O trabalho liderado pela pesquisadora Deljanin Ilic avaliou os efeitos de ouvir a música favorita por 30 minutos, em todos os dias da semana, em 74 adultos. Eles foram separados em três grupos: um praticou treinos físicos (33), outro ouviu a música predileta (10) e um terceiro realizou as duas tarefas (31). O experimento durou três semanas. No início e no fim, foram medidos marcadores da função endotelial encontrados na circulação sanguínea, em especial, o óxido nítrico. Após as três semanas, os maiores aumentos foram registrados no grupo que realizou as duas estratégias simultaneamente. A equipe que apenas praticou atividades físicas teve índices mais altos que aquela que se concentrou na música favorita, apesar de a última também ter registrado benefícios.
Segundo Ilic, o treinamento físico já é conhecido por melhorar a função endotelial e é a pedra angular de um programa multifacetado de reabilitação cardiovascular. No entanto, pouco se sabe sobre o papel da música na reabilitação cardiovascular ou sobre os efeitos de ouvir o som favorito na função endotelial. “A combinação de música e treinamento físico levou ao melhor desempenho na função endotelial. Melhorias na função foram associadas com evolução significativa na capacidade de se exercitar.” Depois de três semanas, a capacidade de exercício aumentou em 39% no grupo com música e treinamento, em 29% nos participantes que apenas se exercitaram, e em 19% na última equipe.
“Os benefícios vasculares de saúde da música podem ser devido a endorfinas ou compostos parecidos com a endorfina que são liberados no cérebro quando ouvimos a música de que gostamos”, explica Ilic. Com os resultados, a pesquisadora acredita que ouvir a música favorita sem praticar atividades físicas é um comportamento que pode auxiliar na reabilitação de pacientes com doenças cardiovasculares. “Não há uma música 'ideal' para todos. A pessoa deve escolher aquela que aumenta as emoções positivas e a faça feliz e descontraída.”
O cardiologista Mário Borba, diretor científico do Grupo de Estudos de Espiritualidade em Medicina Cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia, concorda com os resultados. Segundo ele, a pesquisa é uma comprovação do que o som pode fazer pelo funcionamento do organismo humano. “Sabemos que pessoas que contemplam a espiritualidade, principalmente no Oriente, com sons, como um mantra, recebem uma influência benéfica bem marcada no organismo. O que ainda não sabemos é como isso acontece”, exemplifica. Essa associação, segundo Borba, já foi feita no Brasil por um cardiologista que analisou a influência da musicoterapia em unidades de dor toráxica de emergências de hospitais. “Ele também percebeu que não especificamente a música favorita do paciente, mas também uma mais relaxante interferem no comportamento sintomático do paciente.”
Infarto
Ao mesmo tempo em que a música pode melhorar a função cardíaca, o frio pode agravá-la. Os resultados apontados pela equipe liderada por Marc Claeys mostram que baixas temperaturas são, de longe, o gatilho ambiental mais importante para o risco de infarto agudo do miocárdio. Os investigadores do Hospital Universitário de Antwerp analisaram dados de pacientes atendidos por problema cardíaco em 32 centros de saúde belgas e que foram submetidos ao procedimento de angioplastia coronária — tratamento não cirúrgico de desobstrução das artérias coronárias — entre 2006 e 2009. As informações coletadas incluíam ainda informações sobre poluição do ar, fumaça preta, temperatura e umidade relativa.
Os resultados indicam que apenas a temperatura pode ser significativamente relacionada com a ocorrência de infartos. Eles calcularam que, para cada redução de 10% na temperatura mínima, houve um significativo aumento de 7% na incidência de eventos cardíacos. Os possíveis mecanismos que explicam o aumento do risco incluem a estimulação de receptores de frio na pele e no sistema nervoso simpático. Além disso, em condições de tempo frio, as concentrações plasmáticas de fatores de coagulação e a viscosidade do sangue aumentam, o que pode provocar a trombose. O volume de plasma, por outro lado, diminui.
“Para os pacientes de alto risco, as implicações clínicas dos nossos achados incluem evitar mudanças de temperatura fortes e usar roupas adequadamente quentes ao ar livre quando há quedas de temperatura”, alerta Marc Claeys, um dos autores do trabalho. Ele também ressaltou que a poluição do ar não teve impacto significativo no processo. O último resultado, no entanto, é diferente do encontrado pela equipe do cardiologista Luiz Antonio Machado César, da Universidade de São Paulo.
No estudo publicado em 2004 na revista Brazilian Journal of Medical and Biological Research, foram consideradas 12 mil mortes por infarto em São Paulo entre 1996 e 1998. Os resultados mostraram que, em dias com diferença média de 22ºC, o aumento é de 33% no risco de infarto. Isto é, no inverno, as chances praticamente triplicam. “O comportamento com relação ao frio é igual, pelo menos na análise que fizemos. A diferença é que, aqui, além do frio, mostramos que a poluição tem a sua força, menor que o frio, mas tem”, pondera Machado César. Segundo o pesquisador, é preciso considerar também que, na Bélgica, as taxas de poluição são menos expressivas do que em São Paulo. No Brasil, o peso da poluição foi de aproximadamente 10% no aumento do risco de infarto.
Machado César explica que o frio leva a gripes e resfriados, que causam inflamações. “Elas aumentam os processos inflamatórios que já existem e a aterosclerose — a doença que atinge o vaso sanguíneo e deposita colesterol — , que é uma inflamação.” O cardiologista descreve ainda que, quando há uma infecção — consequência comum da alta poluição —, também é desencadeada uma série de reações no organismo que terão reflexo nas placas das artérias coronárias. Elas ficam mais inflamadas e mais propensas a se romper. Uma das soluções já comprovadas, segundo ele, é a imunização anual contra a gripe. “Se você toma a vacina da influenza, a chance de ter uma infecção diminui”, explica.
Bons resultados em UTIs
“Já se sabe que a musicoterapia tem efeito de reduzir sedativos, fazendo com que o paciente se sinta melhor. Um trabalho sobre a função nos tecidos realmente ainda não havia sido estudado. Mas é de se imaginar que isso poderia acontecer porque, na verdade, a música libera substâncias que melhoram a função do organismo como um todo, diminuem a inflamação, melhoram a atividade nos vasos e a atividade cardíaca. Isso é algo que, cientificamente, poderia, sim, ser encontrado. É preciso ser um som que agrade. No nosso hospital, chegamos a fazer um trabalho em UTIs colocando música ambiente e tivemos um bom resultado. Era uma música mais tranquila, em um volume mais baixo. Na situação desse trabalho, é o som favorito.”
Fernanda Sampaio, cardiologista do Instituto Nacional de Cardiologia