Dizem que o tarô, que ajuda a clarear o futuro e entender o presente, surgiu em meados do século 14 na Europa, mas ninguém sabe ao certo em qual país nasceu. O fato é que, mesmo depois de muitos anos, as cartas despertam curiosidade, pavor, medo e muita discussão. Em Minas Gerais, terra de moradores desconfiados, a prática sempre foi vista com pé atrás e, segundo quem estuda o tema, até com um certo preconceito. Mas, de alguns anos para cá, esse cenário vem mudando. Tarólogos comemoram que a procura por consultas tem aumentado expressivamente e até mesmo os homens, sempre dito os mais céticos, estão se rendendo aos encantos do baralho e entrando para a clientela e também para a profissão.
Prova desse despertar de Minas está no 3º Fórum Nacional de Tarô, que será realizado pela primeira vez em Belo Horizonte, em 10 de agosto. Voltado para profissionais mineiros, o encontro vai discutir as formas de estudo e consultas na área. “A ideia é trocar experiências. Hoje, o Ministério do Trabalho já reconhece a prática como ocupação profissional. Ainda não é regulamentada, mas já é um passo”, comemora o coordenador do fórum, tarólogo, astrólogo e escritor Ney Naiff, que já escreveu 18 livros sobre o tema. “O tarô tem diversas formas. Pode ser usado como autoconhecimento, terapia e também adivinhação. Afinal, sua origem é adivinhatória”, define.
INTERNET
Milenar, a técnica vem sofrendo adaptações ao longo do tempo. Uma delas, segundo os especialistas, é a tendência do século 21: são as consultas on-line. Muitos profissionais estão atendendo seus clientes por meio da internet. “O futuro do tarô pode estar na plataforma digital. São muitas as pessoas que passaram a usar o meio para ajudar outras com relação ao autoconhecimento e orientação espiritual. Tem dado certo e é muito positivo”, garante Ney.
On-line ou presencial, o que há de mistério nessa prática? Como se pode usá-la? É terapia, adivinhação ou autoconhecimento? O Bem Viver conversou com tarólogos mineiros e acompanhou consultas de duas mulheres. Será que as cartas não mentem jamais?
Respostas do inconsciente
Os tarólogos acreditam que a escolha das cartas revela o que as pessoas querem saber. Recentemente, os profissionais aderiram a novos usos, como o tarô virtual
Saber do futuro por meio do tarô jamais convenceu Mariana Caldeira, de 21 anos. O mesmo pé atrás tinha Jéssica Saliba Sampaio, de 19. Mas, mesmo assim, as duas toparam o desafio de perguntar às cartas o que esperar e qual decisão tomar “sobre o amanhã”. Mariana optou por saber do seu lado profissional. Jéssica, do amoroso. Pelas interpretações dos tarólogos Luciene Ferreira e Yub Miranda, as respostas foram dadas. As jovens saíram das consultas impressionadas com o que ouviram. “Constatei o que estava pensando e não dei muitas dicas aos dois”, contou Jéssica, abismada com o que soube. Para os profissionais, não houve nada de mais, apenas o trabalho de interpretar o que o inconsciente das duas apontava. “O inconsciente é quase uma entidade que mora dentro de nós”, resumiu Luciene.
São 78 cartas chamadas arcanos. Cada uma traz um significado, que pode ter várias interpretações. “Os arcanos revelam os mistérios da vida”, afirma Luciene. Há vários métodos e formas de fazer a leitura do baralho. O corte das cartas, de acordo com a profissional, deve ser feito com a mão esquerda. Dessa maneira, já se ativa o inconsciente. Mas isso não é regra dentro do tarô. “O mais importante é a escolha das cartas. É isso que vai revelar o que é perguntado”, comenta o tarólogo, astrólogo e escritor Ney Naiff. Nas consultas acompanhadas pelo Bem Viver, as consulentes, assim chamados aqueles que procuram o serviço, disseram um pouco sobre o que queriam saber e cortaram o baralho com a mão esquerda. Mariana, como havia abandonado o curso de direito para fazer comunicação, quis saber das cartas se estava mesmo no caminho certo.
Yub e Luciene, que trabalham separados, fizeram juntos a análise dos arcanos escolhidos pela universitária. Pela interpretação do tarô, a jovem fez uma boa escolha, mas terá desafios. “Estou menos cética, achei que muitas coisas que disseram correspondem à minha realidade. Outras coisas não”, analisou Mariana. Já Jéssica, que gostaria de tomar uma decisão sobre um relacionamento amoroso, gostou do que soube. “Estou abismada. Tudo o que disseram corresponde ao que vivo. À medida que foram interpretando as cartas, parecia que estavam contando a minha história. O resultado me deixou mais segura para tomar uma decisão”, assegurou. Como a prática é uma questão de interpretação, de acordo com os tarólogos, a leitura é um diálogo. “Quanto mais se diz sobre o que quer saber, melhor será a interpretação”, diz Luciene.
Por isso, as duas consulentes falaram um pouco da sua história antes de selecionarem as cartas. Para cada área, o baralho é distribuído de uma forma. As interpretações, de acordo com Yub e Luciene, são para os próximos três meses, mas há tarólogos que trabalham com a validade de seis meses. O prazo, de curto tempo, é baseado no livre arbítrio, pois os caminhos podem se alterar de acordo com a mudança de postura de cada um. “Muitas coisas não estão predeterminadas. A pessoa está construindo seu destino”, explica Ney Naff, dizendo que, quando interpretado por bons profissionais, o resultado tem 100% de segurança. “Em qualquer área há pessoas picaretas. É preciso procurar os preparados, que estudam e se dedicam `à profissão”, aconselha.
NOVOS RUMOS
Durante muitos anos, acreditou-se que a leitura dos baralhos era ligada à adivinhação. Porém, com os novos tempos e estudos, os tarólogos foram adaptando a técnica aos anseios da sociedade. Um desses novos usos é o tarô terapêutico, no qual se procura a transformação do ser humano, por meio do autoconhecimento. Cada vez mais profissionais têm feito esse tipo de serviço. Luciene é uma delas. “Fiz um jogo específico, voltado para o autoconhecimento. São 15 sessões, em que vamos interpretando as cartas e as pessoas vão vivenciando os arcanos. Há grandes mudanças para quem passa por isso”, garante.
Outra adaptação para a atualidade é a leitura do baralho no meio virtual. São muitas as pessoas que hoje usam até as redes sociais para saber do “amanhã”. Yub optou pelo caminho digital. Apesar de atender presencialmente, ele conta que seu público maior está na rede. Formado em filosofia, ele se sentiu atraído pelo tarô, “porque sempre quis entender um pouco mais do ser humano”. Com clientes que moram fora do país, Yub cobra até R$ 150 por uma consulta, o que dá direito a três perguntas. “Não existe misticismo e nem está ligado a religião. O tarô é uma revelação por meio das cartas. Ele nos ajuda a seguir por determinados caminhos e o prepara para o inevitável”, conclui Luciene.
PERSONAGEM DA NOTÍCIA
Enfrentando os medos
Ludmila Lima - professora de inglês do Instituto Cultural Brasil-Estados Unidos
Ludmila Lima sempre se interessou pelo universo do oráculo. Começou a estudar o tarô. “Sempre ia a cartomantes e via, claramente, aquelas que sabiam o que diziam e outras que eram picaretas. Com o passar do tempo, e muito estudo, passei a fazer a leitura das cartas para meus amigos”, conta. Depois, Ludmila fez um curso e descobriu que o tarô envolve até mesmo psicologia para as análises do baralho. “E descobri com a Luciene Ferreira a terapia do conhecimento com as cartas. Foi fantástico. Fui me descobrindo e me redescobrindo. Há uma mistura de hipnose e reiki. Aprendi a me defrontar com meus medos e correr para a vida de peito aberto”, garante.
ANÁLISE DA NOTÍCIA
Diferentes interpretações
Luciane Evans
A primeira ideia que passa na mente de quem senta à frente de um tarólogo é o medo de as cartas mostrarem aspectos ruins da vida. Tive esse temor. Só topei passar pela experiência porque soube que as previsões seriam para um prazo de três meses. Durante a consulta, os profissionais acertaram muitas coisas e erraram outras também. Talvez porque tenha evitado ao máximo dar muitas informações sobre o que queria saber. À medida que dizia mais, novas interpretações surgiam e aquelas iniciais iam mudando. Foi estranho, curioso e interessante. Senti que se tratava mais de autoconhecimento do que adivinhação.