Você colocaria sua filha na Escola de Princesas? Na última segunda-feira, o Saúde Plena publicou uma enquete para ouvir a opinião dos leitores sobre a matéria 'Fundada há apenas seis meses, Escola de Princesas tem alunas na fila de espera', da repórter do jornal Estado de Minas Laura Valente. No texto, a jornalista descreve o trabalho da empresa criada pela pedagoga Nathália de Mesquita em Uberlândia (MG).
Até a quinta-feira (29), às 12h, o resultado havia acumulado 443 votos, com 290 'não' (65,5%) e 153 'sim' (34,5%). Organizar o quarto e os objetos pessoais, fazer almoço, lavar roupa, costurar, manter uma geladeira limpa e funcional, noções de boas maneiras e etiquetas, entre outras tarefas do cotidiano, são lições oferecidas na instituição. A escola é exclusiva para meninas entre 4 e 15 anos, mas 80% das alunas têm entre 6 e 8.
Com mais de 12 mil curtidas no Facebook e centenas de comentários de homens, mulheres, pais, mães e pessoas de várias idades, a reportagem levantou uma polêmica cujo centro está na questão de gênero: por que só para meninas? Diante da polarização dos internautas em torno de temas como 'machismo', 'sexismo', 'padronização das funções da mulher na sociedade', mas também em torno de 'valores que todos devemos aprender', 'saber se virar sozinha é muito importante' e 'ensinar coisas úteis de forma lúdica', o Saúde Plena ouviu quatro especialistas e também a fundadora da 'Escola de Princesas' – que pretende abrir uma unidade em Belo Horizonte -, para fornecer mais elementos à discussão.
Na entrevista ao Saúde Plena, a pedagoga justifica a temática do empreendimento e diz que os meninos ganharão um projeto sigiloso - com outro tom - em breve. “O sonho de toda menina é ser princesa, isso é um fato. Já os meninos não necessariamente sonham em ser príncipes”, afirma. Mas, mesmo em Uberlândia, o empreendimento não é unanimidade. Um grupo de mulheres criou a página ‘Escola de Ogras’, denunciando o que elas consideram uma postura sexista e machista. Com mais de 1.300 curtidas (a Escola de Princesas tem 2.104) a página discute a questão do gênero e critica os valores propagados por Nathália.
As oito fundadoras da página Escola de Ogras explicam que elas são ‘um grupo de garotas que se indignou com a proposta pedagógica da Escola de Princesas. “Buscamos reforçar a ideia de que não existem princípios universais a todas as mulheres. Discutimos autoestima e padrões de beleza na infância, valores morais baseados em diferenças de gênero e dependência/independência, além das relações de autoridade suscitadas pelo tema. Nosso foco é, principalmente, a visualização de exemplos na sociedade, famílias e pessoas reais e felizes, que, se fossem vistas sob o ponto de vista de um conto de fadas, não seriam dignas de respeito”, definem.
O universo escolhido pela pedagoga Nathália de Mesquita também incomoda especialistas.
Maria de Fátima Boschi é psicóloga especialista em educação, professora da PUC Minas e integrante da diretoria do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais: “A ideia de princesa é, no mínimo, constrangedora. Até por que, as que existem na vida real não ocupam esse lugar de tarefas do cotidiano. Se as famílias dessas garotas têm esse tipo de expectativa em relação a elas, essa filhas vão ficar em um lugar complicado. Como elas vão lidar com o mundo real que exigem delas tantas outras coisas?”, questiona. “Não saber organizar um quarto não significa que uma menina não tenha futuro. Os homens provaram isso pra gente ao longo de todo esse tempo”, resume.
Para a psicóloga e professora adjunta do Departamento de Ciência Política da UFMG, Marlise Matos, a Escola de Princesas presta um desfavor à cidadania das mulheres e à habilidade de fazer uma escolha livre. “A democracia não é apenas um sistema de governo, ela está nas relações interpessoais. A escola reproduz formas de dominação que favorecem a violência doméstica, que perpetuam o raciocínio de que a vítima é a culpada, por 'não se dar o devido valor'. Daqui a pouco, além dos vestidinhos de princesa, poderemos propor o uso da burca”, aponta a coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem - UFMG).
Paulo Henrique de Queiroz Nogueira é professor da Faculdade de Educação da UFMG e afirma que o importante é questionar esse modelo. “ A educação não-sexista é tarefa para a vida inteira. As pessoas precisam se propor a escutar, a dialogar. Por que é algo tão temerário perder lugares naturalizados?”, provoca.
A psicanalista e psicopedagoga Cristina Silveira também não poupa críticas. Ela relaciona o caso da escola de Uberlândia a um 'complexo de cinderela' e ainda aponta questões sobre a estratégia de marketing aplicada. “Sabemos da importância dos contos de fadas para as crianças na elaboração dos conflitos, na construção da criatividade e de suas fantasias. No entanto, quando se utiliza a figura da princesa para transformá-la em foco de mercado bem aquecido e lucrativo, a situação é preocupante. Vivemos numa sociedade em que tudo parece ter sido mercantilizado, inclusive o universo infantil”, afirma a psicanalista
Até a quinta-feira (29), às 12h, o resultado havia acumulado 443 votos, com 290 'não' (65,5%) e 153 'sim' (34,5%). Organizar o quarto e os objetos pessoais, fazer almoço, lavar roupa, costurar, manter uma geladeira limpa e funcional, noções de boas maneiras e etiquetas, entre outras tarefas do cotidiano, são lições oferecidas na instituição. A escola é exclusiva para meninas entre 4 e 15 anos, mas 80% das alunas têm entre 6 e 8.
Com mais de 12 mil curtidas no Facebook e centenas de comentários de homens, mulheres, pais, mães e pessoas de várias idades, a reportagem levantou uma polêmica cujo centro está na questão de gênero: por que só para meninas? Diante da polarização dos internautas em torno de temas como 'machismo', 'sexismo', 'padronização das funções da mulher na sociedade', mas também em torno de 'valores que todos devemos aprender', 'saber se virar sozinha é muito importante' e 'ensinar coisas úteis de forma lúdica', o Saúde Plena ouviu quatro especialistas e também a fundadora da 'Escola de Princesas' – que pretende abrir uma unidade em Belo Horizonte -, para fornecer mais elementos à discussão.
Clique aqui para ler a entrevista com a criadora da Escola de Princesas
Na entrevista ao Saúde Plena, a pedagoga justifica a temática do empreendimento e diz que os meninos ganharão um projeto sigiloso - com outro tom - em breve. “O sonho de toda menina é ser princesa, isso é um fato. Já os meninos não necessariamente sonham em ser príncipes”, afirma. Mas, mesmo em Uberlândia, o empreendimento não é unanimidade. Um grupo de mulheres criou a página ‘Escola de Ogras’, denunciando o que elas consideram uma postura sexista e machista. Com mais de 1.300 curtidas (a Escola de Princesas tem 2.104) a página discute a questão do gênero e critica os valores propagados por Nathália.
As oito fundadoras da página Escola de Ogras explicam que elas são ‘um grupo de garotas que se indignou com a proposta pedagógica da Escola de Princesas. “Buscamos reforçar a ideia de que não existem princípios universais a todas as mulheres. Discutimos autoestima e padrões de beleza na infância, valores morais baseados em diferenças de gênero e dependência/independência, além das relações de autoridade suscitadas pelo tema. Nosso foco é, principalmente, a visualização de exemplos na sociedade, famílias e pessoas reais e felizes, que, se fossem vistas sob o ponto de vista de um conto de fadas, não seriam dignas de respeito”, definem.
O universo escolhido pela pedagoga Nathália de Mesquita também incomoda especialistas.
Maria de Fátima Boschi é psicóloga especialista em educação, professora da PUC Minas e integrante da diretoria do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais: “A ideia de princesa é, no mínimo, constrangedora. Até por que, as que existem na vida real não ocupam esse lugar de tarefas do cotidiano. Se as famílias dessas garotas têm esse tipo de expectativa em relação a elas, essa filhas vão ficar em um lugar complicado. Como elas vão lidar com o mundo real que exigem delas tantas outras coisas?”, questiona. “Não saber organizar um quarto não significa que uma menina não tenha futuro. Os homens provaram isso pra gente ao longo de todo esse tempo”, resume.
Para a psicóloga e professora adjunta do Departamento de Ciência Política da UFMG, Marlise Matos, a Escola de Princesas presta um desfavor à cidadania das mulheres e à habilidade de fazer uma escolha livre. “A democracia não é apenas um sistema de governo, ela está nas relações interpessoais. A escola reproduz formas de dominação que favorecem a violência doméstica, que perpetuam o raciocínio de que a vítima é a culpada, por 'não se dar o devido valor'. Daqui a pouco, além dos vestidinhos de princesa, poderemos propor o uso da burca”, aponta a coordenadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher (Nepem - UFMG).
Paulo Henrique de Queiroz Nogueira é professor da Faculdade de Educação da UFMG e afirma que o importante é questionar esse modelo. “ A educação não-sexista é tarefa para a vida inteira. As pessoas precisam se propor a escutar, a dialogar. Por que é algo tão temerário perder lugares naturalizados?”, provoca.
A psicanalista e psicopedagoga Cristina Silveira também não poupa críticas. Ela relaciona o caso da escola de Uberlândia a um 'complexo de cinderela' e ainda aponta questões sobre a estratégia de marketing aplicada. “Sabemos da importância dos contos de fadas para as crianças na elaboração dos conflitos, na construção da criatividade e de suas fantasias. No entanto, quando se utiliza a figura da princesa para transformá-la em foco de mercado bem aquecido e lucrativo, a situação é preocupante. Vivemos numa sociedade em que tudo parece ter sido mercantilizado, inclusive o universo infantil”, afirma a psicanalista