Mas o slack – que surgiu nos anos 80 como uma brincadeira entre os praticantes de escalada - foi se tornando bem mais sofisticado ao longo do tempo e o desafio deixou de ser apenas chegar ao outro lado. O esporte conta com competições internacionais que avaliam dificuldade, estilo e precisão na realização de manobras. Foi integrado à última turnê de Madonna e às performances do Cirque de Soleil. Hoje, é dividido em quatro modalidades:
O educador físico e professor Bernardo Maia, sócio da empresa Pé na Fita, conheceu o slackline em 2010, por indicação de um amigo escalador. “Comecei de forma improvisada, nem o equipamento adequado eu tinha. Mas bastou para mudar minha vida profissional, meu universo. Hoje, estou 100% dedicado ao esporte”, conta ele.
Em seu primeiro contato com o slackline, ele conheceu o hoje sócio Gabriel Amaral, designer e praticante de parkour – esporte criado na França que consiste em ultrapassar obstáculos, utilizando apenas o próprio corpo, para chegar até um destino da forma mais rápida possível. Os dois passaram a organizar encontros para difundir o slackline em Belo Horizonte, produziram vídeos e começaram a atrair cada vez mais público, recebendo convites para se apresentarem em eventos de outros estados. Mas esbarraram na necessidade crescente de equipamento.
Nesta época, os amigos formavam apenas um grupo. Com a intenção de difundir e contribuir para a evolução do esporte no Brasil, Gabriel, Bernardo e o amigo Gustavo Fontes, que voltou de Brasília para investir na nova atividade, fecharam parceria com uma empresa alemã. Únicos representantes da marca no Brasil, hoje eles conseguem patrocinar atletas e competições com a Pé na Fita.
Mas eles não pararam por aí. Por meio dos vídeos que editava e colocava na internet, Gabriel foi convidado para fazer o processo de seleção do Cirque de Soleil. Ele está no Canadá há oito meses, passou por todas as etapas e já integra o elenco do espetáculo 'One' (baseado nas músicas de Michael Jackson).
Agora, ele exibe suas manobras no slackline de maneira artística. “É tão difícil, no Brasil, realizar e conseguir viver de um sonho, mas nós nos desdobramos e estamos alcançando essa meta”, define Bernardo.
O sonhos dos amigos se tornou coletivo. Conheça alguns atletas patrocinados por eles:
Erick Augusto, 29 anos, é baterista profissional e pratica slackline há dois anos. Antes, costumava patinar e praticar grandes saltos (big kumps) em cachoeiras. Um amigo levou uma fita para um churrasco e ele ficou obcecado durante horas, até conseguir executar o percurso. Ele participa de campeonato nacionais e internacionais e, para prevenir lesões e melhorar a preparação física e mental, investe em yoga, musculação e pilates. Amante de esportes radicais, ele diz que o highline mudou sua vida. “Essa modalidade exige autoconhecimento, consciência corporal e concentração total. É uma experiência espiritual, você tem que abstrair de tudo e esquecer o mundo corrido”, relata ele. Para os próximos meses, Erick pretende melhorar suas performance no longline. Hoje ele caminha cerca de 100 metros e quer ampliar essa distância em mais pelo menos 50. O que ele não conta é que tem uma arma secreta: a simpática cadelinha dachshund Kaya, de 8 meses. Companheira, pelos olhinhos dá para perceber que ela fica torcendo para Erick não cair.
Fenício Rocha, 30 anos, é soldado do Corpo de Bombeiros e pratica slack desde 2010. Ele conheceu a modalidade pela internet e o interesse foi imediato. Primeiro comprou uma fita no Rio de Jneiro, e só depois conheceu os meninos da Pé na Fita. Aí, começou a participar de competições nacionais e internacionais. Em 2011, conseguiu o título de ‘Mestre do Slackline’, no campeonato brasileiro online. Em 2012, foi campeão na etapa de Brasília (Copa Centro-Oeste) do Circuito Brasileiro. Como preparação, Fenício investe em musculação e escalada. “No começo, era apenas uma atividade física prazerosa, mas com o tempo vi os benefícios para a concentração e o foco. Aos poucos, foi se tornando um estilo de vida”, explica o atleta.
Thiago Pantufa, 26 anos, é auxiliar de escritório e está na fita há dois anos e meio. Já participou de diversas competições como atleta e árbitro e afirma que o Brasil se destaca no cenário internacional, tanto na quantidade – o número de praticantes vem crescendo muito - como na qualidade dos atletas que se dedicam exclusivamente ao slackline. “Quando comecei, a Pé na Fita era um grupo, com pessoas espalhadas. Aos poucos, o movimento foi crescendo, mais eventos foram realizados e a ‘vibe’ do slack foi se disseminando”, conta. Para ele, o que começou como uma atividade física, hoje é um estilo de vida. Além do slack, que faz parte de sua rotina diária, Thiago pratica corrida, natação e escalada.
Democracia
Todos podem caminhar na fita suspensa. Determinação é o único requisito fundamental e a atividade não exclui as crianças – desde que acompanhadas por adultos – e os deficiente visuais, por exemplo. A única recomendação é que, no caso de crianças, pessoas com deficiência e idosos, a fita deve estar mais tensionada e mais próxima do solo. A Pé na Fita já levou o slack inclusive para o programa Segundo Tempo, oferecido pela Prefeitura de BH a estudantes de 6 a 17 anos.
Além disso, por ser um esporte relativamente recente, há enorme potencial de invenção de manobras. Com dedicação, a performance melhora de forma bem acelerada, o que traz mais motivação. A atividade garante melhoria do equilíbrio e da estabilidade do corpo, é claro, mas também desenvolve a habilidade de concentração, de esquecer o que está ao redor.
O gasto de energia com as manobras promove condicionamento cardiovascular e perda de peso. “Além disso, o slackline é acessível e fácil de praticar. De quebra, ele promove a redescoberta da cidade. O equipamento pode ser montado em vários lugares; e quando estudamos os melhores locais para a prática, acabamos tendo contato com regiões, praças e parques que não conhecíamos”, explica Bernardo.
Entre aqueles que já aprenderam o básico, a regra é simples: quando uma pessoa cai, a outra sobe na fita. Mas, nas competições de padrão internacional, os critérios são mais complexos. Os atletas se enfrentam em “batalhas” eliminatórias e devem, em um espaço definido de tempo, executar manobras com apuro técnico, amplitude, criatividade e que provoquem a empatia do público. As provas podem acontecer em eventos esportivos mas podem também ser online, em que os jurados avaliam a performance por meio de vídeos.
Iniciantes
Para quem está começando, por R$50/hora, é possível combinar com a equipe Pé na Fita uma aula particular. O aluno vai ser acompanhado por um profissional de educação física no local adequado à prática mais próximo à casa dele. Caso queira continuar, pode ser o caso de comprar uma fita. O equipamento varia entre R$290 e 500 reais, de acordo com o tamanho da fita e os acessórios. O kit completo, com proteção para a árvore – sim, ela merece - fita e catraca para ancorar, pesa cerca de três quilos e pode ser levado dentro de uma mochila.
O percurso pode ser feito descalço ou com um tênis de sola reta. Tênis para corrida, por exemplo, com amortecedores, não serve. “O legal do slackline, quando você está começando, é que imediatamente se cria um objetivo. Primeiro, ficar em pé na fita. Depois, dar o primeiro passo. Depois, atravessar até a outra ponta. Há sempre uma nova motivação para continuar”, explica Bernardo.
Por falar em iniciante, foi Bernardo que trouxe para a fita a bióloga Izabella Costa Machado. Ela sempre praticou esportes – futsal, musculação, spinning e muay thai – e havia estudado com o sócio da Pé na Fita, mas perderam um pouco o contato. Reencontraram-se em um dia em que ela foi acompanhar amigos que queriam conhecer o slackline. “Faz muito bem para o corpo e mente. Além de enrijecer e tonificar os músculos, você aprende a esquecer a vergonha de cair e passa a se preocupar apenas com sua meta. Além de muito divertido, o slackline tem me ensinado a persistência. Recomendo a todos”, resume a marinheira de primeira viagem.
Logo de cara, posso dizer que é mais simples do que parece. É claro que tive tremedeira nas pernas e medo de cair – fui das últimas entre minhas amiguinhas a aprender a andar de bicicleta sem rodinha na infância, tal era meu equilíbrio – mas aos poucos o corpo vai se adaptando. Guiada pelo professor, aprendi a não ter medo de jogar os braços para o alto – isso ajuda muito – e percebi que, aos poucos, meu cérebro já estava com alguns ‘cliques’ diferentes.
É claro também que eu estava aprendendo na fita mais baixinha, morrendo de inveja dos rapazes correndo e fazendo manobras em fitas fixadas a grandes alturas. Deve ser essa coisa de meta que os praticantes tanto mencionaram, né? Sonhar não custa nada.
Confiança e boa postura são muito exigidas no slack. Para a primeira, uma boa dica é não deixar o olhar ficar preso aos pés. Levante a cabeça e olhe para o ponto que você quer atingir, seja o meio da fita, seja um passo à frente, seja a outra árvore. Para a segunda, músculos abdominais e pernas devem acompanhar esse exercício.
Sempre há, é claro, o risco da queda. Mas, respeitando os limites de cada um e utilizando os equipamentos corretos, é aquela história: do chão não passa. Você sabe que vai cair, o que importa mesmo é o que você faz quando levanta. Outras dicas preciosas são posicionar o pé no sentido do comprimento da fita (e não de lado) e deixar os joelhos flexionados.
A gente acaba se sentindo meio surfista/skatista, pela oportunidade rara de curtir a cidade e uma atividade ao ar livre. E a cidade parece mesmo carente disso. Foi só estender as fitas em um gramado próximo ao Marco Zero da Lagoa da Pampulha, que vários curiosos vieram. Primeiro ficaram de longe, assistindo, depois perguntaram como fazem para aprender. Fascinados.
Dá para entender perfeitamente porque os atletas consideram o slack um estilo de vida: o convite a continuar, melhorar e evoluir é irressitível.
Quer ir também?
O quê? Slackline
Onde? Com a Pé na Fita (www.penafitastone.com.br e www.facebook.com/penafitaslackline) Em praças, parques, praias, condomínios, clubes e outros locais que permitam fixar o equipamento.
Preço? R$50 por hora/aula, você contrata quantas aulas quiser
Investimento em equipamentos? O kit com fita, proteção para árvore e catraca varia entre R$290 e 500 reais, de acordo com o tamanho da fita e os acessórios. Uma vaquinha entre os amigos mais próximos pode ser bem-vinda. Saiba mais em www.facebook.com/elephant.brasil
Pré-requisitos: Gostar de desafios e de lugares abertos
Contraindicações: Apenas para pessoas com lesões graves nas articulações
Dicas: Uma dica muito importante, e não é brincadeira: use filtro solar. Outra coisa: não confunda slackline com corda bamba, atividades circenses e afins. São coisas diferentes. Fora isso, relaxe e respire a vida ao ar livre
Avaliação final: Um dos diferenciais do slackline em relação às outras aulas que já apresentamos aqui no Manual do Iniciante é que ele convida a estar na cidade, na natureza. Além disso, uma vez que você aprende os passos e manobras básicas, pode comprar o equipamento e se exercitar sozinho, sempre que puder, sem ficar preso a horários e ao trânsito. Apesar disso, não é uma atividade individualista ou isoladora. Os praticantes sempre se reúnem para se divertirem, viajar e divulgar o esporte.