“A ideia de testar a empatia na infância se baseou em outros estudos infantis. E o método é relativamente estabelecido, mas o conceito empatia em crianças pré-verbais é muito novo”, destaca Yasuhiro Kanakogi, um dos responsáveis pelo estudo, publicado recentemente na revista Plos One. Os autores acreditam que os resultados podem ajudar a compreender melhor como as relações e o caráter se formam em humanos.
Os testes foram divididos em duas partes. Na primeira, as crianças viram um vídeo enquanto estavam sentadas no colo do pai ou da mãe. O filme mostrava uma animação em que figuras geométricas interagiam: uma pequena bola azul batia diversas vezes em um quadrado amarelo. Após assistir ao vídeo, os bebês eram levados para uma sala, na qual havia uma bola azul e um quadrado amarelo sobre uma mesa. Os pesquisadores notaram, então, que as crianças sempre optavam pelo quadrado (vítima da situação).
“Nessa fase, mostramos que, comportamentalmente, as crianças preferiam as vítimas. No entanto, era possível que elas não tivessem agido por um sentimento de empatia, mas por um desejo de evitar o agressor”, conta Kanakogi. Para tirar essa dúvida e dar mais validade ao estudo, os pesquisadores partiram para um segundo experimento, no qual um vídeo semelhante era exibido a outros bebês, mas, nele, além da bola e do quadrado, um cilindro vermelho aparecia na imagem. A terceira peça mantinha uma posição neutra na animação: não interagia com os demais objetos, apenas se movimentava pela cena. Quando iam para a outra sala, os bebês participantes da segunda parte da pesquisa podiam escolher entre os três objetos. O quadrado que recebia as pancadas da bola foi novamente o preferido.
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A equipe de cientistas, embora tenha ficado satisfeita com o experimento, pretende tornar a pesquisa mais abrangente, e fazer com que ela traga mais pontos importantes para debate, com pessoas mais velhas. “ Estamos planejando analisar a resposta de adultos e as diferenças culturais, para investigar os efeitos da sociedade ou da experiência envolvidos nas características da empatia”, declara Kanakogi.
Inovação
O estudo feito pelos japoneses se diferencia principalmente pela maneira como foi feito, avalia a psicóloga Júlia Zenni, da Secretaria de Saúde de Brasília. “Um ponto importante é a maneira como eles testaram as crianças, utilizando formas geométricas, o que é novo e interessante. Assim, você não expõe as crianças a cenas violentas”, destaca a especialista.
Segundo a psicóloga, estudos que tratam de empatia são importantes para a medicina. “Pelo fato de testar essa relação entre as crianças e suas preferências, podemos tratar não só da empatia mas também de outras características importantes, como o apego e os vínculos nas fases iniciais da vida, que fazem parte até da formação de caráter do ser humano”, destaca Zenni.
Ela também frisa que novas informações nessa área podem ajudar no diagnóstico médico. “Trabalho em um projeto que busca identificar sinais de autismo em crianças recém-nascidas, de até 3 meses de idade, e isso é muito difícil de ser feito. Com pesquisas como essas, podemos nos orientar melhor e começar a tratar desde cedo problemas de saúde.”
Maria Isabel Pedrosa, psicóloga e professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), acredita que o método utilizado pelos japoneses é bastante ousado, mas ainda assim possui resultados interessantes. “Utilizar formas geométricas, na minha opinião, dificulta um pouco a interpretação de identificação, mas, mesmo assim, esses resultados mostram indícios de pesquisas que já foram feitas com bebês mais velhos e seguem uma linha de percepção que já tínhamos sobre a formação das crianças. Por exemplo, sabemos que no terceiro dia de vida, elas já distinguem o cheiro da mãe”, destaca a pesquisadora.
Complexidade
A formação da personalidade infantil ainda guarda uma série de mistérios para os especialistas, o que justifica os repetidos estudos. Análises recentes mostram que o quadro pode ser bastante complexo. Por exemplo, uma pesquisa publicada na revista Psychological Science em março passado, feita por cientistas americanos, mostrou que crianças preferem indivíduos que se parecem com elas, mesmo que depois eles ajam de forma condenável.
No experimento, pesquisadores das universidades de Yale e Columbia fizeram testes com crianças de 9 a 14 meses. Neles, os bebês eram apresentados a fantoches, sendo que alguns demonstravam gostar das mesmas coisas que os pequenos. Depois, mesmo que os bonecos com quem as crianças tinham alguma afinidade fizessem algo errado, elas continuavam aprovando suas ações.
Para Isabel Pedrosa, trabalhos assim indicam que, desde cedo, o ser humano segue características sociais, que vão guiá-lo pelo resto da vida. “Quando nascemos, já somos envolvidos por esses estímulos sociais. Uma criança só é imatura do ponto de vista de capacidades motoras, mas está muito bem equipada para detectar sinais sociais, o que é muito interessante e compreensível, já que essa característica é vital para nossa sobrevivência”, analisa a especialista.