialidades, inclusive de aprendizado, e na capacidade de interagir com a tecnologia”, afirma.
As razões para o número de internautas idosos ainda ser menor do que o de outras faixas etárias são múltiplas, de acordo com a mestre em gerontologia e doutora em informática educacional Letícia Machado. A falta de informação sobre o assunto e de formação adequada para o uso do computador é uma delas. “Há ainda a falta de interesse, fatores econômicos e culturais e a ausência de políticas públicas educacionais para o público específico”, completa a especialista.
Lásara passou a dominar as ferramentas na base da tentativa e erro. “Meu filho me disse para perder o medo e ir mexendo até aprender”, conta. Hoje, a aposentada utiliza e-mail, redes sociais, conversa com amigos e parentes distantes e acredita que, assim, pode acompanhar melhor o crescimento de sobrinhos e netos que estão distantes. “Meu mundo se abriu. Eu percebi que poderia ter mais contato com as pessoas e também estar mais atenta, mais ligada”, comemora.
Andréa Freire destaca que o ganho cognitivo com a experiência envolve atenção, percepção, memória, raciocínio, imaginação, pensamento e linguagem. A internet e a tecnologia facilitam ainda a obtenção de conhecimentos que ajudam na interação com pessoas mais jovens, geralmente mais inseridas no ambiente virtual. “É uma via para que o idoso tenha acesso ao que hoje o mundo oferece, de se sentir dentro de uma realidade tão diferente daquela em que vivia na juventude”, explica psicanalista.
Na escola
A oferta maior de cursos pensados especialmente aos idosos também sinaliza que o contato dos mais velhos com o mundo virtual só tende a crescer. Esse sinal do mercado ajuda, inclusive, a quebrar as resistências. Até junho, o vendedor Vanderlei Fidelis, 60 anos, não sabia sequer “como colocar o computador na tomada”. Depois de ver um panfleto que anunciava aulas gratuitas de informática para a terceira idade, ele resolveu arriscar-se pelo mundo virtual. Mesmo com pouco tempo, Vanderlei garante que já está apto a realizar todas as atividades que lhe interessam no computador. “Sempre fui curioso, tinha muita vontade (de aprender) e achei a oportunidade certa”, conta.
Vanderlei acredita que é importante que sejam oferecidos mais cursos aos idosos e que eles sejam mais divulgados. “Assim como eu, muitas pessoas têm vontade de saber como utilizar a internet, o computador, e não têm oportunidades.” Ele, que hoje utiliza a internet para pesquisar e buscar novos conhecimentos, quer também trazer a informática para a vida profissional. “Muitos colegas vendedores usam, acredito que será muito útil profissionalmente para mim também”, afirma.
Especialista ressaltam a necessidade de que os professores estejam preparados para lidar com o público mais velho e entendam as especificidades que a passagem dos anos traz aos alunos. Uma abordagem cognitiva distinta, que leve em conta as dificuldades comuns aos idosos, e mais paciência são algumas das adaptações necessárias. “É preciso ter uma metodologia própria para esse público para que o aprendizado flua”, ressalta Andréa Freire.
Diminuindo as distâncias
Ter a possibilidade de comunicar-se com familiares distantes é uma razão forte pela qual idosos ingressam em cursos de informática ou buscam, por si sós, aprender a lidar com a web. “Em sua maioria, eles começam a interagir com a web quando percebem que podem usufruir desses benefícios”, explica a cientista da computação Silvana Maria Affonso de Lara.
Aos 60 anos, a aposentada Ana Nery resolveu que aprenderia a manejar um computador e a acessar a internet. A principal motivação de Ana era a vontade de se comunicar por meio de softwares de chamadas por vídeo com a filha e os netos que moram na Espanha. “Queria ter contato com ela, vê-la com os meus netos na webcam”, conta.
Ana saiu à procura de um curso gratuito de informática e, assim que descobriu, passou a frequentar as aulas. O encanto com a rede mundial de computadores tornou-se ainda maior assim que o curso começou, há três meses. “Logo na primeira aula, eu fiquei deslumbrada com o que o professor mostrava”, lembra. “Hoje, a pessoa que não está ligada à internet é considerada burra, vou aprendendo cada dia mais”, afirma a aposentada, que também usa o computador para fazer compras on-line.
Ana acredita que os mais velhos encontram um pouco mais de dificuldade para se adaptar às novas tecnologias e, por isso, o aprendizado tem de acontecer aos poucos. “Não fez parte da minha geração, por isso, nós, os mais velhos, temos mais dificuldades e vamos aprendendo devagar”, diz. A entrada no curso lhe possibilitou conhecer novas pessoas e fazer contatos com os colegas, além disso Ana diz que a mente se tornou mais ativa depois das aulas de informática. “Quando estou usando, não dá vontade de largar de jeito nenhum. É tão bom, quero continuar aprendendo sempre mais”, afirma.
Mesmo buscando um contato maior por meio do mundo virtual, a maioria dos idosos, ao contrário do que acontece com os mais jovens, tenta manter as relações fora do ambiente digital. O cuidado, segundo afirma a psicanalista Andréa Freire, é importante e deve ser estimulado. “Eles continuam a valorizar o contato pessoal, a presença física, o que é positivo, evitando que se afastem do convívio social e não privilegiando apenas a relação virtual”, avalia.
Aprender sempre
“Alguns idosos têm erroneamente a ideia de que a aprendizagem se restringe aos bancos escolares formais e que, ao envelhecer, a pessoa perde a capacidade de aprender algo novo. No entanto, sabe-se que a aprendizagem acontece ao longo da vida. Não há uma idade limite para aprender, incluindo as tecnologias de informação e de comunicação, que estão cada vez mais presentes e são indispensáveis para nossa rotina diária”
Letícia Machado, especialista em gerontologia e informática educacional