Ele já coordenou o Setor de Epidemiologia do Instituto Ludwig em São Paulo e fala com segurança sobre a realidade do Brasil em relação à pesquisa científica e adoção de programas de prevenção de câncer. No currículo de Franco está também passagens pelo Centro de Controle de Doenças (CDC), em Atlanta; pela Agência Internacional de Pesquisas sobre o Câncer (IARC), em Lyon, e pelo Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos (NCI).
De Montreal, o especialista conversou com o Saúde Plena e não se furtou em criticar alguns protocolos adotados por aqui. Entre suas declarações mais contundentes está sua visão sobre o exame preventivo contra o câncer de próstata. “A prevenção não é mais recomendada como prática de saúde pública”. Franco se refere ao teste de PSA - um exame de sangue para detecção precoce desse tipo de câncer - e ao exame de toque. “Não divulgamos mais o mantra da detecção precoce”, reforça. Segundo ele, é controverso se essa descoberta é boa, já que o câncer de próstata é um tipo que evolui muito vagarosamente. “Para alguém que tem sintoma a gente faz o exame”, fala. Ele ressalta, entretanto, que para a situação particular de um homem e seu médico cujo intuito é se investigar os sintomas, então o preventivo é usado e é muito útil. “O que mudou é a crença de que todos os homens além dos 50 devem ter seu PSA feito todos os anos”, afirma.
Ele também diz que o risco do tratamento em casos de detecção precoce pode afetar a qualidade de vida do homem - incontinência urinária e dificuldade de ereção - até o risco de vida que toda intervenção cirúrgica tem.
No caso da constatação de uma lesão, ele é favorável ao tratamento expectante - acompanhar, ao invés de tratar - porque não necessariamente o câncer vai progredir. Ele diz que o risco das consequências negativas se sobrepõe aos benefícios de uma intervenção precoce e que recomenda menos ênfase à ação preventiva.
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Cirurgião oncologista, diretor de Cirurgia Pélvica e vice-presidente do A.C.Camargo Cancer Center, Ademar Lopes diz que, do ponto de vista médico, não concorda com Eduardo Franco. O oncologista faz questão de ressaltar que homens que estão no grupo de risco – idade, casos na família, e pessoas da raça negra - devem iniciar o preventivo mais cedo, aos 40 anos. “No caso de homens com mais de 70 anos e que não têm sintoma, aí não tem sentido fazer PSA e toque retal. Por ser uma doença de evolução lenta, eles podem morrer de outras coisas antes que de câncer de próstata”, diz.
Para ele, o ponto de vista do epidemiologista brasileiro é de rastreamento populacional. “Procurar câncer de próstata na população inteira é controverso e não aconselho mesmo”, esclarece. O médico reforça: “diagnosticar precocemente o câncer de próstata aumenta a chance uma vida maior”.
HPV: : “está ficando vergonhoso demais”
Eduardo Franco critica veementemente o Ministério da Saúde (MS) quando o assunto é a vacinação contra o HPV. “O Brasil está atrasado inclusive em relação a outros países da América Latina. A Argentina já deu seu passo há um ano com a vacinação gratuita para a população”, diz. Para ele, o MS ainda se justificou publicamente pelas razões erradas ao afirmar que a vacina é muito cara e que não tinha prova que a imunização funcionava. “Isso deixou o Ministério numa situação embaraçosa com a opinião científica mundial”, afirma.
Entenda o impacto e resultados da vacinação contra o HPV
Em relação ao custo, Franco diz que do ponto de vista de economia de escala a vacina sai barata: U$ 7 a dose. “Vários municípios brasileiros adotaram a vacinação unilateralmente. Uma pena, porque estão tendo que pagar muito mais caro”. O especialista argumenta ainda que o país está penalizando outros países mais pobres da América Latina que estão pagando U$15 pela dose. Ele detalha que como o país integra a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), enquanto grupo conseguiriam um preço mais baixo pelas vacinas. “Se o Brasil entrasse, baixaria para U$ 7. Está ficando vergonhoso demais”, conclui.
Papanicolau pode ser superado
Dados do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia das Doenças Associadas ao HPV mostram que o vírus está associado a 100% dos casos de câncer de colo de útero. Para Franco, a vacina é uma importante aliada para reduzir esse dado estatístico. Ele diz que o Papanicolau tem impacto na redução da mortalidade de câncer de colo do útero, mas uma pesquisa dele sinaliza que o método pode ser superado. Utilizado há mais de 50 anos para detectar as lesões precursoras do tumor, o exame é menos eficaz que o teste de DNA do HPV. O estudo de 2007 do epidemiologista mostrou que com o teste de DNA do HPV 94,6% das lesões pré-cancerosas são detectadas sem gerar falsos resultados, enquanto que no Papanicolau esse índice foi de 55,4%. A pesquisa reuniu 10.154 mulheres de 30 e 69 anos. Franco diz que é fundamental seguir adiante mesmo com a particularidade brasileira, um país de grandes dimensões e tão diverso de uma região para outra.
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O cirurgião oncologista, Ademar Lopes concorda que o exame não é perfeito, mas diz que ele é muito importante. “O principal problema são os falso-negativos e isso pode ser por que a coleta não foi feita de maneira adequada ou o exame citológico não foi bem analisado”, observa. Ademar lembra que o Papanicolau não é um exame definitivo, mas é responsável pela triagem de indicação das mulheres para exames mais sofisticados e conclusão do diagnóstico.
Tabagismo: Brasil é exemplo para o mundo
Franco aponta o Brasil como exemplo para o mundo no controle do tabagismo, principal fator de risco para o desenvolvimento de cânceres. “A prevalência de fumantes – adultos e adolescentes – no país é mais baixa que a maioria dos países da América Latina e até de alguns países europeus”.
Outro item de prevenção primária - que são as estratégias para minimizar os fatores de risco da doença – em que o especialista vê avanços no país é em relação à alimentação. “O Brasil já adotou práticas de conscientização do valor nutritivo dos alimentos”. Para ele, o país se fortaleceu com acordos que emanaram do Mercosul e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ficou mais robusta e consequentemente aumentou a sua relevância em território nacional.
Progressos
A relação do câncer com os hábitos dos homens está comprovada e os principais fatores de risco são resultados das escolhas que cada um faz durante a vida: tabagismo, dieta inadequada e consumo de álcool. As exposições ocupacionais também estão entre eles. “Em uma cidade como Beijing, na China, ou na Cidade do México, a exposição ambiental tem relação com a incidência do câncer de bexiga. A genética é responsável, mais ou menos, por 5% a 10% dos cânceres”, afirma Eduardo Franco.
É bom lembrar que as formas de tratamento estão cada vez mais efetivas. O melhor exemplo, segundo Franco, são os cânceres infantis. “Há 20 anos, o diagnóstico era uma sentença de morte. Hoje, as taxas de cura são altíssimas”, diz. Outro bom exemplo é o câncer de mama. “A medicina consegue cada vez mais fazer um tratamento personalizado e não uma fórmula geral para todos os pacientes”, salienta o especialista.
Ele ressalta, entretanto, que para os cânceres de pâncreas, fígado e pulmão, a ciência e medicina conseguiram evoluir pouco nos últimos anos para uma melhor taxa de sobrevivência.